A preocupação com a possibilidade de mais um desastre ambiental como o que aconteceu no ano passado no Rio dos Sinos tem mobilizado moradores de Nova Santa Rita contra a instalação de uma central de resíduos sólidos industriais no município. As obras do empreendimento, em uma área de mais de 12 hectares no bairro Sanga Funda, estão em andamento.
Autoridades e população tentam embargar na Justiça os trabalhos e, assim, impedir que o lixão faça parte da paisagem da cidade. Uma manifestação na manhã deste sábado chamou a atenção de moradores e comerciantes para a questão. Participaram do ato representantes do poder público, como a vice-prefeita Zara Schroeter e a vereadora Giovanna Fagundes (PT).
Há uma ação popular solicitando liminar de cassação da licença de instalação concedida pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), além de três ingressos no Ministério Público de Canoas. Segundo a vereadora Giovanna Fagundes, a presença da empresa na cidade fere a Lei Orgânica Municipal. “Além da solicitação na Justiça, encaminhei ainda cópias de toda a documentação da ação popular para a diretora da Fepam.”
Sem votaçãoA vereadora informa que a instalação do empreendimento não passou por votação no Legislativo e não atenderia as exigências do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), “que determina mais de uma audiência pública para que a comunidade fique a par da situação”. Giovanna argumenta que houve apenas uma audiência em 28 de fevereiro de 2003 e que não havia representação da população. “A ata pode comprovar que a população não sabia dessa audiência. Sem contar que a audiência pública aconteceu no bairro Berto Círio às 15 horas. Por que não foi no bairro Sanga Funda, onde o empreendimento está se instalando?” A vereadora salienta que o grupo quer que o assunto seja tratado dentro da legislação municipal. “Queremos a suspensão da licença, a apresentação do Estudo do Impacto Ambiental (EIA-Rima), que não foi feito e é exigido pela Lei Orgânica, audiências públicas e a votação na Câmara de Vereadores. Com todos esses elementos tenho certeza de que a empresa não vai ficar aqui na cidade”, afirma Giovanna.
Moradores próximos estão preocupadosNova Santa Rita é uma cidade voltada economicamente para atividade agrícola, tendo como símbolo o melão. O município abriga quatro assentamentos e um acampamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais (MST), e conta com uma população com pouco mais de 20 mil habitantes. Dessas pessoas, cerca de 90% não recebem água tratada da Corsan e têm no quintal de suas casas poços artesianos. A central de resíduos sólidos industriais está localizada na altura do quilômetro 429 da BR-386, exatamente entre os rios do Sinos e Caí. “O lixão fica a quatro quilômetros do Caí e a sete do Sinos. O que nos preocupa é que um vazamento como o ocorrido no ano passado venha a poluir o lençol freático, deixando toda a população sem água potável”, teme a vereadora. Para Sérgio José Baum, que comprou uma chácara em frente ao empreendimento há sete anos, os moradores próximos, cerca de 40 famílias, estão se sentindo enganados. Baum, que representa uma comissão de moradores contra o lixão, revela que ao adquirir sua propriedade não imaginava que tipo de empresa iria se instalar do outro lado da rua. “Nunca soubemos o que era. Nem placa tem em frente. Disseram até que seria uma zona industrial e que traria empregos. Teve gente pensado que as valas abertas no terreno seriam açudes e, agora, há dois meses, descobrimos que se trata de um lixão. Jamais teria comprado minha chácara se soubesse que ali seria um lixão.”
Prefeitura vai fazer estudo sobre impactosO prefeito Amilton Amorim (PTB) informou que só poderá tomar uma decisão sobre o assunto depois de conhecer os impactos do empreendimento na cidade. Ele ressalta que em 15 dias uma equipe técnica fará os levantamentos necessários para, então, decidir o que será feito. Amorim disse que irá se manifestar apenas com os laudos nas mãos. O prefeito frisa que ao assumir a administração da cidade o empreendimento já tinha a autorização para funcionar, inclusive, com a licença de instalação concedida pela Fepam. “Como pegamos tudo isso em andamento, não temos um estudo real.” Amorim acrescenta que já ocorreram diversas reuniões no município para debater o tema e que a Prefeitura nunca foi convocada a participar. “Existem os que realmente são contra essa central e as pessoas que estão usando politicamente o assunto”, afirma. De acordo com a vereadora Giovanna Fagundes, os artigos 162 e 163 da Lei Orgânica determinam que Nova Santa Rita não pode receber resíduos domiciliar ou industrial de outros municípios e que é preciso fazer um estudo detalhado dos impactos ambientais dos empreendimentos na cidade, o EIA-Rima. Giovanna revela que o artigo 162 recebeu uma emenda em outubro do ano passado. “Esse artigo proíbe que venha lixo de fora da cidade. Com a proposição feita pelo vereador Carlos Diogo e aprovada por todos os vereadores esse artigo agora permite a entrada de lixo tóxico e
domiciliar de outras cidades.” A vereadora admite ter votado a favor da emenda. Ela alega que não tinha conhecimento de que o artigo poderia abrir uma brecha na legislação para permitir a instalação da central. “Não imaginávamos que junto viria o gato ensacado que é esse lixão. No início a alteração era para permitir apenas a presença de uma empresa que trata lixo biologicamente”, defende-se. O vereador Carlos Diogo Amorim (PTB) afirma que antes da emenda a Lei Orgânica da cidade não permitia a entrada de produto para reciclagem, mas algumas empresas do setor já operavam no município. “Sugeri a emenda para regularizar a situação de quem já atuava.” Outra justificativa apresentada pelo vereador foi a de que a Lei Orgânica estava “obsoleta”. “Havia um anseio do município, que estava fora de época. Existe a necessidade de a cada cinco anos rever a legislação. O que fizemos foi uma adequação”, diz. Carlos Diogo explica ainda que o artigo 162 só determina a votação
no Legislativo quando a Fepam exige o EIA-Rima e quando o empreendimento pode trazer danos ao meio ambiente. “Caso contrário não é preciso passar por votação. Na época a Fepam e o governo entenderam que não traria riscos. Veja bem, não são palavras minhas, mas um entendimento da época.”
(Por Lílian Patrícia,
Diário de Canoas, 02/07/2007)