SÃO PAULO - Desde 2005, a empresa de mineração Alcoa tem trabalhado para implantar a infra-estrutura necessária para a exploração de bauxita no município de Juruti, no Pará, com início das atividades previsto para 2008. Contudo, ao longo desses dois últimos anos, a mineradora tem entrado em conflito com as comunidades rurais locais, que a acusam de ser responsável por danos socioambientais e não propor ações para mitigação desses efeitos.
Na última segunda-feira (04/06), líderes comunitários e representantes dos Ministérios Públicos Estadual (MPE) e Federal (MPF) no Pará e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) se reuniram com a Secretaria Executiva de Transporte e Meio Ambiente (Sectam) do estado, responsável pelo licenciamento ambiental de grandes obras no Pará, para avaliar as denuncias de contaminação de nascentes e lagos que abastecem a população de Juruti, e de devastação da área. Ainda em maio, os Ministérios Públicos Estadual e Federal solicitaram à Sectam a suspensão das licenças ambientais concedidas à empresa e a conseqüente paralisação de suas atividades (leia Alcoa é acusada de contaminar rios e afetar população do PA).
Esta semana, a Sectam garantiu às lideranças de Juruti que novas licenças ambientais apenas serão concedidas à Alcoa se os procedimentos da empresa estiverem em conformidade com a lei e não for constatada nenhuma violação. Segundo o órgão, até então não há provas suficientes para suspender as atividades da empresa, mas não serão concedidas novas licenças enquanto não forem apuradas as denúncias. "No máximo em 10 dias nossos técnicos estarão no local, avaliando as denúncias. Este trabalho vai orientar o Estado na decisão que poderá resultar ou não no cancelamento da licença ambiental", disse Valmir Ortega, secretário de Estado de Meio Ambiente.
Por meio de sua assessoria de imprensa, o órgão ambiental admite que a mineradora vem desrespeitando as condicionantes para mineração e reitera que as novas licenças só serão emitidas depois que a Alcoa cuidar dos passivos que causou.
Tiniti Matsumoto Jr, gerente geral de desenvolvimento da Alcoa Mina de Juruti, afirma que a atenção que a Sectam está dando ao caso é o procedimento normal de fiscalização. Segundo ele, a empresa se adiantará em cuidar das providências necessárias para que receba a renovação da concessão em agosto deste ano. Desde 2005, a licença de instalação é renovada anualmente.
O gerente da Alcoa nega que haja motivos para a suspensão das atividades. Questionado se ele discorda da avaliação da Sectam que a Alcoa causou passivos socioambientais, afirmou que "Não tenho como discordar de algo que desconhecemos. Eu não sei quais são esses passivos", diz. Segundo ele, o volume de investimentos da ordem de R$1,7 bilhão é muito grande para arriscar a perda da licença por deixar de seguir os procedimentos necessários.
Giane Figueiredo, procuradora da Justiça, afirma que o Ministério Público Estadual pretende intermediar as negociações e colaborar com os estudos da Sectam. O MP propôs à Secretaria um roteiro para a fiscalização.
Novas reclamaçõesUm novo impasse surgiu nesta última reunião com a informação de que parte da área que a mineradora pretende explorar estaria dentro dos limites do território do Projeto de Assentamento Agro-Extrativista Juruti Velho. A área de exploração mineral estaria sobreposta ao assentamento do Incra, segundo técnicos do órgão.
De acordo com o gerente da Alcoa, o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) concedeu o direito à pesquisa e à lavra para a mineradora em agosto de 2005, sendo que o Incra só teria destinado as terras para o seu projeto em novembro deste mesmo ano. Matsumoto argumenta que o Incra deveria ter consultado o DNPM antes de tomar as terras para o projeto. Segundo ele, "esse é um mal-entendido que tem que ser resolvido entre o DNPM e o Incra".
Contudo, o chefe da procuradoria do Incra de Santarém, Dilton Tapajós, afirma que a portaria para criação de assentamento nas terras saiu, de fato, em novembro de 2005, mas a posse da área é da União desde os anos 1980, e a presença de comunidades caracteriza a ocupação tradicional. "Temos registros de que as comunidades de Juruti Velho estão lá desde 1809. O Incra arrecadou como públicas as terras dessa região em 1981,mas nunca houve pressa para fazer o assentamento porque não havia conflito na região. A chegada da empresa mudou esse quadro e a expulsão das populações tradicionais é iminente", afirma Tapajós. "Não existe possibilidade de expulsão eminente ou desaparecimento de comunidades", contraria Matsumoto.
"Nas audiências públicas anteriores, a Alcoa nunca chamou o Incra para discutir essa questão. A Alcoa sabia que essas áreas eram da União". Para o coordenador do Incra, a atividade mineradora tem que recuar caso se comprove que a área do assentamento será impactada. Segundo a avaliação de uma equipe do Incra, cerca de 46% das terras do projeto será comprometida com a extração da bauxita. "É inviável haver a mineração e os assentamentos ao mesmo tempo", avalia.
Para Tapajós, essa situação confusa decorre da deficiência do estudo e do relatório de impacto ambiental (EIA-RIMA) feito pela Alcoa que desconsiderou o impacto sobre essas comunidades e a área do assentamento. Esse foi um dos motivos que levou os Ministérios Públicos Estadual e Municipal a entrar com o pedido de cancelamento das licenças da mineradora em maio.
"Hoje não há especificações sobre qual a área geográfica a ser impactada e o quanto a vida das comunidades vai ser afetada. A Alcoa não sabe precisar esses pontos", diz. Segundo o funcionário do Incra, a discussão deveria ter sido feita na época em que o EIA-Rima foi feito. Matsumoto, ao contrário, diz que o estudo contempla essas comunidades.
A maior preocupação é com a comunidade Pau D'arco, que fica a menos de dois quilômetros do platô de onde será extraída a bauxita. Teme-se que a área desapareça na medida em que a empresa tiver que subtrair os recursos florestais para abrir a mina.
Líderes comunitários afirmaram que se nada for feito, eles pretendem ocupar retomar a área. "O direito de lavra, concedido pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), não anula o direito da propriedade. O Instituto de Terras do Pará (Iterpa) e o Incra estão trabalhando em parceria para resolver o problema. Mas está claro, para o Estado, que as reivindicações da comunidade são legítimas", disse Valmir Ortega, na reunião.
(Por Natalia Suzuki, com informações da Agência Pará /
Agência Carta Maior, 06/06/2007)