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zoneamento silvicultura silvicultura
2007-06-14
A demora no licenciamento dos plantios de árvores exóticas foi o estopim de mais uma crise política no Governo do Estado. O risco de entrar para a história como a governadora que deixou escapar polpudos investimentos de fábricas de celulose fez com que Yeda Crusius demitisse uma amiga do cargo de secretária do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul. Enquanto isso, o inovador Zoneamento Ambiental da Silvicultura segue engavetado, e as mudinhas de eucalipto clonado avançam campo afora. Tudo em nome do progresso.

Mal iniciara o mês de maio. Madeira! Não deu outra. Cai a secretária de Meio Ambiente do Rio Grande do Sul. Oficialmente, a bióloga e pesquisadora Vera Callegaro pediu demissão do cargo no dia 4 de maio para realizar uma cirurgia dez dias depois, no Hospital Moinhos de Vento, cujo motivo não foi divulgado. Após se recuperar da intervenção cirúrgica, a amiga e correligionária da governadora Yeda Crusius voltará ao seu órgão de origem, a Fundação Zoobotânica. Na secretaria, seu ex-gabinete foi ocupado dia 18 de maio.

Fontes ligadas à área ambiental consultadas pelo jornal Extra Classe acreditam que Vera Callegaro perdeu o cargo porque não conseguiu cumprir uma das principais tarefas atribuídas a ela – agilizar os licenciamentos ambientais, principalmente das lavouras de eucaliptos que avançam pela Metade Sul para atender a demanda das futuras fábricas de celulose da Votorantin, Stora Enso e Aracruz. Apesar de sua reconhecida competência técnica, teria faltado jogo de cintura para descascar o abacaxi. Ou seria eucalipto?

Pelo mesmo motivo, buscaram no órgão responsável pelos licenciamentos o advogado e dirigente tucano Irineu Ernani Schneider, que nem teve tempo de esquentar a espinhosa cadeira de diretor-presidente da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam). O principal motivo da crise é o Zoneamento Ambiental da Silvicultura, instrumento de gestão inédito no Brasil que estabelece os lugares adequados para os plantios de árvores exóticas, no caso, eucalipto, acácia e pínus, além do percentual que cada área pode suportar.

A primeira versão do trabalho, elaborado com apoio financeiro da Associação Gaúcha de Empresas Florestais (Ageflor), foi apresentada no apagar das luzes do governo Germano Rigotto, dia 20 de dezembro. Representantes e apoiadores das fábricas de celulose não gostaram dos limites de plantio estabelecidos para cada projeto de silvicultura, que varia de 20 a 50%, dependendo da fragilidade ecológica e do tamanho da área. Quanto maior a propriedade, menor o percentual autorizado para cultivar árvores exóticas.

O Ministério Público havia acordado com o Governo do Estado que até 31 de dezembro deveria estar concluído e aprovado o Zoneamento Ambiental da Silvicultura para licenciar os projetos de produtores rurais, que recebem financiamento do BNDES com juros camaradas, e das próprias fábricas de celulose. Só que para entrar em vigor, o trabalho deveria ser antes analisado em audiências públicas, que só irão acontecer ao longo de junho, e aprovado pelo Conselho Estadual de Meio Ambiente.

Esse agora é o desafio da nova presidente da Fepam, a mestre em Administração Pública Ana Maria Pellini, funcionária pública que há três anos trabalhava na diretoria-geral da secretaria de Segurança Pública, e do Procurador de Justiça da área criminal Carlos Otaviano Brenner de Moraes, que também já trabalhou na Secretaria de Segurança, em 2003, foi Corregedor Geral do MP em 1997 e 1998 e, mais recentemente, presidiu a Associação do Ministério Público no biênio 2005-2006.

Quando Brenner de Moraes apareceu como favorito para ocupar o cargo de secretário do Meio Ambiente no lugar de Vera Callegaro, analistas políticos especularam na imprensa que sua nomeação seria uma tentativa do Governo do Estado de cooptar o Ministério Público, instituição que, historicamente, tem sido um cão de guarda feroz na defesa das questões ecológicas. A Procuradoria-Geral de Justiça reagiu com nota afirmando que os promotores e procuradores vão manter a mesma independência funcional.

Se a cooptação do MP foi realmente o intento da governadora, o tiro poderá sair pela culatra. Pelo menos é o que pensam ativistas ecológicos consultados pelo jornal Extra Classe. Existe uma divisão política dentro do Ministério Público que ficou bem caracterizada na eleição da associação da categoria em 2005, vencida pelo novo dirigente da Sema. Segundo esta interpretação, Brenner de Moraes em um cargo público cheio de conflitos poderia deixar o outro grupo ainda mais vigilante.

