O CNPE (Conselho Nacional de Política Energética) se reúne hoje (25/06) e poderá decidir sobre a construção da usina nuclear de Angra 3. Dentro do governo, há oposição do Ministério do Meio Ambiente. Fora, questionamentos de especialistas e investidores sobre a oportunidade de se construir mais uma usina nuclear e sobre o custo da energia que poderá ser gerada.
Com a retomada já anunciada pelo próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o aval do CNPE é considerado pela ala do governo favorável à usina (ministérios de Minas e Energia e da Ciência e Tecnologia, principalmente) como uma mera formalidade. Se aprovada, a usina demoraria pelo menos cinco anos e meio para ser construída, consumiria aproximadamente R$ 7,2 bilhões e poderia gerar 1.305 MW (megawatts).
A principal linha de defesa do projeto dentro do governo é o aspecto "estratégico": o Brasil precisaria estimular o conhecimento científico nessa área e de alternativas de geração de energia no longo prazo a partir de 2025, quando as melhores opções de construção de hidrelétricas já terão se consumado.
"É importante sobretudo como visão estratégica de longo prazo. A partir de 2025 já começam a faltar opções para compor a base de geração. Nesse caso, a opção nuclear é bem interessante", afirma Maurício Tolmasquim, presidente da EPE (Empresa de Pesquisa Energética, estatal que planeja o setor). Tolmasquim defende a construção de Angra 3 e de mais quatro usinas nucleares, uma a cada cinco anos.
Responsável por pensar o setor a longo prazo no governo, ele acha que a discussão hoje já está mais madura, mas diz que o assunto é polêmico. "Não é unânime, mas nem sempre é possível a unanimidade."
Dentro da linha de argumentos a favor da usina, a Aben (Associação Brasileira de Energia Nuclear) avalia que o aumento da demanda por energia é determinante para a decisão.
"No momento atual, com crescimento de demanda e dificuldade de atendimento, fica claro que o Brasil não pode abrir mão de Angra 3", disse Francisco Rondinelli, presidente da entidade.
CríticasPara o físico nuclear José Goldemberg, a construção da usina não é uma boa idéia por vários motivos. Segundo ele, um dos argumentos que não devem ser usados para defender a opção nuclear é o risco de falta de energia no médio prazo. "Autorizar Angra 3 não vai resolver a crise que se avizinha para daqui a três ou quatro anos", disse. Goldemberg foi membro do CNPE no governo Fernando Henrique Cardoso. "A usina levaria entre cinco e sete anos para ficar pronta."
Goldemberg diz também que os argumentos ambientais pró-usina -geração nuclear produz energia sem emitir gases que contribuem para agravar o efeito estufa- não são suficientes, porque a quantidade de gases que deixaria de ser emitida é muito pequena se comparada com prejuízos causados pelas queimadas na Amazônia, por exemplo.
Segundo ele, a opção preferencial do país deveria continuar sendo a energia renovável, principalmente a hidrelétrica. "É preciso destravar as hidrelétricas no país. Acho que é necessário rever o processo de licenciamento ambiental."
Para Luiz Pinguelli Rosa, coordenador do Programa de Planejamento Energético da Coppe/UFRJ, a usina de Angra 3 não seria prioritária. "Acho admissível, mas não vejo prioridade. Acho que o governo precisa ter coragem de enfrentar a batalha das hidrelétricas. Estou sentindo um certo escapismo com o problema."
Pinguelli se refere à dificuldade do governo de licenciar hidrelétricas de grande porte, como as do rio Madeira (RO). "Há mais o que fazer do que as hidrelétricas do rio Madeira. Angra 3 não pode ser uma represália [ao atraso no licenciamento]", disse.
O mercado também vê com ressalvas a possibilidade de contar com mais uma usina nuclear. "Não é imprescindível hoje. Tenho muito mais perguntas do que respostas sobre isso", afirma Cláudio Salles, presidente do Instituto Acende Brasil, organização que reúne os principais investidores privados em energia no país.
Segundo o representante dos investidores, é preciso mais transparência no investimento para saber como se formará a tarifa de Angra 3. O temor é que o governo coloque, compulsoriamente, uma energia subsidiada no mercado.
(Por Humberto Medina,
Folha de S. Paulo, 25/06/2007)