A pesquisadora Carolina Doria, da Universidade Federal de Rondônia, no mercado de peixes Cai N'Água. Organizações ambientalistas temem que as usinas projetadas para o Rio Madeira ameacem os peixes
A situação dos peixes foi uma das principais preocupações ao longo da análise dos possíveis impactos ambientais das usinas hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, projetadas para o Rio Madeira. Algumas espécies ficarão mais abundantes do que hoje, e outras, menos, avalia a pesquisadora Carolina Doria, participante do diagnóstico ambiental que forneceu subsídios para o estudo de impacto ambiental (EIA) da obra.
“A gente vai deixar de ter algumas espécies, mas por outro lado, vai haver maior abundância de outras espécies, que inclusive podem ser utilizadas também pelos pescadores”, afirma Doria, professora do Departamento de Biologia e do laboratório de Ictiologia e Pesca da Universidade Federal de Rondônia (Unir). O diagnóstico feito pela Unir detectou a existência de 459 espécies de peixes no Rio Madeira. A pesquisadora afirma que, apesar do temor de alguns pescadores da região, não haverá extinção de peixes.
As duas usinas que o governo federal quer construir no rio, em Rondônia, somam 6.450 megawatts – aproximadamente metade da potência de Itaipu, a usina mais potente do país. A obra depende da concessão de licença prévia pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
As questões relativas à migração de peixes na época da reprodução foram um dos pontos abordados nos vários pedidos de informações do Ibama ao consórcio Furnas/Odebrecht, que fez o EIA. Isso porque a obra pode dificultar a locomoção de espécies que sobem o rio na piracema, procurando locais com menores acúmulos de água, ou a descida de ovas e larvas, que chegariam a pontos do rio a jusante.
O projeto das usinas prevê a construção de elementos de transposição, que imitam as condições que os peixes encontram atualmente. De acordo com Carolina Doria, esse mecanismo já se mostrou eficaz em outras barragens, como a de Itaipu. “Esses canais representam as características das corredeiras que hoje os bagres e outros peixes migradores têm que ultrapassar durante a migração, com velocidade e níveis de oxigênio semelhantes para que eles possam transpor as barragens”, explica.
A possibilidade de ficar sem o trabalho que faz há mais de 30 anos para sustentar a família, com sete filhos e dois netos, assusta o pescador Almeida Nunes Pereira. Ele avalia que não vai mais ser possível pescar na área em que devem ser construídas as represas. “Se for proibido pescar aí, a gente dá um jeito, vai aí para baixo. Porque no Amazonas é liberado, mas aqui em Rondônia a gente não pode trabalhar com rede da malha miúda. Mas aí para o Amazonas pode”, conta o pescador, garantindo que não vai largar a pescaria, porque é a única coisa que sabe fazer.
Pereira diz acreditar na capacidade técnica dos construtores para que não haja diminuição do pescado. “Ninguém sabe como eles vão fazer a barragem, ninguém sabe se vai ficar algum canal para passar. Mas eu acho que deve ficar. Acho que não vai prejudicar a passagem dos peixes, deve prejudicar a passagem dos barcos”, afirma Pereira. Em relação ao futuro dos peixes no rio, ele comenta: “O peixe não acaba, não, ele se torna mais difícil. A gente que pesca, que anda nesse rio, a gente que sabe a quantidade de peixes que tem”.
O pescador, que trabalha diariamente no Mercado Cai N'Água, em Porto Velho, opina que as obras serão positivas para a capital, mas ruins para sua profissão. “Para a cidade com certeza vai melhorar, mas para nós aqui vai se tornar pior. Vai gerar muito emprego, vai ser bom, mas nesse sentido vai prejudicar muita gente”, diz.
(Por Sabrina Craide,
Agência Brasil, 07/06/2007)