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2007-05-23
Uma das etapas mais complexas e caras do processo de reciclagem de papel é a secagem da polpa de celulose. Na produção artesanal, isso é feito ao ar livre, com o auxílio do vento e dos raios solares. Como o procedimento está sujeito a uma série de situações – a variação do clima é a principal delas –, o resultado nem sempre é satisfatório. Um dos problemas mais freqüentes é a falta de uniformidade do material, o que compromete a sua qualidade final. Pensando nessa dificuldade, pesquisadores da Faculdade de Engenharia Química (FEQ) da Unicamp desenvolveram o protótipo de um secador de pequenas proporções e baixo custo, que pode ser utilizado por microempresas, grupos de artesãos e pequenas cooperativas de reciclagem.

Falta de uniformidade é problema recorrente
A primeira aplicação da nova tecnologia, apoiada pela Empresa Júnior Propeq, será provavelmente em uma oficina de reciclagem de papel mantida por um hospital psiquiátrico da região de Campinas. O projeto do equipamento, que obteve financiamento da Fapesp, já teve seu pedido de patente protocolado pela Universidade.

O desenvolvimento do secador integra uma linha de pesquisa coordenada pela professora Sandra Cristina dos Santos Rocha. Desde 1988, quando fez o doutorado na Escola Politécnica da USP, a pesquisadora vem se dedicando à questão da secagem. De acordo com ela, o processo está presente na maioria das indústrias – da farmacêutica à química, passando pela de alimentos. “Uma das finalidades da secagem pode ser a conservação do produto. Por meio dela é possível, por exemplo, evitar a proliferação de fungos ou bactérias”, explica. Ocorre, porém, que os equipamentos empregados nas atividades industriais são de grande porte e, conseqüentemente, de alto custo. No caso da indústria de papel, as máquinas são projetadas para secar toneladas de matéria-prima.

A idéia de conceber um secador de baixo custo capaz de produzir pequenas quantidades de papel foi de Melissa Gurgel Adeodato Vieira, então aluna de doutorado da professora Sandra. O objetivo central do trabalho, que mais tarde mostrou-se exeqüível, era conferir um caráter social e ambiental ao equipamento. A primeira iniciativa de Melissa foi procurar artesãos que produziam cartões a partir de papel reciclado. Estes, conforme apurou a então doutoranda, normalmente trabalham em casa. Primeiro, eles picam e moem o papel. Com isso, obtêm a polpa de celulose, que é aplicada sobre telas, que por sua vez são colocadas para secar em varais. “Além de demorado, esse processo gera dois problemas sérios. Primeiro, os artesãos não têm como trabalhar em dias de chuva. Segundo, não conseguem controlar a secagem, o que pode prejudicar a qualidade final do produto, inclusive para fins de impressão”, explica a docente da FEQ.

O desafio dos pesquisadores passou a ser, então, desenvolver um secador que fosse adequado às necessidades práticas e à capacidade financeira dos pequenos recicladores de papel. Para isso, a tecnologia deveria combinar três aspectos principais: simplicidade, eficiência e economia de energia elétrica. Depois de muitas pesquisas e discussões, os cientistas projetaram um equipamento composto por módulos, que pode ser ampliado ou reduzido de acordo com o interesse do usuário. Numa comparação livre, ele se assemelha a uma torradeira elétrica ou a uma disqueteira. As telas recobertas pela polpa de celulose são colocadas lado a lado num compartimento do secador. Em seguida, o ar captado do ambiente circula por um tubo até encontrar um conjunto de resistências elétricas. Depois de aquecido, é impulsionado até as telas, que são “atingidas” lateralmente. Por último, o ar é novamente liberado para o ambiente ou pode ser reciclado.
 
Variáveis – De acordo com a professora Sandra, a parte mais complexa para a montagem do secador é a instalação da tubulação. “O restante é encontrado facilmente no mercado, como compressor, resistências e chapas de metal”, explica. A pesquisa conduzida pelos especialistas da FEQ levou em conta também aspectos como a temperatura e a velocidade do ar envolvidos no processo de secagem. Essas duas variáveis, esclarece a docente, têm reflexo direto no tipo de papel que se pretende obter. “Nos ensaios que realizamos, nós determinamos que a temperatura deve variar entre 60 e 94 graus Celsius, a uma velocidade entre 0,3 a 0,8 metro por segundo. Quando são utilizadas as taxas mais altas de temperatura e velocidade, a secagem ocorre em cerca de 30 minutos, enquanto no método artesanal pode levar várias horas e até dias, dependendo do clima. Nesse caso, entretanto, o cartão obtido é mais áspero. Sua aplicação, portanto, é menos nobre, como em caixas de papelão”, adverte.

O valor mais adequado para obter um papel de melhor qualidade, que pode ser empregado na produção de cartões finos, é 60 graus Celsius, conforme os testes realizados pela equipe da professora Sandra. Nesse caso, o material é mais uniforme e menos poroso, prestando-se a trabalhos de impressão, por exemplo. A velocidade do ar, de acordo com a professora Sandra, tem menor influência no resultado final do produto. A docente da FEQ conta que aproveitou papel sulfite para a produção da polpa de celulose utilizada nos ensaios. A única substância adicionada à matéria-prima foi um aglutinante, com a finalidade de formular uma pasta mais homogênea. “Os resultados foram muito bons. Penso que a transferência dessa tecnologia para microempresas, grupos de artesãos e pequenas cooperativas de reciclagem será simples. Também não vejo problema em transformar o nosso protótipo num equipamento de maior escala”, afirma.
 
Alcance social – Como já foi dito, o secador de polpa de celulose concebido pelos pesquisadores da FEQ deve ser utilizado primeiramente por um hospital psiquiátrico da região de Campinas, que oferece oficinas de reciclagem de papel para seus pacientes. As negociações estão sendo feitas pela Empresa Junior Propeq. De acordo com a professora Sandra, os alunos estão analisando o espaço físico disponível e a viabilidade de substituir o aquecedor elétrico por outro meio, que poderia ser, por exemplo, o vapor que já é gerado pelas caldeiras do estabelecimento de saúde. Conforme a docente, ainda não existe uma estimativa de custo para o secador, mas ela acredita que as cifras serão baixas, visto que o equipamento pode ser produzido a partir de componentes simples encontrados facilmente no mercado.

(Por Manuel Alves Filho, Jornal da Unicamp, 22/05/2007)

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