O filósofo Roberto Romano esteve em Porto Alegre para uma conferência no ciclo Fronteiras do Pensamento. Fez uma análise do poder perpétuo das oligarquias brasileiras. Uma das heranças desse processo de 500 anos de atraso, diz ele, é a prática comum de transformar protestos, lutas e reivindicações da sociedade civil em algo ingênuo ou ridículo.
“Há, invariavelmente, uma destruição da imagem desses grupos”, observa Romano. Inevitável relacionar com o que acontece no debate do Plano Diretor em Porto Alegre.
Há cinco anos um movimento se bate pela preservação das características de bairros tradicionais da cidade, que sofrem intensa e rápida transformação em sua paisagem. Hoje, cerca de 20 associações de moradores integram a luta por mudanças no Plano Diretor.
Pois o Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon) encomendou duas pesquisas – uma em 2003 e outra no final de 2006 – a poucos meses dos debates decisivos, para informar, entre outras coisas, que esses movimentos de bairro não são conhecidos pelas comunidades nem correspondem aos anseios da população. Mais. Que esses grupos são elitistas – nada mais são que um bando de egoístas defendendo seus privilégios, pois “não querem mais gente morando no mesmo lugar em que eles vivem”.
Agora, a tese lançada pelo Sinduscon há quatro anos tem como porta-voz o Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil, que repete o argumento dos empresários, dizendo que mudanças no Plano Diretor vão gerar milhares de desempregados. Ou seja, de um lado está o povo (construtores e trabalhadores) e de outro a elite (associações de moradores).
O argumento do desemprego aliado ao poder econômico do segmento da construção passou por cima dos movimentos de bairro na primeira audiência pública sobre a revisão do Plano Diretor.
O resultado é previsto. Não haverá mudanças nas questões principais – diminuição das alturas, aumento dos recuos – e nem se resolverá o problema do desemprego. Argumento que, provavelmente, será usado na próxima revisão do Plano Diretor, em 2011.
(Por P.C. de Lester,
Jornal JÁ, 20/06/2007)