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2007-06-12

Subodh Patra, um aldeão do delta pantanoso dos Sunderbans, uma área banhada pelo oceano Índico e compartilhada por Índia e Bangladesh, perdeu sua colheita de meio hectare pela invasão da água do mar. Agora, Patra e sua família não se atrevem a dormir de noite por medo de que até sua humilde casa seja inundada. “Em um dia de maio, pela manhã, o mar inundou tudo, rompeu os diques e alagou nossos campos com água salgada, destruindo toda nossa colheita”, disse Gopal, de 23 anos, filho de Patra. “Passamos as noites em vigília por medo de que a água também leve nossa casa”, acrescentou.

 

Os Sunderbans se estendem através do sul de Bangladesh e do vizinho Estado indiano de Bengala Ocidental, no amplo delta formado pela confluência dos rios Ganges, Brahmaputra e Menga, que desembocam na baía de Bengala. É uma área pantanosa de 26 mil quilômetros quadrados, onde centenas de pequenas ilhas estão interligadas por canais de água. A mudança climática não ameaça apenas aldeões como os Patra. Os Sunderbans são a maior reserva de tigres de Bengala, uma espécie cuja população diminui de maneira alarmante, e também berço do mais vasto reservatório de mangues, não menos ameaçados do que os “grandes gatos”. Animais, árvores e seres humanos enfrentam o mesmo desafio.

 

“Agora que perdemos nossa colheita, não sabemos o que fazer”, lamenta Gopal. Seu pai mantém a família praticando medicina homeopática e cuidando de frangos na aldeia de Poilagheri em Moushuni, uma das ilhas mais ameaçadas dos Sunderbans. Patra olha desolado o terreno agora cheio de mosquitos e serpentes venenosas. “Nossa ilha é famosa pela produção de pimentões picantes de alta qualidade, além de outros vegetais. Mas perdemos tudo por culpa do mar. Também teremos de sobreviver um ano sem pescado, porque os tanques de água doce estão cheios de sal”, afirmou.

 

Termos como aquecimento global ou mudança climática eram totalmente desconhecidos para a família Patra até que a invasão da água marinha os obrigou a somarem-se a milhares de potenciais refugiados ambientais do Sunderban. A área abriga a maior reserva mundial de tigres e mangues e foi declarada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) como Patrimônio da Humanidade. Agora, enfrenta a ameaça da mudança climática. Um estudo da ONU estima que um aumento de 45 centímetros no nível do mar destruirá 75% das florestas em uma área de 10 mil quilômetros quadrados em Bengala Ocidental, no leste da Índia, e Bangladesh.

 

“Já há cerca de sete mil refugiados ambientais nos Sunderbans e o número só aumenta enquanto o mar devora mais e mais ilhas por causa do aquecimento global”, explica o professor Pranabes Sanyal, da Escola de Estudos Oceanográficos da Universidade Jadavpur. A Escola fez um estudo de 10 anos da baía de Bengala e seus arredores e concluiu que o nível do mar cresce 3,14 milímetros por ano na área, enquanto a média para o resto do mundo é de 2,2 milímetros. Isto é uma ameaça para as áreas costeiras da Índia e de Bangladesh.

 

“Em lugares como a zona oriental da ilha Sagar, o nível do mar está crescendo mais devido ao afundamento do terreno. Essa elevação próxima do habitat do tigre em Pakhiralay está, em média, em cinco milímetros por ano, enquanto em Khulna, Bangladesh, chega a 10 milímetros”, disse Sanyal, membro da Autoridade Nacional para a Administração das Zonas Costeiras. Os mangues da região são uma espécie de amortecedor contra os ciclones tropicais e também atuam como um filtro para as águas doces do estuário. Além disso, servem como abrigo para muitas espécies de peixes e invertebrados.

 

A redução do número de mangues tornará a Índia e Bangladesh mais vulneráveis diante de distúrbios climáticos na baía de Bengala, incluindo os tsunamis. O último informe do Grupo Intergovernamental sobre Mudança Climática, apresentado no mês passado em Bangcoc, alerta para a magnitude do problema. “Uma destruição maior dos mangues os Sunderbans limitará seu papel-chave como proteção natural contra os ciclones tropicais. Aproximadamente 10% dos ciclones tropicais do mundo se produzem nessa região e 17% deles varrem as terras de Bangladesh”, diz o estudo.

 

Segundo Sanyal, pelo aumento do nível domar, as ilhas do sul dos Sunderbans estão afundando e três, que já foram densamente povoadas, já foram engolidas pelo oceano. “Na ilha Sagar estamos perdendo 44 hectares de terra por ano. Inclusive o templo de Kapil Muni, a principal atração para os peregrinos hindus que participam anualmente à feira de Gangasagar, teve de ser mudado de lugar por três vezes devido ao avanço do mar”, acrescentou.

 

Os frondosos mangues dos Sunderbans estão desaparecndo. Em duas ilhas (Bhangaduani, também chamada Kendo, e Dalhousie) de 15% a 30% das árvores se perderam nos últimos 37 anos, afirmam os especialistas. As que sobrevivem, expostas à água salgada, perderam suas características cores vermelho e verde. “O que causa alarme é que estas duas ilhas são um habitat excelente para os famosos tigres de Bengala. A redução de seu território acrescenta um novo desafio à já ameaçada população desses grandes gatos da Índia”, disse Sanyal.

 

No ano passado, houve alarme por causa dos tigres, quando a informação do censo de 2004 feito pelo Instituto Estatístico da Índia, estimou sua população m apenas 75 animais, muito abaixo da cifra oficial de 249. Os especialistas estimam que há um século existiam 40 mil tigres. A caça ilegal e a destruição do habitat reduziram seu número para cerca de 3.700 há muitos anos. O censo de 2004 ressalta a velocidade do processo de extinção destes animais que tanto cativaram os colonizadores britânicos.

 

Em um período aproximado de um século, seis espécies animais se extinguiram na região: o muntíaco da Índia, uma subespécie da família dos veados; o rinoceronte de java (não é visto desde 1935); o rinoceronte de chifre vermelho (visto pela última vez em 1900); o búfalo, o cervo dos pântanos e o gavial, espécie de crocodilo. Os esforços conservacionistas são inadequados. “Decidimos aumentar a altura dos diques de barro incrementar a cobertura que proporcionam os mangues”, disse Kanti Ganguly, ministro de Bengala Ocidental para os Sunderbans.

 

Mas, pessoas como Patra afirma que recebem muito pouca ajuda das autoridades locais. Ayesha, ex-morador da ilha Moushuni, d quem o mar arrebatou pouco mais de 1,2 hectare de terra cultivada, diz, chorando: “Não sabemos nada sobre um reassentamento. Ninguém vem nos ver. Ninguém se importa se continuamos vivos ou morremos”.

(Por Sujoy Dhar,  IPS, 11/06/2007)

 


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