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operação navalha
2007-05-29
Uma placa caída, um alojamento abandonado e centenas de árvores da mata ciliar abatidas são o espólio da passagem da Gautama pelo Núcleo Rural do Rio Preto, onde a construtora iria erguer a primeira de uma série de 26 barragens da bacia hidrográfica da região. Além dos questionamentos feitos nos últimos anos por promotores, por ministérios , pelo Tribunal de Contas da União (TCU) e pela fiscalização ambiental, o empreendimento enfrenta resistência dos que seriam teoricamente os principais favorecidos pela obra: quase a totalidade dos produtores da área são contra a barragem que, metida nas falcatruas reveladas pela Operação Navalha, deverá agora permanecer engavetada.

As prisões do dono da Gautama, Zuleido Veras, e do deputado distrital Pedro Passos (PMDB) foram na verdade o último de uma seqüência de episódios conflituosos envolvendo a obra. O primeiro aconteceu há seis anos, quando os produtores, que naquela área plantam soja, feijão, milho e criam galinhas e porcos, viram chegar funcionários do Governo do Distrito Federal, munidos de equipamentos de medição.

Questionados sobre o que estavam fazendo, os servidores disseram que realizavam um levantamento técnico para a barragem. “Que barragem?”, começaram a se perguntar os agricultores, justamente os que deveriam receber os medidores com festa. Só quando resolveram impedir a entrada dos emissários do governo às propriedades foi que os agricultores conseguiram ser recebidos pelo governo e descobriram o que estava ocorrendo.

Irrigação
Com o nome pomposo de Projeto de Aproveitamento Hidroagrícola do Rio Preto, o conjunto de obras havia sido gestado no ano anterior, em 2000, no primeiro dos dois últimos mandatos do governador Joaquim Roriz (PMDB). No nascedouro do empreendimento, a estimativa era de um investimento de R$ 145 milhões — projeção que depois aumentaria em 20% — para irrigar cerca de seis mil hectares com mil propriedades. No papel, tudo parecia bem. As 26 barragens teriam o objetivo de acumular água no período de grande oferta, quando há chuvas, para liberá-la em época de seca. Isso permitiria irrigar novas áreas, garantiria mais de um plantio por ano em uma mesma terra e incentivaria o cultivo de hortaliças, legumes e outras plantas que exigem grande quantidade de água.

Os produtores do Núcleo Rural de Rio Preto, na região de Planaltina, a 65km do Plano Piloto, seriam o beneficiados pela primeira barragem, a que iria reter as águas do Córrego Extrema. Começaram a fazer os cálculos e concluíram que teriam mais prejuízos que lucro. Descobriram que parte de suas terras seriam alagadas, que sob as águas ficariam cerca de 200 hectares da mata nativa que acompanha córregos, considerada área de preservação permanente, e para compensar essa perda teriam de colocar árvores em outras fatias de terra que costumam usar para plantar. “É um desrespeito”, diz Moacir Czaresk, um gaúcho que veio do norte do Rio Grande do Sul, cultiva uma área de 199 hectares e perderia 29 com a barragem. “Vendemos nossas propriedades, viemos aqui para investir e não somos ouvidos.”

Sem viabilidade
Os agricultores da região reclamam que o modelo de irrigação pensado para o Rio Preto é melhor para hortaliças e outros produtos que não são mais comuns naquela área. Chegaram a ser plantados em grande quantidade há alguns anos, mas foram abandonados por darem pouco lucro. “Não se olhou a viabilidade econômica, não se olhou a viabilidade social, não se olhou nada”, se queixa Paulo Castanheira, que trabalhou na Emater e é produtor na região.

Desde a chegada dos medidores, a Associação dos Produtores Rurais do Rio Preto, na qual estão os 23 atingidos diretamente pela barragem, tenta impedir a obra. Durante anos acompanharam estudos técnicos e discussões políticas e, em meados do ano passado, viram chegar os funcionários da Gautama.

A construtora ergueu um alojamento para os empregados ao lado da sede da associação, colocou duas placas e começou a derrubar as árvores para construir a taipa de 16 metros de altura que deveria estancar a água do Extrema, que desemboca no Rio Preto. Um abaixo-assinado, contestação na Justiça e pressão sobre o GDF conseguiram parar os trabalhos.

Pacote
E parados deverão ficar. “A obra é importante, mas não é prioritária”, diz o secretário da Agricultura, Wilmar Luís da Silva. Ele cuidou do projeto como presidente da Emater no governo Roriz e depois seguiu a mesma linha ao assumir, no ano passado, o cargo de secretário, posto ao qual voltou no governo de José Roberto Arruda, para quem fez campanha inclusive em Rio Preto. “A barragem não está no pacote de obras nem para este nem para o próximo ano. Se daqui a algum tempo a comunidade se manifestar a favor, aí a gente estuda.” Não parece que isso vá ocorrer. Ainda que discorde de alguns argumentos dos produtores de Rio Preto, o secretário reconhece que o começo do processo foi pouco negociado com os agricultores, o que alimentou as críticas.

No entanto, a resistência à obra no Córrego Extrema e as falcatruas descobertas pela Polícia Federal não significam, necessariamente, que as demais barreiras sejam perda de dinheiro. “Eu estou muito preocupado com o anúncio da paralisação do projeto”, diz o paranaense Fernando Ribeiro de Miranda, que cultiva 313 hectares à margem do Rio Jardim, onde seria erguida outra barragem que atingiria 22 produtores. Mesmo com a perspectiva de ver 90 hectares de suas terras inundados, ele diz que lucraria com a possibilidade de plantar batata, cenoura, cebola e outros legumes, com até quatro colheitas por ano. “Seria muito bom para todos nós.”

(Por Solano Nascimento, Correio Braziliense, 28/05/2007





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