Cientistas comemoram uma
descoberta no arquipélago equatoriano de Galápagos que o pai da teoria da
evolução das espécies, Charles Darwin, nem sequer sonhou: estranhos animais que
vivem em total escuridão ao redor de vulcões submarinos ativos. Há 30 anos, os
pesquisadores detectaram a primeira “chaminé hidrotermal”, que aquece a água a
elevadíssimas temperaturas,
A simples definição de
“vida” sobre a Terra mudou para sempre ao se descobrir o florescimento destes
organismos sem a luz do sul e, em conseqüência, sem fotossíntese. Assim,
surgiram novos paradigmas sobre a possibilidade de vida no universo. Por fim,
se um diminuto camarão pode viver em total escuridão, sob uma pressão de
toneladas em uma sopa tóxica e fervente pela presença de uma fonte de calor de
350 graus, por que não haveria vida em algum planetóide remoto com condições
tão duras?
“Foi o que de maior
ocorreu à biologia no século passado”, recorda Fred Grassle, da Universidade de
Rutgers,
“Na época se pensava que
as profundezas do oceano estavam privadas de vida, ou que a pouca que havia ali
dependia do alimento que caía de cima”, disse o cientista em um pequeno
auditório com numerosos estudantes de Puerto Ayora, em uma das comemorações.
Grassle lhes mostrou velhos slides de cientistas se preparando para explorar um
ambiente tão exótico e perigoso quanto o espaço exterior. Embora as crianças
estejam conscientes de que as Galápagos são famosas por sua flora e fauna
únicas, as profundezas do mar que a cerca são um reino tão fantástico quanto a
Lua. “Sabemos mais sobre a superfície lunar do que a respeito do fundo do mar”,
costuma dizer o cientista.
Localizada a mil
quilômetros da costa oeste do Equador, Galápagos também é uma região vulcânica
muito ativa, no alto de um ponto-chave de magma da bacia tectônica de Nazca. Em
1977, o “Alvim” seguiu um rastro de almejas brancas (moluscos bivalvos) até uma
pequena série de fissuras nas rochas, emitindo uma espécie de água nebulosa,
extremamente quente, chamada “black smokers”. Embora seja suficientemente
quente para derreter a maioria dos metais, a água não ferve por causa da
tremenda pressão nessas profundidades. Cobrindo uma área muito maior do que um
campo de beisebol, pensou-se que fosse a única do planeta, disse Grassle à IPS.
Uma série de experimentos
de complexa realização acabou demonstrando que as surpreendentes criaturas
(gusanos-tubo, camarões e outros) que vivem ao lado destas aberturas usam a
energia química que delas emana para sobreviverem. O componente-chave neste
sistema ecológico único é a bactéria quimiosintética que comumente vive em
simbiose com os animais residentes, como as almejas. Estas bactérias
especializadas oxidam o tóxico sulfuro de hidrogênio que sai das fissuras
proporcionando nutriente a animais que estão em uma posição superior na cadeia
alimentar.
E no caso dos vermes-tubo,
que não têm boca nem estômago, a bactéria reside em seu interior, fornecendo os
compostos orgânicos necessários para mudança de um cômodo lugar. Estas bactérias
amantes do enxofre tomam o lugar da fotossíntese, que gera vida no resto do
planeta, explicou Grassle. São antigas, e alguns cientistas especulam que podem
ter sido as primeiras formas de vida sobre a Terra. Estas descobertas desataram
um auge internacional em matéria de pesquisas das profundezas do mar. Cerca de
cem destas aberturas foram encontradas até agora nos oceanos Atlântico e
Pacífico.
Estão situadas ao longo da
cadeia montanhosa de 64 mil quilômetros de extensão, que ziguezagueia sobre as
bacias oceânicas do planeta, explicou Christopher German, co-presidente da ONG
InterRidge e da organização Biogeográfica da Quimiosíntese dos Ecossistemas de
Águas Profundas (ChEss, em inglês). A cadeia montanhosa marca a área onde as
placas tectônicas da Terra se separaram e uma nova crosta se formou da lava
quente que surgiu, disse German à IPS. “Em qualquer lugar que observarmos ao
longo da cadeia encontramos aberturas, que abrigam diferentes espécies animais
em diferentes regiões do oceano”, acrescentou.
Cerca de 550 espécies
foram descobertas vivendo em condições de extrema pressão e temperatura e novas
espécies são encontradas à razão de duas mil ao mês, disse Ron Tyler,
co-presidente da ChEss, um dos 14 programas do Censo da Vida Marinha, um projeto
internacional para documentar a vida nos oceanos até 2010. o estudo dessas
aberturas dominou o campo da biologia das profundezas do mar durante os últimos
30 anos, acrescentou. As futuras pesquisas se focarão mais nos minerais do que
na biologia. Pelo menos duas companhias de mineração estão explorando essas
aberturas por causa de sua abundância em ouro, cobre e outros minerais
valiosos. Os avanços tecnológicos permitem a exploração do fundo marinho,
embora tais operações sejam muito complexas e caras.
O impacto ambiental nas
espécies que habitam estas aberturas pode ser catastrófico, tanto para as que
se encontram no local quanto para aquelas “corrente abaixo” devido aos
sedimentos que serão removidos. A exploração mineira poderia começar em 2009,
disse a diretora do Laboratório Marinho da Universidade de Duke, nos Estados
Unidos, Cindy Van Dover. Os cientistas deverão tomar parte ativa no
desenvolvimento de normas para as empresas, que incluam uma completa avaliação
do impacto ambiental das áreas de mineração, alertou.
A verdadeira riqueza das
“chaminés hidrotermais” é sua enorme biodiversidade, disse Grassle. “Elas nos
fazem abrir os olhos em relação aos lugares e às condições sob as quais a vida
pode prosperar”, afirmou. “O que aprendi nos últimos 30 anos é que os pequenos
organismos como as bactérias são escassamente apreciados”, acrescentou. O fato
de está descoberta ter ocorrido onde Darwin conseguiu um dos maiores avanços
científicos da história “he uma grata coincidência”, acrescentou, com um pequeno
sorriso.
(Por Stephen Leahy, IPS,
09/07/2007)