SÃO PAULO – O ministério da Integração Nacional ainda comemora os frutos da viagem realizada de 11 a 16 de junho pela bacia do rio São Francisco – batizada de “Travessia para o Futuro”. Já os movimentos e setores contrários ao projeto de transposição das águas do São Francisco analisam os próximos passos a empreender para defenderem sua posição.
A viagem, voltada a divulgar os projetos do governo federal para o São Francisco, até superou seus objetivos, na análise da pasta de Geddel, inaugurando nova fase do projeto, cujas obras foram iniciadas também em meados de junho. O ministro contou com um dado até inesperado: a relativa timidez dos protestos durante sua “travessia”. Em entrevista à Tribuna da Bahia na segunda-feira passada (18/06 ) o ministro disse ter uma avaliação “extremamente positiva” da viagem. Geddel destacou que as comunidades visitadas apresentaram “uma expectativa extremamente favorável ao projeto” e se mostraram “encantadas” com as ações de revitalização. Além disso, o ministro afirmou que a viagem demonstrou, ao contrário do que se pregava, haver forte apoio dos políticos baianos ao projeto – inclusive das forças de oposição a Lula.
Ao longo da viagem, Geddel também insistiu na avaliação de que os movimentos possuem legitimidade para protestar, discordar e apresentar opinião e ações contrárias ao projeto, ao passo que o governo tem legitimidade para governar e fazer a obra. O ministério também comemorou em seu site os 168 protocolos de intenção firmados para realização de investimentos na área de saneamento em municípios dos Estados de Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Sergipe e Alagoas, que totalizam R$ 871 milhões a serem aplicados entre 2007 a 2010.
Para Roberto Malvezzi, o Gogó, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), a visita teve objetivos muito claros. “O ministro foi passando nos municípios, oferecendo convênios e dinheiro, ganhando o apoio de muitos prefeitos e deputados à transposição, ou, senão o apoio, pelo menos o silêncio”. Para Gogó, contudo, a adesão dos prefeitos e deputados – dos políticos em geral – “não pode ser tomada como correspondente à adesão do povo, pois os políticos acabam ficando muito onde o dinheiro está”.
RevitalizaçãoAo longo da viagem, ficou clara também a estratégia de Geddel em destacar em seus discursos as ações de revitalização da bacia do rio, de forma casada aos investimentos referentes à transposição. Apesar da ênfase dada por Geddel ao tema, nenhum representante do Ministério do Meio Ambiente (MMA) participou da “travessia”. O ministério comandado por Marina Silva, responsável pela coordenação do Programa de Revitalização do São Francisco em parceria com o ministério da Integração, sequer foi convidado para a viagem, organizada internamente à pasta de Geddel.
Gogó entende ser “evidente o jogo governamental que colocou a revitalização como moeda de troca para a transposição. O governo tem deixado claro que sem a transposição a revitalização não sairia”. Para ele, restou ao MMA um papel legitimador da transposição, que fortalece as ações e o protagonismo do ministério da Integração.
Diante do fato de a questão da revitalização ter ganhado tamanho destaque nas intervenções de Geddel durante a viagem, e da ausência de representantes do MMA na comitiva formada para a “travessia”, a assessoria de imprensa do ministério do Meio Ambiente explicou à Carta Maior que diversos ministérios – como as pastas de Cidades e Saúde – possuem ações que integram o Programa de Revitalização. Além de coordenar o programa, a pasta de Marina Silva possui câmaras técnicas e temáticas nas quais as ações ligadas à revitalização são analisadas. Assim, de acordo com a assessoria, todas as ações anunciadas por Geddel neste campo haviam sido anteriormente avaliadas pelo MMA.
Para Gogó, não faria sentido os movimentos se oporem aos investimentos do governo em saneamento e revitalização, “pois são reivindicações nossas também”. O diretor da CPT, porém, avalia que, da forma que a revitalização está posta – para ele sem participação da população, de forma não integrada e sem consistência – “não vai prosperar”.
Na mesma entrevista à Tribuna da Bahia, Geddel afirmou que, diante dos protestos presenciados na viagem, “achamos que não existiu quase nada, meia dúzia de pessoas arregimentada vinculadas a um grupo apenas para querer fazer um protesto sem nenhuma ressonância”. Por outro lado, o ministro ponderou que a obra ainda deve enfrentar desafios junto aos movimentos, no processo licitatório e em outras áreas, mas disse estar convencido de que o projeto “é absolutamente viável do ponto de vista técnico, político e social”.
De acordo com Gogó, a agilidade com que o governo organizou e realizou a viagem dificultaram a organização dos movimentos para protestar na presença de Geddel. Além disso, o Congresso Nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em Brasília, também teria diminuído a possibilidade de maiores manifestações. “E terceiro, a estratégia dos movimentos é outra. E ela virá à tona”, afirmou.
(Por Antonio Biondi,
Agência Carta Maior, 22/06/2007)