O projeto de transposiçăo do Rio Săo Francisco sofreu uma reviravolta, com a queda do coordenador do projeto no ministério da Integraçăo Nacional, Rômulo de Macedo, e a açăo de reintegraçăo de posse das terras onde as obras estăo ocorrendo, por se tratarem de terras indígenas. Procurado por lideranças dos cerca de 1,5 mil acampados há oito dias no canteiro da obra em Cabrobó (PE), o Ministério Público Federal, em Pernambuco, resolveu intervir, atrapalhando mais ainda os planos do governo, que tem, na transposiçăo o projeto mais caro do Programa de Aceleraçăo do Crescimento (R$6,6 bilhőes).
Em entrevista ŕ Agęncia Brasil, do governo federal, Rômulo Macedo procurou demonstrar tranqüilidade ante a mudança, que ficou sabendo através do Diário Oficial da Uniăo. "Năo é que o ministro năo tinha confiança em mim, mas eu năo sou do time dele", disse. A coordenaçăo do polęmico projeto ficará com o atual secretário de Infra-Estrutura Hídrica, Joăo Reis Santana Filho.
O ex-coordenador sustenta que o seu sucessor terá ainda mais trabalho para conduzir a obra. "Eu estou há 16 anos nesse projeto, conheço todos os parafusos dele. Provavelmente, a pessoa que assumir vai ficar meses estudando", afirmou.
A ocupaçăo em Pernambuco parecia resolvida na sexta-feira, quando o juiz da 20Ş Vara Federal, Georgius Principe Credidio, concedeu ŕ Uniăo a reintegraçăo de posse, até o momento năo executada. Ontem, confirmando o que havia noticiado o Correio da Bahia na ediçăo passada, o procurador Sérgio Rodrigo Castro Pinto, do Ministério Público Federal em Salgueiro (PE), ingressou com um agravo contra a reintegraçăo junto ao Tribunal Regional Federal (TRF) da 5Ş Regiăo.
Para o procurador, Credidio cometeu erro processual ao conceder a liminar de reintegraçăo sem ouvir o Ministério Público ou a Fundaçăo Nacional do Índio (Funai), ferindo a Lei Federal 6.001/73. “Estudos antropológicos realizados pela Funai mostram que a área onde está havendo a transposiçăo do Săo Francisco passa pelas terras (dos índios) trukás”, acrescentou Castro Pinto. O procurador assegura que, pela Constituiçăo, o uso de recursos hídricos de terras indígenas exigem autorizaçăo do Congresso, ainda năo requerida pelos executores da transposiçăo.
Líderes e coordenadores antitransposiçăo acampados no canteiro da obra desmentiram ontem a informaçăo dada pela Polícia Federal (PF) de que os manifestantes foram notificados da reintegraçăo de posse.
Um dos coordenadores do protesto, Cícero Francisco de Oliveira, do MST, negou que a entidade tenha recebido a notificaçăo oficial. O líder do sem-terras – que atua no Pontal Sul, próximo de Petrolina (PE) e da ocupaçăo no Projeto Salitre, em Juazeiro (BA) – informou que os acampados se dispőem a negociar. “O que queremos é um projeto de convivęncia com a seca no semi-árido”.
Os acampados exigem o arquivamento do projeto, a revitalizaçăo do rio, a implementaçăo de alternativas e tecnologias apropriadas de convivęncia com o semi-árido e o repasse da área ocupada para o território truká. Eles sempre revelaram a esperança de permanecer no acampamento e conquistarem os objetivos do ato. Ruben Siqueira, um dos coordenadores da ocupaçăo, assegura que a possibilidade de a polícia cumprir o mandado de reintegraçăo năo intimidou os contrários ŕ transposiçăo. Os manifestantes, lembra Siqueira, começaram a construir casas e uma praça com vistas ŕ manutençăo da moradia no lugar.
Já o ministro da Integraçăo Nacional, Geddel Vieira Lima, fechou com os governadores Eduardo Campos (PE), Cássio Cunha Lima (PB), Wilma Faria (RN) e Cid Gomes (CE) uma estratégia de contra-ataque junto aos movimentos sociais. Na tentativa de atrair a populaçăo para a defesa do projeto – e assim ofuscar os que se contrapőem a ele – os governos federal e estaduais pretendem criar comitęs estaduais Pró Interligaçăo (transposiçăo) da Bacia do Săo Francisco e a organizar manifestaçőes municipais e um grande ato em Brasília, na segunda quinzena de agosto. Projetos agroindustriais nestes estados serăo beneficiados com as águas do Săo Francisco, daí a reaçăo popular, que cobra projetos para dessedentaçăo animal e humana.
(Correio da Bahia, 04/07/2007)