Um trecho de 26 metros de um córrego afluente do Rio Tamanduateí, em Mauá, na região do ABC, foi vendido por R$ 39.342 para uma empresa da cidade em 2004. Para que a proeza - proibida pela Constituição do Estado por ser loteamento em área verde - fosse permitida, o prefeito do município na época, Oswaldo Dias (PT), sancionou uma lei trocando a classificação da área e autorizando a venda.
A empresa que comprou a parte do rio é a Albertson do Brasil, com unidade na Vila João Ramalho, em Mauá, e sede na capital. Os pagamentos foram feitos com entrada de R$ 5 mil e dez parcelas de R$ 3.434, sendo que a última foi paga em outubro de 2005. A área total vendida é de 104 metros quadrados. A empresa teve interesse na área pois o rio fica na entrada da unidade de Mauá, onde passam veículos e funcionários.
Na lei sancionada pelo ex-prefeito, a área classificada como bem de uso comum do povo foi incorporada à classe de bens patrimoniais, o que permitiu o financiamento. No entanto, de acordo com relatório concluído em agosto de 2006 pelo procurador-chefe do município, Marcos Pereira Guedes, o trecho é tratado no documento como viela e não como córrego, por onde passa água corrente. “Isso permitiu a venda irregular.”
Além da compra, parte do córrego foi canalizada sem autorização do Estado, o que é crime ambiental, segundo o procurador. “Enviaremos um relatório ao Ministério Público para a entrada de uma ação civil pública contra a empresa”, afirmou Guedes. Segundo ele, a lei sancionada pelo ex-prefeito não traz informação que permita a canalização. “O crime também está na não-fiscalização das obras de canalização por parte da administração anterior.”
Como medida, o atual prefeito da cidade, Leonel Damo (PV), sancionou nova lei, em 1º de junho, revogando a lei anterior, de 2003. “O prefeito não sabe de tudo o que acontece na cidade. Só tomei conhecimento da venda do córrego no fim do ano passado, quando o proprietário procurou a Prefeitura para pegar a escritura do bem”, revelou. Com isso, o rio voltou a ser patrimônio público de uso comum do povo.
Apesar de não se recordar da venda da área especificamente, o ex-prefeito Oswaldo Dias alegou que pode apenas ter legalizado uma situação que já acontecia. “Só foi vendida uma área que já era usada pela empresa”, afirmou. De acordo com ele, a venda não é criminosa. “Não vendemos o rio. Ele continua lá. O que foi vendido é a área em que ele se encontra. O que não pode ser feito é construir algo em cima do córrego.”
Procurada ontem (21/06) pela reportagem, a Albertson do Brasil não se pronunciou sobre o caso, alegando que o proprietário estava viajando e só volta na semana que vem. A empresa entrou ontem com representação no Ministério Público contestando a revogação da lei pelo prefeito Leonel Damo. O documento também solicita a entrega da escritura pela prefeitura. “É um direito da empresa recorrer da ação. A prefeitura irá agora responder sobre a mudança na lei”, disse o procurador.
(Por Gabriela Gasparin,
Estado de S. Paulo, 22/06/2007)