Há razões energéticas e econômicas para concluir a terceira central nuclear, mas segurança e controle de custos são decisivos
ENERGIA NUCLEAR constitui um tema em geral tratado com excesso de emoção -no Brasil, agravada pelo histórico de um programa nuclear secreto que consumiu bilhões até ser liquidado, em 1990. Agora que se avizinha o momento de decidir sobre a construção da terceira central do país, Angra 3, convém dotar o debate de mais racionalidade.
Se não sair da pauta pela enésima vez, a decisão pode ocorrer hoje (25/06) em reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE). Tudo indica que o governo federal já se inclinou por construir Angra 3, cujas obras pararam em 1984. As outras centrais em operação, Angra 1 e 2, fornecem cerca de 2% da eletricidade consumida no Brasil.
A estatal Eletronuclear alega que já foi despendido R$ 1,5 bilhão em equipamentos e estudos prévios. Com o investimento de mais R$ 7 bilhões, a usina poderia ficar pronta em cinco anos e meio, asseguram os nucleocratas. Na melhor das hipóteses, Angra 3 entraria em operação em 2013, quando o país decerto precisará desses 1.350 megawatts (MW) de capacidade.
Do ângulo energético e econômico, portanto, faz sentido construir a central. Está em curso, ademais, uma revalorização da energia nuclear como forma de geração relativamente limpa, no que respeita ao aquecimento global. A crescente demanda por eletricidade vem sendo suprida por termelétricas a combustíveis fósseis (gás, carvão e óleo), emissores de gases que agravam o efeito estufa. O próprio governo federal estima que a participação da hidreletricidade na matriz energética cairá de 83% para 74% em 2030.
Resta a questão da segurança, que ainda assombra a imaginação pública com o fantasma de Tchernobil (1986). Foi o único acidente com vítimas fatais (meia centena) registrado em 53 anos. Estão em funcionamento no mundo 437 centrais, com potência de 370 mil MW. Há 30 em construção, a maioria na Ásia.
Angra 3 é uma usina de segunda geração, como a maioria no mundo. Incorpora vários itens de segurança exigidos internacionalmente após Tchernobil. Angra 2, projeto gêmeo, funciona sem percalços desde 2000.
O licenciamento ambiental de Angra 3 foi retomado na semana passada em audiências públicas, que levantaram a questão do lixo nuclear. Hoje os rejeitos são colocados de modo provisório em piscinas nas próprias centrais, situação anômala. Pode não ser o caso de exigir solução definitiva para concluir Angra 3, mas seria um erro deslanchar outras 4 a 8 centrais planejadas sem definir local e projeto para tanto.
A energia de usinas nucleares -caras de construir e baratas de operar- é competitiva só se a obra não sofrer atrasos e acréscimo de custos. O investimento em Angra 3 é de US$ 1.800 por quilowatt (a referência internacional está em US$ 1.300-1.500), e o custo de geração vai a estimados R$ 131 a R$ 169 por megawatt-hora, que cabem raspando na referência dos leilões de energia nova (inferior a R$ 140/MWh).
Num país como o Brasil, reside no preço final da energia a maior incógnita sobre Angra 3.
(
FSP, editorial, 24/06/2007)