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2007-06-20

Durante décadas Portugal olhou de rabo de olho as infinitas possibilidades que lhe proporciona sua geografia privilegiada para produzir energia limpa. Mas agora a situação começa a mudar e este país se coloca entre os que mais apostam nas fontes alternativas. O sol mais abundante da Europa, os fortes ventos do oeste, os caudalosos rios e as imensas ondas do oceano Atlântico foram elementos tradicionalmente ignorados por um país que sempre optou por investir boa parte de sua renda no pagamento da conta do petróleo.

Portugal já é atualmente, com vários projetos em vias de execução, uma das nações com a meta mais elevada entre os 27 membros da União Européia quanto à intenção de ter, até 2015, 45% da energia elétrica produzida a partir de fontes renováveis. Desde que assumiu o poder em março de 2005, o governo socialista fixou a ambiciosa meta de recuperar um atraso de décadas nesta área. As condições políticas eram notoriamente favoráveis, já que nessa data assumiu com chefe do poder Executivo José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa, um político que em sua juventude se empenhou nas causas ambientais.

Apesar de ser um ferrenho defensor da contenção do déficit do orçamento geral do Estado em áreas tão sensíveis como a educação e a saúde, Sócrates faz vista gorda quando se trata do meio ambiente, ao aprovar vultosos investimentos em energia eólica, hídrica, solar e até das ondas do oceano, tecnologia na qual Portugal é pioneiro no mundo. Estimativas do presidente da Associação de Empresas de Energia Renováveis, Antonio Sá da Costa, divulgadas no último dia 6 pela revista mensal Economia, do jornal Público de Lisboa, a meta de energia eólica instalada até 2012 será de 5.700 megawatts (MW), a produzida pelas ondas de 250 MW, e a hídrica ficará em 6.200 MW em 2015.

Costa prevê que em 2020, com os investimentos previstos em energia eólica, hídrica e de ondas, Portugal poderá alcançar a meta de 60% de uso de energia renovável. Tudo isto sem contar com a imensa obra do vale de Baldio das Ferrarias, nas proximidades da cidade de Moura, onde se constrói a maior central de energia solar do mundo, aproveitando a disponibilidade de 2.550 horas de sol por ano, como disse às IPS seu prefeito, José Maria Pos-de-Mina.

Esta central custará US$ 338 milhões e ocupará uma área de 114 hectares, onde estão sendo instalados 350 mil painéis solares. Em maio de 2008 começará a produzir 62 MW “e, com isso, reduzirá emissões de dióxido de carbono em 87,5 mil toneladas”, destaco Pos-de-Mina. “Com 62 milhões de watts, nossa central terá uma dimensão 12 vezes superior à da maior central solar do mundo atualmente, que fica na Alemanha e produz apenas cinco MW”, acrescentou o prefeito desta comarca tradicionalmente pobre e com tendência a ser despovoada e que agora vê sua oportunidade de reverter os dois fenômenos, porque, como explicou à IPS, “estamos diante de uma obra sem paralelo no mundo”.

Pos-de-Mina, um prefeito comunista que reconhece mover-se com desenvoltura “no mundo tentacular do mercado global”, fundou a empresa Amper, controlada em 88% pelo município de Moura, como autora do projeto, o qual depois vendeu por uma soma não revelada à empresa espanhola Acciona, uma das líderes mundiais no campo das energias renováveis. Na fase atual, já está em funcionamento a fabricação e montagem de módulos de tecnologia fotovoltaica, baseada em materiais semi-condutores que permitem a transformação direta da radiação solar em energia elétrica, um sistema que teve um auge na década de 70 por causa da crise do petróleo que marcou essa época.

Mas até que a central de Moura comece a operar com os primeiros 240.240 painéis em dezembro próximo, como Portugal conta desde fevereiro com a maior central solar do mundo, com capacidade para abastecer com “energia limpa” cerca de oito mil domicílios. Trata-se da
(CSS), que fica na mesma zona ensolarada do sul do país. A CSS representa investimento de US$ 80 milhões, correspondentes ao custo dos 32 hectares cobertos por 52 mil painéis solares fotovoltaicos, com capacidade instalada de 11 MW.

Segundo o engenheiro italiano Piero dal Maso, executivo da Catavento, a empresa portuguesa que desenvolveu o projeto, a central produzirá 20 gigawatts/hora de energia por ano, o suficiente para economizar mais de 30 mil toneladas de emissões de gases causadores do efeito estufa. Esta central produzirá energia limpa para a rede elétrica nacional durante os próximos 15 anos, em uma colaboração entre Catavento, que administrará a central, a firme norte-americana General Electric, financiadora e proprietária, e a Powerlight, principal empresa mundial abastecedora de energias alternativas.

Quanto à energia eólica, após várias décadas em que se fazia de conta que o vento não soprava, a situação mudou radicalmente e no final de 2006 já havia 1.055 aerogeradores operando no país, equivalentes a 59% da meta traçada para 2010, e este ano a construção segue num ritmo bom, estimando-se que serão acrescidas 536 novas unidades. Até o final do ano passado a potência eólica emanada das turbinas era fixada em 2.779 MW, isto é, mais da metade dos 5.100 MW imposta para 2012.

Por outro lado, em Aguçadoura, na costa norte de Portugal, desde outubro passado 2,25 MW de energia produzida pelas ondas do oceano chegam à terra por meio de um cabo submarino, ajudando a alimentar a rede nacional da distribuição da estatal Eletricidade de Portugal. Uma quantidade modesta de energia, mas sua importância é ser a primeira central energética do mundo que usa as ondas do oceano como fonte de energia renovável, com um potencial de desenvolvimento futuro imprevisível dentro do desenvolvimento das fontes alternativas, sejam estas hidráulicas, fotovoltaicas, eólicas, geotérmicas e de biomassa.

Dessa forma, Portugal assume o papel pioneiro no uso das ondas, que, de acordo com as previsões dos especialistas, em todo o planeta pode chegar nos próximos 40 anos a um volume de negócios anuais de US$ 50,5 bilhões. Uma soma considerável se levando em conta que equivale a 30% do atual produto interno bruto de Portugal, US$ 166,450 bilhões em 2006. E Lisboa estaria em condições de conquistar 10% do mercado mundial desta tecnologia.
(Por Mario de Queiroz, IPS, 19/06/2007)


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