A primeira prisão preventiva por crime ambiental do Brasil foi decretada há exatos seis meses – completos segunda-feira (28/5) – e ainda não foi efetivada. O engenheiro químico Luiz Ruppenthal, 52 anos, está desde 28 de novembro do ano passado foragido e entre os sete mais procurados pela Polícia gaúcha, que garante estar empenhada na prisão.
Ex-responsável técnico e diretor da União dos Trabalhadores em Resíduos Especiais e Saneamento Ambiental (Utresa), de Estância Velha (sob intervenção também há seis meses), Ruppenthal é acusado de 50 crimes ambientais, que resultaram na morte de 85 toneladas de peixes no Rio dos Sinos, em outubro do ano passado. Enquanto a Polícia segue na busca do empresário, questionamentos de familiares e defesa e também investigações do Ministério Público indicam que podem existir outros interesses e pessoas envolvidas nos crimes.
O titular da Delegacia de Capturas do Departamento de Investigações Criminais (Deic), Guilherme Wondracek, garante que troca de informações e diligências já ocorreram com a Polícia Federal para capturar Ruppenthal, “Nada pode ser adiantado para não atrapalhar as investigações. Sabemos que ele não deixou o País pelas vias legais”, argumenta. A evolução das investigações também é tratada com sigilo pelo titular da 3.ª Delegacia de Polícia Regional Metropolitana, João Bancolini. “Estamos acompanhando o trabalho da delegacia de Estância Velha, e dando todo apoio para que seja cumprida a ordem judicial”, garante Bancolini. Já o delegado estanciense, Luiz Fernando Nunes da Silva, afirma que “o caso é prioridade pela repercussão que teve”.
Paralelamente às buscas, os promotores de Estância Velha e Portão seguem investigando novas denúncias “que podem nos levar a crimes ainda mais graves”, acredita o promotor de Estância Velha, Paulo Eduardo de Almeida Vieira.
Esposa de Ruppenthal questiona investigações
Desde 28 de novembro, quando foi decretada a prisão preventiva do ex-responsável técnico e diretor da Utresa, Luiz Ruppenthal, sua família enfrenta uma nova realidade. Antes considerado referência na área ambiental, proferindo palestras sobre o tema por todo o Brasil, o empresário passou a integrar a lista dos sete mais procurados pela Polícia do Estado, e seus bens e os de uma empresa da família foram declarados indisponíveis pela Justiça. “Espero que esse pesadelo se resolva da melhor maneira”, desabafou a esposa do empresário, Vera Lavínia Leuck, 52 anos, em entrevista por telefone à reportagem do Jornal NH, na noite de sexta-feira (25/5).
Natural de Estância Velha e casada com Ruppenthal há 26 anos, Vera acompanhou toda a trajetória do marido junto à Utresa e o definiu como alguém que trabalhou muito “e nunca foi de fazer falcatruas”. Ela questiona as investigações que recaíram sobre o marido, insinuando que existem responsabilidades não apuradas no caso.
Jornal NH - A senhora tem tido contato com ele (Ruppenthal)?
Vera Leuck - Tive só até duas ou três semanas depois que teve a prisão decretada. Não falei mais com ele. Espero que esteja bem.
Jornal NH - Como a senhora avalia a decisão da Justiça?
Vera - Acho que há uma injustiça muito grande nesse sentido. Tem muita coisa mal explicada nisso tudo.
Jornal NH - Baseada em que a senhora afirma isso?
Vera - Em uma empresa que é fiscalizada continuamente, não é estranho que isso aconteça?
Jornal NH - A senhora acha que houve omissão da fiscalização ou pessoas teriam descumprido orientações dele e conduzido as irregularidades na Utresa?
Vera - O que sei é que ele é uma pessoa que trabalhou a vida inteira, nunca foi de fazer falcatruas.
Jornal NH - Haveria então outras pessoas envolvidas? Seriam fiscais, colegas ou concorrentes?
Vera - Eu não sou a pessoa mais indicada para falar sobre isso. O que aconteceu realmente só o Luiz poderá te dizer.
Jornal NH - Mas a senhora tem alguma desconfiança?
Vera - Olha, passo por sérios problemas de saúde e não estou em condições de falar muito sobre isso. Mas o que sei é que em Estância Velha acontecem coisas muito estranhas.
Jornal NH - A senhora acredita na absolvição dele?
Vera - Espero que a Justiça seja feita e isso se resolva da melhor maneira.
Acusação x Defesa
Promotor de Estância Velha, Paulo Eduardo de Almeida Vieira
Coordenou as diligências onde foram coletadas as provas que desencadearam a intervenção da Utresa e prisão preventiva de Ruppenthal. Atua no caso ao lado do promotor de Portão, Marcelo Tubino Vieira: “O Ruppenthal era o responsável pela parte técnica da Utresa e, conforme depoimentos que constam no processo, era quem dava todas as orientações sobre o que era feito lá dentro. São irregularidades absurdas. As provas são claras. Seria impossível que ele não tivesse conhecimento. Acreditamos que ele será condenado, porque o crime ambiental atinge a todos nós e está sendo tratado como deve ser. Pedirei acúmulo das penas dos 50 crimes e acredito que, se condenado, a pena gire em torno de 6 a 8 anos”.
Advogado de Ruppenthal, Nereu Lima
Criminalista atua no caso desde a primeira semana de dezembro do ano passado. Após ter pedido de habeas-corpus negado pelo Tribunal de Justiça do Estado, em janeiro, aguarda julgamento do pedido de habeas encaminhado ao Superior Tribunal de Justiça: “Podem ter ocorrido falhas involuntárias, orientações não-cumpridas. Mas daí a ser chamado de criminoso vai uma longa distância. E para condenar tem que se ter certeza. Ora, ele, que investia em projetos ambientais, iria fazer questão de poluir o meio ambiente? Não tem nexo. A verdade é que está sendo eleito alguém para ser sacrificado, para que se desviem os holofotes das prefeituras e indústrias, que poluem o rio com esgoto e outros detritos. Acredito totalmente na inocência dele”.
Utresa passa por mudanças
Durante os seis meses em que está sob intervenção judicial, a Utresa passa por mudanças radicais. As tubulações que encaminhavam o chorume (resíduo tóxico) até os Arroios Cascalho e Portão foram canalizadas para bacias de acumulação – que já armazenam mais de 23 milhões de litros –, que antes iam para os arroios. Estas e outras reformulações são coordenados pelos interventores: o biólogo Jackson Müller e o geólogo Sandro Bertei.
Müller lembra que desde dezembro a Utresa já foi alvo de três supostas sabotagens. “Há indícios de conflitos internos e também interesses de fora para que a empresa feche suas portas, o que demonstra que o problema é maior do que se imaginava”, aponta o interventor.
A direção da empresa afirma que está fazendo o possível para colaborar com a Justiça e cumprir as normas ambientais determinadas pela Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam). A previsão é de que sejam necessários em torno de R$ 15 milhões para remediar os danos dentro da Utresa. A central de resíduos tem 3,5 mil clientes cadastrados, dos quais 600 regulares, que depositam, por dia, entre 300 e 450 metros cúbicos de lixo industrial no local.
(Jornal NH, 28/05/2007)