A cidade de Bom Jesus da Lapa (BA) é conhecida como um centro de peregrinação religiosa. Localizada a 777 quilômetros de Salvador, abriga o santuário de mesmo nome, que fica dentro de uma gruta. Durante todo o dia, romeiros saem do centro da cidade quase que de hora em hora, com destino à diocese. São muitas as procissões, que entram pela noite e amanhecem junto com a cidade.
Lindinalva Ferreira é moradora do assentamento Batalha, localizado a 50 quilômetros de Bom Jesus da Lapa. Na semana passada, acompanhada do marido e de outros moradores da mesma comunidade, onde vivem cerca de 160 pessoas, foi à cidade receber a visita do ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima. Contou que em vez do terço, como de costume, levava uma carta com um pedido apenas: água. E explicou: “A gente sofre muito por causa de água. Às vezes ficamos até 15 dias sem água para beber”.
Segundo a agricultora, neste ano a situação se agravou com a falta de chuva, o que comprometeu toda a produção de milho e feijão: “Tudo o que plantamos se perdeu”. Agora, acrescentou, a comunidade do assentamento vive de benefícios do governo, como o Bolsa Família, ou de trabalhos temporários: “Só que é bastante difícil arrumar alguma coisa”.
Com seis filhos para criar, sendo cinco menores de 15 anos, a expectativa de Lindinalva Ferreira é de que o ministro “ponha logo para funcionar” o programa Água para Todos, que prevê a construção de cisternas rurais e outros mecanismos de abastecimento para a população que vive na calha do São Francisco. Até 2010, o programa deverá investir cerca de R$ 307 milhões em 102 municípios.
Além da revitalização do Rio São Francisco, parte do Projeto de Integração do rio às bacias do Nordeste Setentrional, o Água para Todos foi um dos temas abordados na visita do ministro a Bom Jesus da Lapa. “Nós vamos correr todos os 2,8 mil quilômetros do São Francisco aduzindo água para 1,8 mil comunidades da calha”, garantiu, acrescentando que essa é a solução para a população que vive a até 10 quilômetros de distância do rio.
O marido de Lindinalva Ferreira, José da Silva Andrade, no entanto, disse temer que o projeto não se efetive. Para ele, a população ouve falar muito mais do Projeto de Integração do que de outras iniciativas para levar água a quem mora nas margens do São Francisco. “Não somos contra o projeto de transposição, mas queremos que antes sejam atendidas as necessidade dos ribeirinhos. De que adianta transferir o rio para outros estados, enquanto quem mora na margem sofre por falta de água?”, questionou.
Segundo Andrade, a construção de adutoras para bombear água do São Francisco aos assentamentos rurais ajudaria a resolver o problema. Um sistema semelhante já foi usado na comunidade, mas “vive mais quebrado do que funcionando”, contou. No período da seca, acrescentou, o problema da falta de água no assentamento Batalha se agrava e recursos federais como os do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) chegam atrasados aos moradores: “Ficamos sem condição de produzir na terra. Não tem como cercar o lote, comprar animais como gado, o que dá sustentabilidade dentro do assentamento”.
O prefeito de Bom Jesus da Lapa, Roberto Maia, admitiu que dos cerca de 70 mil habitantes da cidade, 10 mil estão sem acesso à água, “apesar de o município ser cortado em toda a sua extensão pelo Rio São Francisco”. A maioria dos habitantes sem água reside em assentamentos da reforma agrária ou é população remanescente de quilombos. No mês de abril, movimentos sociais ocuparam o prédio da Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco e Paranaíba (Codevasf), ligada ao Ministério da Integração Nacional e responsável pelas obras na localidade. Os manifestantes reivindicavam diálogo com o governo em torno das obras de Integração do São Francisco às Bacias do Nordeste Setentrional.
(Por Isabela Vieira, Enviada especial/Agência Brasil, 19/06/2007)