SÃO PAULO – Nesta semana (12), a Organização Mundial do Comércio (OMC) permitiu que o Brasil mantivesse a proibição de importar pneus reformados da União Européia ao acatar as argumentações brasileiras de que esses produtos representam risco à saúde pública e ambiental do país. A conclusão da OMC é resultado da avaliação de um painel deste órgão depois que o Brasil negou o pedido de importação dos pneus reformados europeus.
A decisão, no entanto, só poderá ser adotada pelo país se a importação de pneus usados também for proibida. A diferença entre esses dois tipos de pneus é que o usado permite ser reformado mais uma vez. Já o reformado não pode mais ser reaproveitado como pneu, o que o torna um resíduo sólido após o uso. A OMC considera que a distinção entre os dois produtos caracteriza uma discriminação comercial, que contraria as regras do órgão.
Se nenhuma das partes apresentar recurso, a proibição será adotada pelo Órgão de Solução de Controvérsias da OMC num período entre 20 e 60 dias a partir da publicação do relatório. O governo brasileiro já sinalizou que não vai recorrer da decisão por considerar o resultado favorável aos seus interesses.
Desde 2000, a importação de pneus usados é proibida no país por uma portaria da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), vinculada ao então Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio. No entanto, o Brasil importa pneus usados por meio da autorização de liminares concedidas pela Justiça brasileira. A situação beneficia as indústrias reformadoras de pneus usados, as quais consideram a decisão da OMC uma derrota comercial.
De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, as liminares permitiram a entrada de cerca de 7,6 milhões de pneus em 2005. Com a decisão da OMC, o Supremo Tribunal Federal (STF) deverá votar sobre o que fazer com essas liminares.
A discussão está no STF desde setembro do ano passado. Na época, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva entrou com uma Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF n.º 101), questionando a permissão judicial. O documento está em análise sob a relatoria da ministra do STF Carmen Lúcia.
O secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente João Paulo Capobianco acredita que o impasse será resolvido com o julgamento da ADFP. “Nossa expectativa é que uma solução judicial possa superar essa questão de forma definitiva e impeça que brechas sejam utilizadas para criar um problema ambiental”, afirma.
Apesar da decisão contrária aos pneus europeus, a OMC não proibiu o Brasil de receber os pneus reformados do Uruguai. Desde 2002, após a decisão do Tribunal Arbitral do Mercosul a favor de uma ação uruguaia, o Brasil foi obrigado a aceitar a importação dos reformados. Nesse caso, o Uruguai pode servir de caminho para que a União Européia envie seu produto ao Brasil, o que comprometeria as metas da OMC.
Saúde e meio ambienteA OMC acatou as argumentações brasileiras de que o acúmulo de resíduos de pneus é um risco e representa danos ao meio ambiente e à saúde pública. Nesse sentido, o país pretende barrar o aumento de resíduos de pneus.
Em seu relatório, a OMC concluiu “que o Brasil demonstrou que resíduos de pneus proporcionam campo fértil para a proliferação de mosquitos e, conseqüentemente, contribuem para a transmissão de dengue, febre amarela e malária”. Diante disso, o órgão observa que a importação dos pneus representa riscos à saúde e à vida humana e também acatou a argumentação brasileira que diz respeito ao risco de incêndios e problemas de saúde relacionados.
De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, “a fumaça, as cinzas e o óleo pirolítico gerados com a queima de resíduos de pneus (de fácil combustão) também representam riscos para o homem e o meio ambiente. Como o tempo de degradação do pneu é indeterminado, ele é considerado não biodegradável. Em sua composição, há metais pesados altamente tóxicos e substâncias cancerígenas, como chumbo, cromo, cádmio e arsênio”.
A OMC entende que os pneus reformados não são exatamente os responsáveis por gerar os riscos à saúde de seres vivos. No entanto, os “pneus reformados tornam-se resíduos mais rapidamente do que novos e, dessa forma, aumentam o número de carcaças”, descreve o relatório. A OMC afirma que os pneus reformados têm vida útil menor do que os novos, logo, a restrição comercial serviria para reduzir a quantidade de carcaças no Brasil.
HistóricoA “guerra dos pneus” começou em novembro de 2003, quando o Bureau Internacional das Associações de Vendedores e Recapeadores de Pneumáticos protestou contra as restrições brasileiras sobre a importação dos pneus. Na época, os reformadores europeus alegavam que a postura comercial do Brasil causava prejuízo comercial.
Entre janeiro e março de 2004, o caso foi analisado pela União Européia e o governo brasileiro apresentou justificativas baseadas na proteção da saúde pública e do meio ambiente. A UE considerou, então, que o Brasil contrariava regras da OMC e pediu que o país voltasse atrás na sua decisão. Diante da negativa brasileira, a EU solicitou a abertura do painel a OMC.
(Por Natália Suzuki*,
Agência Carta Maior, 14/06/2007)
*Com informações do Ministério do Meio Ambiente