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aterros sanitários
2007-06-08
A comida que sobrou no prato. O sapato que gastou. A pá do ventilador quebrado. O jornal de ontem. Nas montanhas de resíduos que se acumulam no lixão da Caturrita, é possível encontrar de tudo. Ou melhor, quase tudo. Uma coisa os centenas de catadores que tiram de lá o sustento nunca vão achar: a solução para o depósito que, teoricamente, não poderia receber sequer mais uma sacolinha de lixo.

Um dos maiores problemas ambientais da cidade se transformou em uma disputa judicial que parece não ter fim. Desde 2005, um processo movido pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), pedindo a interdição do aterro, espera por um desfecho. Vistorias, laudos e apenas um consenso: o aterro está esgotado.

Mesmo sem o licenciamento ambiental, o depósito de lixo não está irregular, garante o diretor da secretaria de Proteção Ambiental, Luis Claudio da Silva. Tudo porque a prefeitura parece dispor de um argumento incontestável perante a Justiça: onde colocar as mais de cem toneladas de lixo produzidas todos os dias? Diante da falta de opções, por enquanto, o jeito é continuar abarrotando o lixão.

- Desde setembro, o município espera por uma audiência para mostrar ao juiz um laudo da UFSM, mostrando que a situação da vistoria da Fepam (de 2005) não é mais a mesma - explica a assessora especial da Procuradoria Geral do Município Cristiane Bortoluzzi Corino, sobre as diferenças entre os laudos apresentados da prefeitura e da Fepam e uma vistoria feita pela universidade.

Há cerca de duas semanas, a Fepam fez uma nova vistoria. No resultado, poucas novidades em relação a tudo o que já havia sido declarado. O chorume (líquido tóxico que resulta da decomposição do lixo), a falta de um sistema apropriado para a liberação dos gases e o esgotamento do terreno continuam sendo problemas.

Outro nó difícil de desatar é a licitação que vai determinar qual a empresa que ficará responsável pela coleta, pelo transporte e pela destinação do lixo. O contrato com a PRT, que atualmente faz o serviço, venceu em 15 de março. O novo edital - que contrataria uma empresa por um ano, prorrogável por mais cinco - acabou suspenso por um recurso de uma das empresas participantes.

A Ecomais perdeu, mas tem até hoje para contestar a decisão. A prefeitura espera terminar o prazo para começar a pensar em nova licitação. Nesse meio tempo, a PRT segue com o serviço.

Presença dos catadores dificulta cobertura
Enquanto a pilha de papéis circula no Fórum, os montes de lixo são o reflexo de um problema social talvez até mais grave do que a questão ambiental. Os barracos mostram que o lixão é casa para alguns. Naquela comunidade, a chegada dos caminhões é motivo de festa. Falar em interdição preocupa.

- Se interditar aqui, nós temos duas opções: passar fome ou roubar no Centro - avalia Jorge Luiz, 38 anos, pai de cinco filhos e que há 20 anos vive no "garimpo".

Jorge estava entre as famílias que, em 2005, deixaram o pouco que tinham para se instalar no horto. Seduzidos pela idéia de uma usina de reciclagem, terra para plantar e cestas básicas, acabaram decepcionados meses depois, quando o projeto fracassou. Hoje, a cobertura do lixo, que deveria ser feita assim que o material chega, é adiada, para que os catadores retirem do lixo os "tesouros" que garantem sua sobrevivência.

5 anos de problemas
2002
Setembro
Prefeitura renova termo de compromisso estabelecido em 1995 em que o município teria de cumprir 14 itens que vão desde o tratamento de chorume até o plantio de árvores nativas. A mais importante era apresentar locais para um novo aterro
Outubro
PRT vence licitação para continuar fazendo a coleta e se compromete a fazer uma usina para separar materiais recicláveis, a instalar um sistema de drenagem e impermeabilizar o depósito com argila. A previsão era diminuir a quantidade de lixo

2005
Fevereiro
Prefeitura planeja, como solução provisória, impermeabilizar um terreno perto do lixão e cobrir o lixo com argila até construir um aterro. Idéia é plantar grama no atual lixão. O secretário de Proteção Ambiental, Heitor Peretti, estima vida útil para o lixão de dois anos. O engenheiro da Fepam José Antônio Mallmann afirma que a área estava esgotada e que a poluição do Arroio Ferreira, por conta do chorume, preocupa
Abril
Fepam entra com uma ação judicial contra a prefeitura pedindo a interdição imediata do lixão e que os catadores sejam retirados do local
Maio
Dia 12 - Justiça aceita pedido da prefeitura de construir duas células (depósitos provisórios), que dependiam de liberação da Fepam. As células deveriam ser construídas em dois meses, com vida útil de até 18 meses - prazo que a prefeitura tinha para construir o aterro definitivo
Dia 16 - Cerca de 180 famílias de catadores são expulsas do lixão ou proibidas de entrar no local pela Brigada Militar. Prefeitura monta um esquema de fornecimento de cestas básicas por 90 dias e colocação dos filhos de catadores na escola. Passam-se 11 dias, e 80 catadores voltam ao lixão, mesmo com a proibição da Justiça
Dia 31 - Prefeitura e projeto Esperança/Cooesperança formam a Associação Vida Nova, no horto municipal para dar atividades de geração de renda aos catadores. Só 35 pessoas se associam ao projeto

2006
Março
Prefeitura encerra as atividades no horto, e os catadores voltam ao lixão
Novembro
Vence o prazo para a construção do novo aterro

2007
Maio
Fepam faz nova vistoria, constatando que nada mudou. A prefeitura informou que mandou um fiscal até lá, que não teria apontado nenhuma irregularidade. A única anormalidade seria uma área maior do que o normal descoberta, o que poderia ter ocorrido por conta da chuva
Junho
Todo o lixo da cidade continua sendo depositado na Caturrita. Cerca de 200 famílias de catadores tiram o sustento de lá. O processo continua aberto, e a última decisão é de 10 de janeiro, quando a Fepam recebeu 10 dias para se manifestar diante de um laudo da prefeitura que contestava a última vistoria da fundação. A prefeitura espera uma audiência com a Fepam para confrontar os laudos com outro feito pela UFSM

Coleta seletiva até demais
Os benefícios de um sistema de coleta seletiva de lixo para a natureza são indiscutíveis. Mas, além de contribuir para um meio-ambiente mais saudável, separar o lixo representa geração de empregos e criação de uma consciência ecológica entre os moradores da cidade que faz a coleta de forma separada.

Em Santa Maria, mesmo tendo no lixão um de seus maiores problemas, a coleta seletiva praticamente não existe. O sistema já começou a ser adotado algumas vezes na cidade, mas nunca funcionou plenamente por conta do reduzido número de ruas percorridas pelo único caminhão da PRT que faz o serviço. Aliada a isso, está a falta de campanhas de conscientização da população e de estrutura dos próprios catadores para recolher um grande volume de lixo.

Hoje, quem quer participar precisa de uma boa dose de paciência. O primeiro passo é entrar em contato com a Secretaria de Proteção Ambiental. Se a casa estiver na rota do caminhão da PRT, basta que o lixo seja separado em papel, plástico, chapas de Raio X, vidro e metais e entregue nos horários estipulados.

Se a casa não estiver na rota, cabe ao cidadão entrar em contato com alguma cooperativa e verificar se alguma delas pode fazer a coleta do lixo. Horários e local de entrega devem ser combinados com os próprios catadores.
(Diário de Santa Maria, 08/06/2007)

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