Neste segundo trecho da entrevista à Agência Brasil, o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, diz que o Brasil pode fazer mais no campo da eficiência energética e sugere que seja desenvolvido um programa nacional de conservação de energia. Ele afirma, no entanto, que isso não evita a necessidade de aumentar a produção, e que a produção hidrelétrica é uma fonte “do presente”, enquanto a eólica é do “futuro”.
Agência Brasil: Está havendo uma prioridade exagerada na produção de energia, com a construção de hidrelétricas e termelétricas, em detrimento de ações de preservação energética? Na época do apagão (crise de fornecimento em 2001), o país conseguiu poupar 30%...
Maurício Tolmasquim: Por mais que nós preguemos a eficiência energética, não devemos nos iludir. Precisaremos aumentar a oferta de energia para poder atender o bem-estar da população. Toda oferta de energia tem maior ou menor impacto. Eficiência energética é importante, mas o Brasil precisa de oferta de energia para atender ao seu crescimento. Por outro lado, seria importante haver um programa nacional de conservação de energia. Hoje só existem programas setoriais, como Procel, ligado à Eletrobrás, o Compet, ligado à Petrobras, ações no Ministério de Minas e Energia, Sebrae [Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas], Aneel [Agência Nacional de Energia Elétrica]. Eu tenho defendido isso no governo. Seria importante o Ministério de Minas e Energia lançar esse programa, algo estruturado de maneira oficial e que integre os diversos programas que existem. Pode haver leilões para eficiência energética. Podemos organizar leilões para comprar a conservação de energia. Contrataria o megawatt poupado.
ABr: Onde poderia haver maior queda no consumo?
Tolmasquim: De uma maneira geral, as indústrias grandes, que têm um gasto importante com energia, já têm um programa de conservação. Cada megawatt poupado reduz enormemente a fatura. Já as empresas de porte médio, principalmente o comércio, poderiam economizar mais. Mas a economia tem mais efeito sobre o consumidor residencial. Com o racionamento [em 2001], houve uma mudança no padrão de consumo, com desuso de freezers, diminuição no uso de ar-condicionado e hábito de se desligar a luz quando não há necessidade. Mas isso não é permanente, pois vão surgindo novos equipamentos. Agora mesmo vamos adotar o padrão da TV digital, que vai operar com um conversor que consome grande quantidade de energia.
ABr: Então é inevitável o aumento do consumo de energia, principalmente com a melhora na qualidade de vida de parte da população?
Tolmasquim: Com a melhora da economia uma grande parcela da população vai poder comprar novos aparelhos elétricos, o que vai aumentar o consumo de energia. Já a classe média brasileira tem padrões de consumo que são equivalentes a padrões europeu ou americano e não deve registrar um aumento expressivo na demanda.
ABr: E como as fontes de energias alternativas (eólica, solar, biomassa e pequenas usinas hidrelétricas) podem ajudar para garantir a oferta no mercado brasileiro?
Tolmasquim: Algumas energias alternativas já são competitivas e extremamente atraentes – e eu prefiro chamar de fontes renováveis de energia – como a hidrelétrica, as PCHs (pequenas centrais hidrelétricas) e as usinas da biomassa, principalmente da cana-de-açúcar [que usam a palha da cana como combustível nas caldeiras]. O Brasil também tem um grande potencial de ventos – e alguns dizem que é o equivalente a dez Itaipus. Mas o custo de geração ainda é caro, alcançando R$ 200 a R$ 220 o megawatt, contra R$ 140 de uma termelétrica e menos de R$ 125 da hidrelétrica. Os países ricos da Europa estão colocando uma quantidade enorme de energia eólica, mas de maneira subsidiada. Mas isso é pegar dinheiro do estado que iria para a educação e a saúde e aplicar em gerador eólico. Será essa a nossa prioridade? A eólica é uma energia do futuro do Brasil, a do presente é a hidreletricidade, o bagaço de cana e as PCHs.
ABr: Qual sua avaliação do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas (Proinfa)?
Tolmasquim: O Proinfa tem uma série de problemas. Inicialmente estava previsto para instalar 3,3 megawatts de três fontes: eólica, biomassa e PCH, que deveriam entrar em operação em 2006. Não foi possível, mas vão entrar em 2008. Noventa por cento do que foi contratado no Proinfa vai entrar em operação, ainda que com defasagem. Mas temos que entender que é um programa inicial, que são pequenos produtores, que tiveram dificuldade de conseguir financiamento, problemas de equipamentos etc.
ABr: A energia solar não é pouco utilizada no país?
Tolmasquim: Existem dois tipos de usos para a energia solar: a fotovoltaica, usada para produzir energia, e a térmica, usada para aquecer a água, através de painéis. A térmica tem um potencial monumental e é competitiva. Porque o Brasil tem uma grande insolação e não é uma energia cara. Em Israel, por exemplo, todos os prédios têm aquecedor solar. Mas é necessária uma legislação urbana, que obrigue que os prédios já sejam construídos com canalização para água quente. A instalação do painel não é tão cara. Embora não exista programa do governo federal de financiamento, a questão depende mais das prefeituras, que devem mudar as leis de construção. Já a fotovoltaica é muito cara e só se justifica para regiões muito afastadas.
ABr: Qual a comparação entre o custo e o benefício das diferentes fontes de energia, levando-se em conta o impacto ambiental?
Tolmasquim: É necessário contabilizar o custo econômico e o ambiental. Felizmente nós temos no Brasil fontes que são competitivas nos dois lados, como a hidrelétrica e o bagaço de cana. Já as fontes solar e eólica são ótimas do ponto de vista ambiental, mas são muito caras do ponto de vista econômico. Mesmo colocando o custo ambiental, a hidrelétrica é muito mais barata do que as demais fontes. Hoje as hidrelétricas são construídas em uma área alagada muito pequena, com pouco impacto e não tem emissão de CO2 [gás carbônico].
(Por Vladimir Platonow, Agência Brasil,04/06/2007)