Uma cidade sem automóveis, pensada para pedestres, que funciona com fontes de energia renovável e está rodeada por fazendas eólicas e fotovoltaicas, parecerá uma miragem em meio ao deserto rico em petróleo. O plano de US$ 5 bilhões, digno de um filme de ficção científica, será implementado em Abu Dhabi, capital dos Emirados Árabes Unidos, e será o mais próximo de uma cidade sem carbono e sem desperdícios, quando estiver concluída, em 2009. Com os princípios de planejamento típicos de uma cidade amuralhada e da tecnologia existente que favorece o desenvolvimento sustentável, esta extensão de seis quilômetros quadrados abrigará uma comunidade energética, científica e tecnológica.
O ambicioso plano de construir uma cidade verde chamada Iniciativa Masdar (masdar significa fonte em árabe) está a cargo da Companhia de Energia Futura de Abu Dhabi, propriedade da Mubadala Development Company, uma firma de investimentos do governo local. “Sendo a primeira grande nação produtora de petróleo a dar esse passo, Abu Dhabi adotou uma posição de liderança com o lançamento de Masdar”, disse o diretor-geral do projeto, sultão Ahmed al Jaber. “Será uma plataforma cooperativa global de amplo compromisso com a busca de soluções para as questões mais preocupantes da humanidade, como segurança energética, meio ambiente e verdadeiro desenvolvimento humano sustentável”, explicou.
Em Abu Dhabi se encontram mais de 90% dos recursos petrolíferos dos Emirados, e as reservas do país, superiores a 100 bilhões de barris, são a terceira do mundo. Na cidade verde será instalado o Instituto Masdar de Ciência e Tecnologia, criado de forma conjunta com o Instituto Tecnológico de Massachussets, dos Estados Unidos, e contará com laboratórios de primeira linha, área comercial para as empresas do setor e um seleto conjunto de moradores que investirão, desenvolverão e comercializarão técnicas avançadas em matéria de energia.
Ali também ficarão os escritórios da Masdar, haverá alojamento para o pessoal, museu de ciência e instalações de entretenimento educativo. Inicialmente poderá abrigar cerca de 50 mil pessoas e, em seguida, até 100 mil. “Criamos um ambiente de sinergias. Trata-se de um verdadeiro grupo em matéria de energia alternativa com pesquisadores, estudantes, cientistas e pessoas ligadas à área dos investimentos. Combinará talento, experiência e recursos para possibilitar grandes avanços tecnológicos”, explicou al Jaber à IPS. Para que a iniciativa atraia a atenção apesar das duras condições climáticas e das altas temperaturas, que em julho e agosto chegam a 50 graus, estão previstos – pensando nos pedestres – caminhos sombreados e ruas estreitas.
A maior distância para se ter acesso a qualquer instalação provavelmente não superará os 200 metros e será complementada com um sistema de transporte rápido e pessoal. Esta cidade auto-sustentável oferecerá um pacote de incentivos para mais de 1.500 empresas que incluirão um programa de compras integrado de serviços estatais, leis transparentes, total acesso à propriedade por parte de estrangeiros, zona livre de impostos, proteção de patentes e proximidade de manufaturas, fornecedores e mercados.
Mohammed Raouf, do Centro de Pesquisa do Golfo, com sede em Dubai, disse que a iniciativa de Abu Dhabi pode ser copiada e melhorada. “Necessitamos de algo além de idéias e pesquisas, precisamos implementá-las de forma efetiva. Com sorte, a iniciativa atrairá outros nesta região”, afirmou. Porém, o ambientalista se mostrou céptico quanto à meta de “zero de emissão de carbono. Mas sem duvida, o projeto contribuirá para reduzi-las drasticamente”, acrescentou.
De acordo com o Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança climática, o acúmulo na atmosfera de gases causadores do efeito estufa provocará no Oriente Médio um aumento de temperatura entre um e dois graus nos próximos 25 anos. A cidade verde fará parte de uma decisão política adotada por Abu Dhabi em abril de 2006 a favor de tecnologias renováveis e sustentáveis. Os Emirados estabeleceram em março o início de um grande programa sobre emissões de dióxido de carbono, um dos gases responsáveis pelo efeito estufa, aos quais a maioria dos cientistas atribui o aquecimento do planeta, e anunciou a criação de uma rede nacional de captura a armazenamento desse gás.
Estima-se que a rede pode reduzir as emissões em quase 40%, aumentar a produção de petróleo em mais de 10% e liberar grandes quantidades de gás natural. Isto seria conseguido isolando o gás de fontes ligadas a atividades industriais e energéticas e o transportando às jazidas para melhorar a recuperação de hidrocarbonos. Ao anunciar o plano, o príncipe herdeiro de Abu Dhabi, xeque Mohammed bin Zayede al Nahyan, disse: “Somos um dos maiores fornecedores de energia do mundo. Por isso devemos agir, e o fazemos, com responsabilidade, na busca permanente e na incorporação de tecnologia para que o fornecimento seja mais eficiente na proteção do meio ambiente”.
Abu Dhabi também pretende investir US$ 350 milhões em uma usina de energia solar com capacidade para 100 megawatts e aproveitar a tendência mundial de investidores preocupados com o meio ambiente. A central poderá ser ampliada para 500 megawatts com o objetivo de fornecer energia a aproximadamente 500 mil domicílios. “Como ambientalista, estou disposto a pagar para viver em um lugar melhor. Mas os cidadãos comuns, especialmente os de baixa renda, não lhes importa ou não entendem. Por isso, é importante que o custo do desenvolvimento verde se mantenha em níveis acessíveis”, disse Raouf à IPS. “Ao criar a primeira cidade livre de carbono do mundo, Masdar demonstra seu compromisso com a mudança da forma como o mundo entende a utilização de fontes sustentáveis de energia”, acrescentou.
(Por Meena Janardhan, IPS, 25/06/2007)