"Os papéis são diferentes"
A especulação de que a governadora teria colocado José Otaviano Brenner de Moraes na Secretaria do Meio Ambiente para paparicar o Ministério Público incomodou o atual titular da Sema. “Fiquei surpreso com esta interpretação de que minha nomeação seria um agrado para neutralizar o MP. Aceitei o convite por idealismo. Quero aproveitar esta oportunidade para contribuir como cidadão e homem público em uma área de elevada importância”, disse o novo secretário em entrevista ao jornal Extra Classe.

Como conciliar a independência, principal atributo do Ministério Público, com os compromissos políticos de um governo? “Os papéis são diferentes. Um promotor não é vinculado a um programa de governo. Mas quando participa de um governo, tem de incorporar em suas ações o seu programa, cumprindo a legislação. A minha liberdade é a liberdade do programa de governo, que prevê a melhoria na qualidade dos serviços, com maior eficiência na área ambiental”, responde Brenner de Moraes.

Aumentar a eficiência otimizando os recursos existentes é a prioridade número um anunciada pelo novo secretário de Meio Ambiente. O trabalho dele será enorme. Atualmente existem cerca de 7 mil licenças a serem analisadas, um quadro funcional minguado e carência de equipamentos. A segunda meta é modernizar a estrutura administrativa para evitar sobreposição entre os departamentos da própria secretaria. “Há retrabalho. Precisamos ter uma janela única, e não vários interlocutores dentro da Sema”, explica Brenner de Moraes.

Infra-estrutura e pessoal são sua terceira prioridade. “Temos de recuperar os quadros perdidos através de concurso público”, defende. Antes de assumir o cargo, Brenner de Moraes já teria conversado sobre esses gargalos com a governadora. Segundo ele, a Sema tem, incluindo todos departamentos e órgãos vinculados, cerca de 500 profissionais. A falta de pessoal é mais grave, na avaliação do novo secretário, na Fepam, que tem apenas 240 servidores, e no Departamento de Recursos Hídricos, com apenas 4.

Já falta água
Sobre o licenciamento das lavouras de árvore, o novo secretário afirma que a Sema tem o compromisso de assegurar a preservação. E, segundo ele, a maneira mais eficaz é com regras claras, objetivas, duradouras e que gerem segurança a todos interesses envolvidos. “O Zoneamento Ambiental da Silvicultura é um instrumento que serve para estabelecer limites. Ele é importantíssimo na política ambiental, mas a versão preliminar ainda tem de ser aprimorada”, afirma Brenner de Moraes.

Enquanto o Zoneamento Ambiental da Silvicultura não vinga, o Rio Grande do Sul segue com um instrumento de gestão inovador mofando nas gavetas governamentais, com licenças de plantio sendo liberadas em profusão a partir de critérios mais brandos, para alegria das indústrias. E o pior é que a próxima novela já está escrita: o avanço da cana-de-açúcar e a febre do biodiesel. Antes, no entanto, teremos uma minissérie. Até o final de junho, o Ministério da Agricultura divulga o novo Zoneamento Agropecuário limitando o plantio da soja em 68 municípios gaúchos localizados nas fronteiras sul e oeste. O motivo? Problemas climáticos. Se já falta água para a soja, como ficarão estas áreas repletas de eucaliptos?

Procuradoria da República atenta
O licenciamento das lavouras de árvores vem sendo acompanhado com atenção pelo Ministério Público Federal. Há inquéritos civis públicos abertos em Porto Alegre, Pelotas, Rio Grande, Santa Maria e Uruguaiana. O Procurador da República Rodrigo Valdez informa que a Câmara de Coordenação e Revisão do MP Federal em Brasília, especializada na área ambiental, já foi consultada e deve manifestar-se sobre o tema, com orientações técnicas sobre os possíveis impactos ambientais da atividade.

Além dos danos ecológicos, os procuradores que acompanham a polêmica no Rio Grande do Sul têm ainda dúvidas sobre se o licenciamento deve ser feito pelo Governo do Estado ou se necessitaria também da avaliação do Ibama. Outra preocupação é a compra de terras que vem ocorrendo em áreas de fronteira através de empresas-laranja da multinacional Stora Enso. Sobre o Zoneamento Ambiental da Silvicultura, o Procurador da República Rodrigo Valdez avalia que o “estudo foi muito bem-feito”.

(Por Roberto Villar Belmonte, jornal Extra Classe / EcoAgência, 13/6/2007)

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