O hidrogênio é uma fonte de energia que se caracteriza pela eficiência, sustentabilidade e pelo alto custo. Apesar de investimentos e incentivos em P&D no setor serem fundamentais para o desenvolvimento da tecnologia, isso não tem acontecido no Brasil. Essas são as principais constatações que o pesquisador do Laboratório de Hidrogênio da Unicamp, Ennio Peres da Silva, apresentou no último seminário do Instituto de Geociências da universidade. Ele mostrou o estado das principais tecnologias e programas brasileiros do uso energético do hidrogênio.
De acordo com o último relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), divulgado no início de maio, o planeta tem condições financeiras e tecnológicas para impedir o aquecimento global, mas precisa de compromisso político entre os governos.
Entre as medidas propostas para reduzir o efeito estufa, está justamente a economia do hidrogênio como energia, além da abolição dos combustíveis fósseis e adoção de novos padrões energéticos, nucleares e renováveis.
A maioria das fontes renováveis produz diretamente apenas energia elétrica, exceto biomassas, que fornecem combustíveis. Assim, a conversão de eletricidade em combustível é desejável, como é o caso do hidrogênio. “A tecnologia do uso desse elemento deve-se a soma de utilidade energética e vantagens ambientais. Pelo fato de não ser poluente pode ajudar a frear o aquecimento global. Apesar disso, não há reservatórios de hidrogênio no planeta. Uma das dificuldades é que para obtê-lo, é necessário dissociar compostos, pois ele se encontra apenas associado a outros elementos químicos”, afirma Silva.
Entre os processos de liberação de hidrogênio, além da eletrólise da água (eficiente e em aperfeiçoamento), é possível citar a reforma de hidrocarbonetos, como metano, derivados do petróleo e etanol. No entanto, a novidade tecnológica dos últimos anos é a célula à combustível, a partir de dispositivos que convertem diretamente a energia química em eletricidade - ao contrário dos métodos tradicionais, onde a energia química passa por diversas fases até se tornar elétrica. “Trata-se de uma tecnologia viável em diversas aplicações, podendo ser usada em larga escala, com baixo impacto ambiental. O desafio é justamente seu alto custo. Pode ser que haja uma aplicação mais intensiva até 2015, a velocidade do desenvolvimento da tecnologia vai depender das preocupações sócio-ambientais e investimentos”, alerta o pesquisador da Unicamp.
Programas estruturam a economia do hidrogênioAlém das pesquisas e debates na Unicamp, o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), da USP, atua na área desde 2000. Em 2007, inaugurou o Programa de Células a Combustível e Hidrogênio (Procel), com o objetivo de gerar conhecimento e tecnologia na área. O coordenador do projeto, Marcelo Linardi, afirma que “a plena economia do hidrogênio prevê que ele venha de fontes renováveis, garantindo sustentabilidade”.
O hidrogênio como energia já tinha sido analisado na década de 70, em função da crise do petróleo. Mas foi só a partir das preocupações ambientais nos anos 90, que a idéia tomou força. Em 2002, foi criado no país o ProCac (Programa Células a Combustível), vinculado ao Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT), com recursos de fundos setoriais. Após reformulações, em 2005, a rede mudou para Programa de Ciência, Tecnologia e Inovação para a Economia do Hidrogênio.
Segundo dados do “Roteiro para a estruturação da economia do hidrogênio no Brasil”, coordenado pelo Ministério de Minas e Energia (MME), com integração técnica do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT), em 2010 o Brasil deve iniciar a geração comercial de hidrogênio a partir da reforma de gás natural e em 2020, do etanol. “É provável que em 2030 o hidrogênio tenha boa participação na matriz energética do país. A intenção agora é gerar fontes de conhecimento, fazer patentes e não apenas importar modelos prontos”, diz Adriano Duarte Filho, coordenador de tecnologias setoriais do MCT.
Mas, enquanto a viabilidade da economia do hidrogênio é discutida, pesquisadores contestam o atual panorama das pesquisas no Brasil: “Apesar da vigência do programa e de iniciativas privadas, os fundos setoriais não funcionam, então o programa está prejudicado financeiramente. Os grupos de pesquisa continuaram trabalhando, com pequenas parcerias e sem dinheiro do governo. A falta de ação do MCT fez com que o MME avançasse mais nessa temática, propondo um amplo programa de inovação. Porém, com a mudança de gestão neste ano, a inoperância continua”, denuncia Silva, que acredita que a célula a combustível será desenvolvida fora do Brasil. De fato, investimentos no setor, na Alemanha e nos EUA, foram superiores a 2,2 bilhões de dólares entre 1999 e 2005.
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Envolverde/Revista Com Ciência, 21/06/2007)