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crise da água desmatamento
2007-06-26

Há mais de seis anos, habitantes da comunidade rural de Lomas del Viento, no Oceano Pacifico nicaragüense, assumiram a tarefa de ressuscitar os dez mananciais que estavam secando por causa do desmatamento de florestas vizinhas. E conseguiram. Lomas del Viento é uma pequena vila de produtores agrícolas que há mais de 200 anos moram em algumas colinas, 22 quilômetros ao sul do município de Santa Teresa, no Departamento de Carazo, sudoeste do país. A região sempre foi de floresta, de montanhas pródigas em flora e fauna, com abundantes olhos de água e rios. Porém, há cerca de 12 anos tudo começou a mudar.

Pouco a pouco, os camponeses foram invadindo as florestas das colinas e promovendo queimadas para poderem plantar grãos para o consumo, contou ao Terramérica Maria Margarita Carmona, nascida nesse lugar. Outras famílias, diante da pobreza e impossibilidade de conseguir empréstimo para fazer a terra produzir, venderam suas propriedades a negociantes de madeira e criadores de gado que, após cortarem as espécies madeiráveis, arrasaram as florestas menores para converter em pastos, acrescentou. “Nos deu medo quando os rios começaram a secar e tivemos de buscar água quilômetros acima nas montanhas”, disse Carmona.

Dos dez mananciais que saciaram a sede de várias gerações em Lomas del Viento, seis anos atrás só restavam dois à disposição das famílias dos arredores, contou ao Terramérica Marcial Umaña, dirigente comunitário. Os outros oito estavam secos e cheios de escombros da construção de uma estrada, que leva os turistas ao refúgio de vida silvestre de Chacocente, nas praias do Pacifico. “As pessoas começaram a se preocupar porque a cada dia ficava mais difícil conseguir água e já quase não chovia. Tínhamos de subir as montanhas em busca dos poços de água, mas já quase nenhum tinha liquido”, recordou Umaña. Diante da crise, uma comissão da comunidade pediu ajuda ao centro do município de Santa Teresa para construir um poço, acrescentou.

Na prefeitura não havia recursos, mas sim dados que os conduziram até a organização não-governamental Terra e Vida. Segundo Reinerio Mongalo, técnico dessa entidade, uma equipe de especialistas fez três descobertas em Lomas del Viento: seu potencial turístico, o escorrimento da água para camadas mais profundas do solo e – o mais preocupante – um ritmo de destruição ambiental que poderia deixar as encostas de uma ampla serra aptas somente para a pecuária. Ou mudam os métodos de produção agrícola ou digam adeus às suas últimas florestas e rios, disseram os técnicos da Terra e Vida.

“Ficamos muito impressionados com a alternativa. É difícil aceitar o desaparecimento de todas as florestas de onde alguém se criou, aquelas árvores gigantes e aqueles rios bravos”, disse ao Terramérica Marcial Jáenz, jovem que agora administra o projeto turístico comunitário de Lomas del Viento. Das 40 familias da região, a metade acolheu imediatamente o projeto e começaram a aplicar planos de manejo ambiental, deixaram de fazer queimada para poder semear e trocaram os pesticidas químicos por orgânicos. As outras 20 famílias ainda observam o processo e prometeram integrar-se a ele quando vierem seus frutos.

Enquanto alguns plantaram 20 mil árvores em áreas destruídas pelo corte, outros limparam os mananciais que haviam perdido, reflorestaram suas bacias e as cercaram com plantas naturais. Após seis anos de esforços, a comunidade comprovou que os oito mananciais cheios de lama e lixo voltaram a dar água. As árvores gigantes que foram conservadas começaram a ser povoadas de macacos uivador (Alouatta palliata) e de aves que há anos não eram vistas na área, e sumiram as nuvens negras que eram produzidas anualmente pelas queimadas para a semeadura com a entrada do inverno.

Desde que foi oficialmente inaugurado o projeto turístico rural, há 16 meses, cerca de 1.560 turistas estrangeiros e nacionais percorreram caminhos e viram o milagroso ressurgimento de águas cristalinas. Este ano, o Ministério da Saúde certificou que a água que brota de todos os mananciais de Lomas del Viento é própria para consumo humano. Contudo, nem todas as comunidades da Nicarágua têm essa janela de oportunidade. Em maio, uma pesquisa do não-governamental Centro Alexander von Humboldt revelou que 70% das águas superficiais deste país estão contaminadas por lixo doméstico e industrial.

O Informe de Desenvolvimento Humano para a Nicarágua, apresentado este mês pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), diz que mais de 70% dos cinco milhões de nicaragüenses são afetados pela falta de água potável. A Comissão Nacional de Água Potável e Saneamento reconheceu, em um documento de agosto de 2006, que apenas um quarto das famílias nicaragüenses tem acesso a água segura. A Nicarágua deveria garantir água limpa e saneamento a pelo menos 2,5 milhões de pessoas antes de 2015 para cumprir um dos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, adotados pela comunidade internacional em 2000. Na América Latina, há cerca de cem milhões de pessoas sem nenhum saneamento e cerca de 50 milhões sem água potável. No mundo são mais de um bilhão os que não possuem água segura para beber, de acordo com as Nações Unidas.
(Por José Adán Silva, Terramérica, 25/06/2007)

 


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