Por Paulo Nogueira-Neto
Na Federação brasileira a efetiva proteção da biodiversidade começou tarde, nos anos 30 do século passado, com a criação de alguns parques nacionais e com a aprovação de um Código Florestal bem-intencionado, mas muito pouco aplicado.
Contudo, após a 2ª Guerra Mundial, os problemas ambientais começaram a se agravar. Algumas décadas depois, os principais países resolveram convocar a Conferência de Estocolmo, em 1972, para tratar do assunto. A Federação brasileira muito pouco se preocupava com o meio ambiente, a ponto de um jornal de certo Estado ter publicado um anúncio de meia página com o desenho de uma chaminé soltando fumaça e os dizeres: “Tragam para cá a sua poluição.”
Não quero entrar em detalhes, mas aos poucos a opinião pública foi mudando, principalmente em conseqüência de graves problemas de degradação atmosférica nas cidades de São Paulo, Cubatão, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Contagem (MG), e da poluição aquática em vários rios e pontos da costa. Louvo a clarividência de pessoas como Henrique Brandão Cavalcante, autor do decreto que em 1973 criou a Secretaria Especial do Meio Ambiente. Fui parte desse processo, como primeiro-secretário da Secretaria Especial do Meio Ambiente, a qual inicialmente contava com três salas e cinco funcionários. Quero apenas dizer que sou um sobrevivente dessa época difícil.
A Secretaria Especial do Meio Ambiente (Sema) foi crescendo e ocupando vácuos de poder. Chegamos a estabelecer uma rede de 18 estações ecológicas, com 3,2 milhões de hectares, equivalentes à área de três Repúblicas do Líbano. Houve também nessa época a criação, com a ajuda de vários Estados, de alguns milhões de hectares de áreas de proteção ambiental (APAs). Era o início de um esforço continuado para salvaguardar grandes espaços necessários à proteção da biodiversidade.
Em certo ponto do processo de salvaguarda, foi criado o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), mediante a fusão da Sema, do Instituto Brasileiro do Desenvolvimento Florestal (IBDF) e de órgãos relacionados com a pesca e com a proteção a seringueiros. O Ibama nasceu com uma estrutura de miniministério. Mais adiante foi estabelecido o Ministério do Meio Ambiente, que de certo modo duplicou a estrutura do Ibama. Este fato trouxe uma série de problemas que perduram até hoje, quando vermos uma parte do Ibama agir como se fosse o órgão máximo ambiental do País.
O resultado prático dessa história sui generis foi um conjunto de acertos, mas também de dificuldades. O Ibama cresceu enormemente, passando a gerir cerca de 60 milhões de hectares de áreas protegidas, o que foi excelente no que se refere à sua extensão protetora. Permaneceram, contudo, problemas de administração. O Ibama tornou-se um gigante problemático, apesar dos esforços e da integridade do seu presidente, professor Marcus Barros, e dos seus colaboradores. Além das dificuldades administrativas, que prejudicavam as unidades de conservação, surgiram outras.
Diante desse quadro, que preocupava as ONGs ambientalistas e também a área central do Ministério do Meio Ambiente, a ministra Marina Silva, com a colaboração do secretário de Biodiversidade e Florestas, João Paulo Ribeiro Capobianco, e com o apoio de muitas ONGs e personalidades, com a devida autorização do presidente da República, optou por uma solução radical, mas necessária e inadiável. Foi finalmente dividido o Ibama.
O Ibama poderá dedicar-se mais a estudos ambientais, aos licenciamentos e à tomada de medidas necessárias ao desenvolvimento sustentável do País. Poderá expandir as suas atividades nos campos do controle do aquecimento climático, do controle federal da poluição nos rios federais e no oceano e em muitos outros setores. Haverá, assim, um aperfeiçoamento efetivo do Ibama, com a concentração de suas atividades.
Por outro lado, o novo Instituto Chico Mendes cuidará melhor das unidades de conservação, superando uma série de entraves e dificuldades burocráticas. Poderá receber e dirigir muito melhor e mais de perto a ajuda externa e interna que lhe for destinada, como é o caso das compensações ambientais federais. Somente isso já justificaria, de sobra, a criação do Instituto Chico Mendes. Poderá ter a sua responsabilidade reforçada com um corpo de consultores provenientes de universidades e de ONGs brasileiras. Terá, em resumo, a possibilidade de resolver questões fundamentais de biodiversidade, sem desviar suas atenções para outras assuntos.
Quando a ministra Marina Silva, em boa hora, anunciou durante uma reunião do Conselho Nacional do Meio ambiente (Conama) a criação do Instituto Chico Mendes de Proteção à Biodiversidade, gritei de onde estava um sonoro VIVA!
Nada de melhor para o meio ambiente poderia ter acontecido nestes tempos, em matéria de novos rumos ambientais a seguir, do que a decisão de criar essa nova instituição para proteger a biodiversidade.
A criação do Instituto Chico Mendes para a Proteção da Biodiversidade foi efetuada num momento muito oportuno para o Brasil, também no que se refere à possibilidade de receber apoio financeiro internacional para medidas que venham a manter florestas em larga escala. Isso evitaria que a sua derrubada e queima lancem imensas quantidades de compostos de carbono na atmosfera do planeta. Como se trata de um instituto oficial, nossa soberania estará plenamente assegurada e a proteção durará pelos séculos afora, movimentando o ecoturismo e outras atividades econômicas.
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Estado de S. Paulo, 30/05/2007)