Há 13 anos, o ambulante Geraldo José Alves da Silva, 64 anos, prepara e vende cachorro-quentes na Praça da Bandeira, em frente à Avenida Rio de Janeiro (Centro de Londrina). De uns dois anos pra cá, ele tem chegado no local de trabalho bem mais cedo que o habitual, por volta das 7 horas, para lavar a mureta, suja com as fezes dos pássaros, onde seus clientes costumam sentar. ''A cada ano que passa tem aumentado muito a quantidade de sujeira. Aqui fica forrado de cocô. Quando faz calor, o cheio fica mais forte ainda. As pombas fazem mais sujeira à noite, então toda manhã eu limpo aqui'', comenta.
A queixa do ambulante é a mesma de quase todas as pessoas que circulam pelo Centro, principalmente nas proximidades do Bosque, para irem até o trabalho, ou para fazer a caminhada matinal. A aposentada Maria de Lourdes Lopes, 80 anos, frequentadora do Zerinho, disse ''não suportar'' mais a situação. ''Está terrível isso aqui. O cheiro é muito forte e a gente fica respirando essa poeira o tempo todo. Depois que chove, bate o sol e levanta aquele mau cheiro insustentável. Está uma vergonha, alguém tem que fazer alguma coisa porque isso deve fazer até mal pra saúde'', comentou.
Marialdo Machado, proprietário de um quiosque de vitaminas na Avenida São Paulo, em frente à Catedral, disse que vê, quase todos os dias, pessoas escorregando e caindo por causa das fezes. ''Tem uma rampinha aqui que é fatal, todo mundo cai. Já vimos até mulher grávida escorregar. É nojento e todo mundo fica respirando isso'', comentou. Preocupado com a aparência da cidade, Machado sugere uma medida que poderia acabar com a grande quantidade de sujeira. ''A prefeitura deveria podar todas as árvores e aí acaba com essa quantidade de pássaros'', disse.
Há alguns meses, varredores contratados pela prefeitura passaram a utilizar máscaras quando limpam as ruas e praças do Centro. José Roberto, varredor há cinco anos, disse que a empresa sempre obrigou os funcionários a usar a máscara, mas todos passaram a empregá-la depois que sentiram o aumento da quantidade de fezes. ''Quando chove fica ainda mais difícil de varrer, vira uma lama. Mas o que mais incomoda é o pó que é fácil de ser inalado'', comentou. Para ele, a instalação de luminárias próximas às árvores poderia resolver o problema. ''A maioria das aves permanece nessas árvores à noite. Se tiver bastante claridade por aqui, a luz espanta eles. Em Curitiba boa parte de problemas como esses foram resolvidos assim''.
O médico especialista em alergia, Luiz Alterto Scripes, disse que não tem tido queixas de alergias ocasionadas pelas aves, mas ele afirma que a poeira das fezes, inalada por várias vezes, em ambiente fechado, pode desencadear um processo alérgico. ''Em ambiente aberto é mais difícil. O fator neste caso é o incômodo com o mau cheiro. Esse pó não provoca alergia, mas pode intensificar o problema para aquelas pessoas que já são alérgicas'', disse.
O infectologista Jan Walte Stegmann explicou que as fazes das pombas são ricas em bases nitrogenadas o que, segundo ele, é um excelente alimento para os fungos. ''Os fungos se reproduzem muito bem nas fezes das aves, mas a própria ave não pega esse fungo'', disse. Ele conta que dois tipos de doenças ocasionadas pelos fungos, denominadas histoplasmose e criptococcose, podem atingir o ser humano.
''Até o momento não temos registrados casos ocasionados por causa da poeira do Centro, mas os fungos podem proporcionar doenças sim. Essas doenças podem atingir principalmente aquelas pessoas que sofrem com a queda da imunidade ou quem possui o vírus HIV ou algum tipo de câncer. Alguns dos problemas que podem desencadear com essas doenças são pneumotite, meningite e até outros problemas nos ossos, rins ou pulmões'', explicou.
(Por Fernanda Borges,
Folha de Londrina, 24/05/2007)