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Indígenas da Amazônia
2007-07-03
O Núcleo de Vigilância Epidemiológica (NUVEPA), do município de Guajará-Mirim-RO, em resposta a um ofício do Conselho Indigenista Missionário de fevereiro de 2007, revelou dados alarmantes de um inquérito sobre hepatites B e C realizado há um ano e nove meses por esse município em parceria com a Funasa: 12% da população indígena estudada é portadora do vírus de hepatite B ou C.

No ofício do NUVEPA, em 18 de maio de 2007, a enfermeira Denise Marques de Azevedo, chefe da Vigilância Epidemiológica, e a psicóloga Isabel Araújo Silva, coordenadora do Programa de Hepatites Virais, informam que a pesquisa foi realizada no período de 12 a 26 de setembro de 2005 através de uma parceria entre o município de Guajará-Mirim e a Fundação Nacional de Saúde (Funasa).

Foram estudadas 05 aldeias indígenas, incluindo também os indígenas presentes no porto e na Casa de Saúde Indígena; que foram realizadas 836 coletas de sangue das quais consta que 78 pessoas têm marcadores positivos para Hepatite B e 22 pessoas para Hepatite C, em um total de 100 infectados.

A pesquisa é uma amostra bastante significativa e a existência de casos de hepatite B nas demais aldeias permite supor que, no Pólo-Base de Guajará-Mirim, aproximadamente 400 indígenas sejam portadores do vírus da hepatite.

Pessoas com hepatite crônica necessitam de um acompanhamento contínuo, com realização de exames complementares, possível necessidade de tratamento especializado O atraso no tratamento coloca em risco a vida desses pacientes.

Diferente da hepatite A, que não deixa seqüelas, as hepatites B e C colocam os infectados sob risco de vida, tanto em sua forma aguda como em sua manifestação crônica, quando pode ocorrer a evolução para cirrose, que resulta em uma morte trágica, com barriga d'àgua e vômitos de sangue.

Os resultados foram entregues ao município de Guajará-Mirim em 06 de dezembro de 2005.  O município repassou os resultados para a Casa de Saúde Indígena (Casai), em data próxima ao dia 20 de dezembro de 2005.  Não houve retorno da equipe nessas localidades devido a uma informação da CASAI que a Universidade Federal de Rondônia iria desenvolver uma pesquisa nessas localidades.

O Pólo-Base de Guajará-Mirim, que pertence ao Distrito Especial de Saúde Indígena-DSEI de Porto Velho, conta aproximadamente 4.000 indígenas, a maioria sendo do povo Oro Wari (Pakaa Nova).  A partir de 1991, a hepatite B (associada ou não à hepatite Delta) provocou a morte de mais de 10 indígenas desse Pólo-Base.  O inquérito foi realizado 11 anos após uma epidemia na aldeia Deolinda onde a associaçao das hepatite B e delta levaram a obito mae(Luiza Oro Mon) e filho (Carlito Oro Nao).  Nos anos seguintes faleceram na mesma familia num quadro de cirrose a avo materna(Hatem Mrume Oro Mon) e seus dois irmaos(Niro Sandra Oro Mon e Manoel Oro Mon).

As gestantes portadoras do vírus da hepatite devem ser acompanhadas por médico obstetra porque se trata de gravidez de risco.  Apos o parto, o recém-nascido de mãe portadora deve receber uma injeção de gama globulinas, além da vacina para diminuir o risco de desenvolver a doença.  O Cimi já denunciou na imprensa, em janeiro março de 2007, a morte de duas mães indígenas de complicação cardíaca, a primeira ao decorrer do parto e a segunda no quinto mês de gravidez, ambas com 21 anos de idade.  A Funasa era conhecedora que as duas mulheres eram portadoras do vírus da hepatite B, entretanto as mulheres não tiveram consulta médica durante a gravidez.

O Cimi denuncia a omissão da Funasa, o clima de sigilo e de mentira mantido pela Casa de Saúde Indígena (Casai) e o Pólo-Base em relação aos indígenas e aos seus parceiros do Conselho de Saúde Indígena, em busca de informações.  Mais de um ano apos ter os resultados em mãos, a Funasa continua a justificar o sigilo, até publicamente em reunião de Conselho de Saúde Indígena, dizendo que ainda aguardam resultados a serem entregue pelo laboratório responsável.

O município garante ter repassado os resultados à Funasa, e a Fundação nega ter esses resultados mas, por outro lado, garante que já esta encaminhando as pessoas que têm o resultado positivo.  Os pacientes precisam ser informados sobre sua saúde.  O fato dos AIS (Agentes Indígenas de Saúde) das aldeias desconhecerem esses novos encaminhamentos nos permite duvidar da boa fé da Funasa.  Nem mesmo os pacientes portadores de hepatite B descobertos antes da pesquisa estão sendo acompanhados corretamente.  É lamentável que os AIS, profissionais de saúde de referência de suas aldeias, não estejam informados sobre a saúde dos pacientes.

Quanto à justificativa da Funasa que pediu ao município que parasse com o trabalho, alegando que a Universidade Federal de Rondônia (Unir) se comprometeu pela continuidade da pesquisa, parece ser um mero pretexto para segurar a bomba na mão.  Em 18 meses, nada mais foi feito.

É responsabilidade da Funasa entregar a cada indígena o resultado de seus exames, fazer os devidos encaminhamentos e frente à esses resultados realizar com urgência a pesquisa nas demais aldeias.

A partir desses resultados, a Funasa poderá buscar a parceria do Município, do Estado e da Universidade para organizar de forma coerente um programa especifico de Hepatites Virais que vai requerer recursos financeiros e técnicos: acompanhamento clinico e laboratorial dos portadores, vacinações, acompanhamento das grávidas, vacinação dos recém-nascidos, e formação dos profissionais de saúde e das comunidades.

Uma das causas possíveis de contaminação pela hepatite B ocorreu na década de 90, quando o atendimento odontológico era realizado nas aldeias sem a devida esterilização do material.

Os indígenas do Pólo-Base de Guajará-Mirim vêm sofrendo há anos com o descaso da Funasa, com desrespeito às decisões tomadas pelos conselheiros, falta de transporte, radiofonia, medicamentos, falta de continuidade nas ações de combate à malaria e abandono dos Agentes Indígenas de Saúde, que estão há quatro anos sem nenhum curso de formação.  A falta de infra-estrutura e de assistência que já resultou em mortes de crianças, gestantes e idosos foram denunciadas na mídia com uma repercussão nacional.

Em fevereiro de 2007, o Procurador da República convocou uma audiência pública em Guajará-Mirim sobre o tema da assistência à saúde indígena.  Frente à gravidade das denuncias, o Procurador prometeu realizar uma segunda audiência pública com mais participação até o final de abril deste ano.  Isto ainda não aconteceu. O quadro de saúde continua desolador e a responsabilidade é da Coordenação Regional da Funasa em Rondônia, que mantém o mesmo coordenador, inoperante frente a todas estas denúncias, há quatro anos.

(Conselho Indigenista Missionário / Amazonia.org, 29/06/2007)

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