O lançamento do foguete VSB-30, previsto para esta quinta-feira (12/07), está causando transtornos ao município de Alcântara (MA), segundo alguns moradores. Com a chamada Operação Cumã 2, as famílias que moram na zona rural ficam proibidas de atravessar a região do Centro de Lançamento da Alcântara (CLA). A passagem é fundamental para que sejam realizadas atividades de sustento das famílias, como a pesca.
"Quando tem campanha os moradores da zona rural não podem passar pelo centro para ter acesso aos recursos naturais da região", reclama o coordenador-geral do Movimento dos Atingidos pela Base Espacial (Mabe), Inaldo Faustino Silva. Para ele, "é preciso que, a cada lançamento, o governo dê apoio às famílias". Alcântara tem cerca de 22,5 mil habitantes, segundo dados de 2006 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). "A maior parte da população, quase 85%, vive na zona rural em comunidades negras rurais."
A direção do Centro de Lançamento da Alcântara divulgou avisos em estabelecimentos públicos do município sobre a Operação Cumã 2, em que "solicita evitar acesso na área de risco e a passagem com barcos" em uma das praias de Alcântara. "Contamos com a sua colaboração para viabilizar os lançamentos dentro da segurança que é fundamental para todos", diz o aviso. As proibições para o acesso tiveram início no dia 5 de julho e irão até o dia 20 de julho, de acordo com o documento.
Segundo o coordenador do Movimento dos Atingidos pela Base Espacial, a possibilidade de passagem foi uma das questões acordadas, ainda na década de 80, pelos moradores da região e o governo nas negociações para que as famílias fossem deslocadas do local onde atualmente funciona o centro.
Além de reclamar da proibição durante as operações, Inaldo Faustino questiona a burocracia que os pescadores enfrentam diariamente. "Os pescadores precisam andar com documento para passar pelas guaritas."
O diretor do Centro de Lançamento da Alcântara , coronel Rogério Veríssimo, diz que a proibição do acesso dos moradores ao centro ocorre por questões de segurança. "É só na área de preparação e lançamento, que é uma área perigosa. Não tem como nós permitirmos o acesso. Seria até uma irresponsabilidade da minha parte", afirma.
De acordo com Veríssimo, existem outras formas de acesso à praia. "A área que é impedida de acesso ao mar é pequena em relação a toda área do Centro de Lançamento de Alcântara."
A previsão é de que o foguete VSB-30 seja lançado nesta quinta-feira (12/07). O lançamento estava previsto para quarta-feira (11/07), mas foi adiado por motivos de segurança. Ontem foram realizadas as primeiras simulações.
Sem tratamento de água e esgosto Ao lado de toda tecnologia e modernidade do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA), moradores do município maranhense moram em casas de taipa cobertas de palha sem nenhuma infra-estrutura, como tratamento de água e esgoto. A precariedade faz parte, inclusive, do cotidiano das famílias que tiveram de sair das terras onde moravam para que o governo pudesse construir o centro de lançamento.
“Foi um deslocamento compulsório. Eles foram obrigados a sair da região”, diz Servulo Borges, que integra o Movimento dos Atingidos pela Base Espacial (Mabe). O Centro de Lançamento de Alcântara foi construído em 1983 para que o Brasil pudesse lançar, a partir de seu próprio território, foguetes de médio e grande porte.
Segundo a Agência Espacial Brasileira (AEB), o município foi escolhido para sediar o centro não só pela proximidade com o mar e com a linha do Equador, mas por possuir baixa densidade populacional. O deslocamento das famílias começou em 1986. Até 1988, 312 famílias de 22 comunidades quilombolas saíram de uma região de perto do mar para lotes de cerca de 15 hectares no interior do município.
“As famílias foram deslocadas de perto do oceano. Lá elas viviam da pesca e da agricultura em terras férteis. Imagine o transtorno na vida dessas famílias quando elas tiveram de sair dessa região”, destaca Borges.
O coordenador-geral do Mabe, Inaldo Faustino Silva, diz que os movimento não é contra ao Centro de Alcântara, mas à forma como a instalação foi feita. “A metodologia usada deixou as comunidades isoladas, criando um cunho de resistência nossa”, afirma.
Atualmente, as famílias reivindicam políticas públicas e a titulação da área onde moravam para comunidades quilombolas. Segundo o Mabe, dos 114 mil hectares de Alcântara, 62 mil hectares foram desapropriados – por decretos federal e estadual das décadas de 80 e 90 - e destinados para o CLA. De acordo com Silva, o trabalho de reconhecimento da área para os quilombolas já está sendo feito, com o apoio do Ministério do Meio Ambiente.
(Por Marcela Rebelo,
Agência Brasil, 11/07/2007)