No final deste mês, a companhia norte-americana Planktos despejará cem toneladas de pó de ferro no Oceano Pacífico, perto das equatorianas Ilhas Galápagos, apesar da oposição de ambientalistas e cientistas marinhos. Será a primeira tentativa comercial de reduzir o dióxido de carbono, causador do aquecimento global, usando essas partículas para provocar o florescimento de fitoplâncton em uma área de dez mil quilômetros quadrados. A empresa assegura que o plâncton extra absorverá muito dióxido de carbono da atmosfera e o levará para as profundezas marinhas. E que este método pode ser o mais rápido e poderoso para combater a mudança climática.
“As correntes, provavelmente, arrastarão esse plâncton para a Reserva Marinha de Galápagos”, de 133 mil quilômetros quadrados, a terceira maior do mundo, disse Washington Tapia, diretor do Parque Nacional Galápagos, onde fica a reserva. “Não temos idéia do que acontecerá. Procuramos entrar em contato com a Planktos para obter mais informação, mas não tivemos êxito”, disse Tapia ao Terramérica em Puerto Ayora. As 19 ilhas do arquipélago, situado a mil quilômetros da costa equatoriana, e a área marinha circundante são um notável exemplo de história natural, cuja observação inspirou parte da teoria da evolução de Charles Darwin.
“Por que fazer isto tão perto de Galápagos, um local declarado Patrimônio Mundial?”, perguntou Pablo Barriga, coordenador de Projeto da não-governamental Fundar Galápagos, com sede em Puerto Ayora, e que apóia o desenvolvimento sustentável e a conservação. “É imoral uma companhia em busca de lucro realizar este tipo de experiência, tão perto de Galápagos”, disse Barriga em uma entrevista. A Planktos está no novo negócio de captura de carbono, um dos gases causadores do efeito estufa cujo acúmulo na atmosfera provoca o aquecimento global.
Para essa captura, a empresa planta árvores na Europa oriental, que absorvem o carbono da atmosfera na medida em que crescem. Esse carbono fica preso por 60 ou 80 anos, dependendo da vida da arvore. Na Europa, a companhia pode vender créditos de carbono para empresas a fim de compensar suas próprias emissões, para cumprir regulamentações locais ou internacionais. Nos últimos 20 anos, a captura de carbono oceânico foi provada em vários pequenos experimentos. A maioria demonstrou que adicionar ferro às águas oceânicas com déficit ferroso promove o crescimento de fitoplâncton, que necessita desse nutriente para viver. E como o plâncton também consome carbono da água durante a fotossíntese, o ciclo culmina com a absorção desse gás da atmosfera.
Escolhendo Galápagos para sua primeira experiência em grande escala, a Planktos provocou uma chuva de protestos. “Existe um risco real de que possa ocorrer um efeito dominó na cadeia alimentar”, disse a microbiologista Sallie Chisholm, do Fundo Mundial para a Natureza. “Ameaça nosso clima, nosso entorno marinho e a soberania de nossos pescadores, e deveria ser detida”, complementou Elizabeth Bravo, da organização equatoriana Ação Ecológica, em uma declaração por escrito. A Planktos afirma que tenta apenas corrigir os desequilíbrios causados por atividades humanas, como a mudança climática, que nos últimos 30 anos reduziu em quase 30% o aerossol natural de ferro (pequenas partículas ferrosas presentes no ar) que se depositam nos mares.
“Isto gerou sérios impactos ecológicos, como 50% de mortes de plâncton em muitas regiões”, disse David Kubiak, porta-voz da empresa. Uma das áreas que sofre esta diminuição fica entre 500 e 650 quilômetros a oeste de Galápagos, onde a Planktos pretende despejar cem toneladas de minúsculas partículas de ferro, disse Kubiak ao Terramérica. “As águas de Galápagos já têm muito ferro, e qualquer excesso ferroso ou de plâncton derivados de nosso experimento não causará nenhum problema para a vida marinha local”, acrescentou. Esta é a primeira de seis experiências para adicionar ferro ao oceano que a Planktos espera realizar nos próximos dois anos.
A companhia acredita que se o fitoplâncton voltar aos níveis de 1980 poderá retirar anualmente entre três e quatro bilhões de toneladas de dióxido de carbono da atmosfera, ajudando a diminuir o aquecimento global cinco vezes mais do que o imediato cumprimento universal do Protocolo de Kyoto, que obriga os países industriais signatários a reduzir sua produção de gases que provocam o efeito estufa. Um artigo, publicado em fevereiro pela revista científica Science, avaliou experimentos de enriquecimento de ferro feitos entre 1993 e 2005. Os cientistas concluíram que, em grande escala, poderia afetar o sistema climático do planeta e que eram necessários mais estudos.
“O enriquecimento elimina o carbono da atmosfera, mas não sabemos por quanto tempo”, destacou ao Terramérica Kenneth Coale, co-autor do informe e diretor do Moss Landing Marine Laboratories na Califórnia. A Planktos leva esses experimentos prévios ao próximo nível de grande escala, e controlará seus efeitos por até seis meses, em média, disse Kubiak. Se a empresa puder verificar quanto carbono é absorvido, as vendas de crédito de carbono mais do que cobrirão os custos das experiências, destacou. “Isto deveria ser feito com supervisão de uma agência da Organização das Nações Unidas que nós tentamos estabelecer”, disse ao Terramérica Víctor Smetacek, co-autor do informe publicado pela Science e biólogo marinho da Universidade de Bremen, na Alemanha, entrevistado por correio eletrônico.
Entretanto, tais experimentos em oceanos submetidos à pesca em excesso e aos impactos da mudança climática deixam muitos cientistas nervosos. “É prematura comercializar a fertilização de carbono como ferramenta para capturar carbono”, afirmou Ed Boyle, do grupo de Oceanografia Química do Instituto Tecnológico de Massachusetts, na cidade de Boston. “Sabe-se muito pouco sobre a efetividade do ferro adicionado em grande escala e as conseqüências disso”, afirmou Boyle ao Terramérica. A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) acrescentou, no dia 26 de junho, as Ilhas Galápagos à sua lista de Patrimônio Mundial em Perigo, por causa dos impactos e das ameaças da imigração e da pesca ilegais, espécies invasoras e auge turístico. “A última coisa de que precisamos aqui é outro problema ambiental”, afirmou Tapia.
(Por Stephen Leahy,
Terramérica, 09/07/2007)