A Holanda desenvolveu um projeto inovador e ambicioso para se proteger dos efeitos do aquecimento global. O país planeja criar hidrometrópoles, cidades inteiras contruídas sobre a água. Segundo o pesquisador holandês Pavel Kabat, casas ecológicas flutuantes, sustentadas por palafitas, e a construção de aeroportos sobre o mar são opções avaliadas seriamente pelo governo holandês. O projeto custa caro. Em uma primeira avaliação, seria necessário um investimento de 100 milhões de euros entre os anos 2004 e 2011. Após uma revisão, os valores saltaram para 250 milhões de euros a serem aplicados entre 2007 e 2013.
O modelo holandês de adaptação aos impactos ambientais, um projeto "à prova do aquecimento global", foi apresentado nesta quinta-feira no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em São José dos Campos, São Paulo, pelo pesquisador Pavel Kabat. Ele é diretor científico do Programa Holandês de Mudanças Climáticas e está no Brasil para uma série de apresentações, destinadas a pesquisadores e ao público em geral. O holandês é um dos que defendem a tese de que, mesmo reduzindo drasticamente as emissões de poluentes, não há como impedir a formação de um novo cenário mundial. "O que foi feito no ano de 2000 segue até 3000. A elevação da temperatura vai continuar, de 0,5ºC para 1,5ºC nesse período."
O pesquisador alerta para o perigo das mudanças graduais, quase imperceptíveis a curto prazo, que remetem ao exemplo do "sapo na panela". "Se colocamos um sapo em uma panela com água quente, ele irá pular, mas, se aquecemos a água aos poucos, o sapo não sentirá a diferença e morrerá." A mudança de parâmetros e um novo olhar sobre soluções para os novos problemas também compõem o discurso do pesquisador. "Construir barragens cada vez mais altas não é a solução, porque os riscos serão cada vez maiores. Serão necessários muitos bilhões em investimentos."
Um dos exemplos de mudança de paradigmas citados por Kabat refere-se aos rios que cortam o país. Segundo o pesquisador, em vez de erguer barreiras cada vez mais altas, o ideal é aumentar sua largura para criar áreas alagáveis ou, então, construir canais alternativos que possam absorver o volume excedente de água. "Também precisamos redesenhar os sistemas de produção agrícola existentes, com áreas multifuncionais para plantio e diversão, por exemplo." Cálculos apresentados pelo pesquisador mostram a necessidade de promover a produção agrícola em conjunto com a manutenção de áreas conservadas.
Segundo Kabat, ações de conservação da natureza garantem a retirada de 8 toneladas de CO2 (principal gás causador do efeito estufa) por hectare por ano. A atividade de agricultura em conjunto com áreas conservadas representa o aumento de 4 toneladas de CO2 por hectare anual. Se as atividades agrícolas não forem acompanhadas por medidas de preservação, o impacto ambiental pode chegar a 10 toneladas anuais por hectare.
"As mudanças climáticas não são um problema esperando uma solução. Uma estratégia efetiva requer mais do que boa ciência e boa comunicação", disse Kabat. Com 75% de seu território localizado em baixas elevações e sujeito a efeitos imediatos da elevação do nível do mar, a Holanda mantém um dos estudos mais atualizados sobre vulnerabilidade ambiental no mundo. Dados fornecidos pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) indica que houve um aumento de 10 cm a 20 cm no nível médio global dos oceanos no século XX.
(Por Marcelo Pedroso,
Terra, 19/06/2007)