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2007-06-20

A tão rica quanto ameaçada biodiversidade dos Altos de Cantillana, um cordão montanhoso na região metropolitana da capital chilena, recebe há dois anos a atenção de um inédito e ambicioso modelo de conservação implementado pelo governo e por particulares. Os Altos de Cantillana são montanhas descontinuas de mais de dois mil metros de altura que pertencem à Cordilheira da Costa, que abriga quebradas e vales profundos onde vivem cerca de 180 mil pessoas distribuídas em cinco comunas do sudoeste da região metropolitana: Alhué, ilha de Maipo, Melpilla, Paine e São Pedro. Seus 205 mil hectares abrigam oito espécies vegetais e pelo menos 163 de vertebrados entre anfíbios, répteis, aves e mamíferos, dos quais 15% se encontram no Chile.

Os Altos de Cantillana estão nas mãos de 2.500 proprietários privados, particularmente grandes empresas produtoras. As atividades econômicas realizadas na área são agricultura, mineração, pecuária e coleta de lenha e húmus, que é a camada superficial do solo constituída pela decomposição de material animal e vegetal. Em 2004, a região foi declarada área prioritária número um na Estratégia para a Conservação da Biodiversidade na Região Metropolitana de Santiago.

“Trata-se de uma zona mediterrânea, situada na área central do Chile, de muito interesse mundial por sua grande biodiversidade, mas que, ao mesmo tempo, está sofrendo muito o impacto provocado pelo ser humano. É considerada uma área crítica”, disse à IPS Diego Urrejola, consultor do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e coordenador do projeto GEF-Cantillana. O plano Conservação da Biodiversidade nos Altos de Cantillana 2005-2009 começou há dois anos, financiado pelo Estado chileno e pelo Fundo para o Meio Ambiente das Nações Unidas (GEF). Conta com orçamento de US$ 2,1 milhões, metade dos quais colocados pelo governo do Chile.

O programa é implementado através do Pnud e o órgão executor é a governamental Comissão Nacional do Meio Ambiente (Conama). Mas um de seus principais atores é o Comitê Diretor, formado pelos signatários do Acordo Público-Privado para a Conservação do Cordão do Cantillana, de 2005, ao qual aderiram 15 organismos públicos, cinco municípios e 13 proprietários privados. O projeto nasceu precisamente com produto do interesse em conservar a região, mas também para estimular a produção, expresso tanto pelo setor público quanto pelos atores privados.

Algumas das empresas instaladas na área são mineração Florida; divisão el Teniente da estatal Corporação Nacional do Cobre (Codelco); companhia chilena Agrosuper, maior produtora de carne do país, e diversas empresas agrícolas. Pelo acordo, os proprietários se comprometem a “elaborar os planos de manejo para suas respectivas propriedades e atividades” e a “colaborar na minimização dos danos sobre a diversidade biológica e fomentar a proteção e conservação do território com atividades econômicas sustentáveis”. As principais causas da perda de biodiversidade são desmatamento e pastoreio ilegal, extração de húmus e existência de lixões ilegais que contaminam a água.

Urejola criticou especialmente as más práticas no campo. “A agricultura baseada na tecnologia exerceu uma pressão sobre os montes. As vinhas e plantações de abacate estão subindo porque é possível irriga-los mais acima. Também preocupa o turismo e a recreação descontrolada, que podem contaminar o lugar e provocar incêndios”, afirmou. “O objetivo principal do projeto GEF-Cantillana é a conservação da biodiversidade da área, mas através de um modelo de gestão público-privado”, sintetizou seu coordenador. Hoje não existe um sistema de administração misto de áreas privadas.

“O que nos propusemos é extremamente inovador: armar uma institucionalidade público-privada, isto é, um sistema que tenha personalidade jurídica, orçamento e que ajude o desenvolvimento local”, disse Urrejola. “Hoje trabalhamos com 11 propriedades que cobrem, aproximadamente, 30% da área total e logo outras se somarão”, acrescentou. Nestes dois anos foram criadas as linhas de ação do projeto. A primeira é a preservação do lugar, que contempla a coleta de informação biológica e social junto com a identificação dos instrumentos formais e informais disponíveis para conservar uma área que não está na órbita do Estado.

A segunda linha de ação é a produção sustentável. “No comitê diretor estamos trabalhando com os grandes proprietários. Entretanto, a sustentabilidade dos produtos do projeto se verá nos nível comunitário e social. Por isso, estamos desenhando um programa de fomento produtivo para micro, pequenos e médios produtores agrícolas”, afirmou Urrejola. No caso da pequena comunidade de Alhué, de grande tradição agrícola e cultural, mas de baixo desenvolvimento humano, se pensou, por exemplo, em criar associações de pequenos e médios apicultores com a idéia de ganharem mercados graças a processos sustentáveis. Além disso, o município pretende conseguir autorização para desenvolver uma trilha turística em los Altos.

Em terceiro lugar, o plano de ação prevê “o fortalecimento da fiscalização, para tornar mais eficientes os recursos públicos destinado a esse item e envolver, em alguma etapa, os particulares, seja nos fluxos de informação ou no autocontrole”, afirmou Urrejola. A quarta linha de ação é a educação e a capacitação. Por fim, se contempla o ordenamento territorial. Urrejola explicou que no segundo semestre deste ano estas diretrizes serão implementadas e que em 2008 serão potencializadas. Em 2009 já deverá ser “auto-sustentável”, embora os resultados só serão vistos a longo prazo, ressaltou.

O consultor do Pnud disse que um dos aspectos mais complexos do projeto “foi identificar os verdadeiros interesses dos atores com os quais trabalhamos e aqueles com os quais não trabalhamos. Há proprietários que só querem conservar a biodiversidade, alguns preferem ajudar a comunidade e outros têm múltiplos interesses, desde pastagem do gado até fomento do turismo. Conhecer esses interesses, compatibilizá-los e agrupá-los em um sistema de gestão a longo prazo, sustentável, não é fácil”, disse Urrejola. Outro obstáculo foi chegar à comunidade. “Comprovamos que os municípios têm boa disposição, mas baixa capacidade financeira e técnica. Os municípios são chave nisto e fortalecer sua gestão é muito importante”, acrescentou.

Aquiles Miranda, gerente de gestão integrada de Mineração de Ouro Florida, que pertence à multinacional canadense Meridian Gold, disse à IPS que “uma das contribuições do Acordo Público-Privado foi realizar um zoneamento” da área, distinguindo entre setores de preservação, conservação, amortização e produção. “A Mineração Florida tem todas suas instalações e operações em uma zona de produção”, ressaltou Miranda, para quem o acordo só confirmou o conceito de mineração responsável da empresa. Em 2004, a firma começou a plantação de 17 hectares de palma chilena e nos próximos três anos espera plantar mais 60 mil árvores. A companhia participa ativamente do comitê diretor do projeto. “Cremos que é uma excelente instância de diálogo para conseguir acordos e enquadrar legalmente algumas das atividades realizadas na área”, disse Miranda, embora lamentando a lentidão com que o projeto avança.

(Por Daniela Estrada, IPS, 19/06/2007)


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