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plano de irrigação rs irrigação
2007-05-16
Por Antonio Eduardo Lanna*
A Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul aprovou mês passado (abril de 2007) o Projeto de Lei da Reforma Administrativa do Estado do Rio Grande do Sul que desvirtua a gestão de recursos hídricos ao atribuir a uma secretaria extraordinária de irrigação funções que deveriam ser exclusivas de uma entidade não vinculada a usos setoriais da água, como prevê a Política Nacional (e também Estadual) de Recursos Hídricos. Com isto, no RS, a secretaria que tem atribuições em desenvolver e implementar o Plano Estadual de Irrigação, uso que corresponde a mais de 90% da apropriação da água no Estado, terá as seguintes atribuições:

Secretaria Extraordinária da Irrigação e Usos Múltiplos da Água:
a) projetos de irrigação, drenagem e controle de enchentes;
b) inventário e recuperação dos mananciais naturais para fins de usos múltiplos da água;
c) sistematização e elaboração de planos diretores de desenvolvimento sustentável de bacias, em consonância com o Plano Estadual de Recursos Hídricos e com os planos das bacias específicas;
d) planejamento dos usos múltiplos da água, em conformidade com o Plano Estadual de Recursos Hídricos e com os planos específicos das bacias hidrográficas; e
e) programação das intervenções estruturais vinculadas aos usos múltiplos da água e à regularização de vazões.

O RS inova o processo de planejamento de recursos hídricos que terá, no estado, um Plano Estadual, Planos de Bacias Hidrográficas e um documento novo, que não foi especificado a não ser por seu título: "Planos Diretores de Desenvolvimento Sustentável de Bacias"; além disso haverá um "planejamento dos usos múltiplos da água" que deverá estar conforme com o "Plano Estadual de Recursos Hídricos e com os planos específicos das bacias hidrográficas" como se o objetivo primordial desses dois últimos planos não fosse o planejamento do uso múltiplo da água.

A Secretaria do Meio Ambiente, que tinha e deveria ter as atribuições b), c), d) e e) acima, ficou como "órgão de integração do Sistema de Recursos Hídricos do Estado" - aparentemente, emitirá outorgas de direitos de uso de água, tendo por base planos de recursos hídricos que a essas alturas não se sabe quais são: 1) o estadual, 2) o de bacias hidrográficas, 3) o de desenvolvimento sustentável de bacias hidrográficas, ou 4) o planejamento de usos múltiplos elaborados pela Secretaria Extraordinária de Irrigação.

Esse desmonte de um sistema criado com a aprovação da lei 10.350 no final de 1994 – portanto há mais de 12 anos – merece reflexões que, pelo menos, permita que outros estados não incorram nos mesmos equívocos. Esta reflexão será realizada a seguir, por meio de um breve análise retrospectiva e uma avaliação de conjuntura.

Breve Análise Retrospectiva
No passado recente, que de certa forma se confunde com o período de elaboração e o início de implantação da Política Estadual de Recursos Hídricos, o uso, o controle e a proteção das águas no Estado do Rio Grande do Sul mostraram sinais que justificaram as preocupações relacionadas ao aperfeiçoamento de sua gestão. É de se notar que o Rio Grande do Sul foi, no passado, pioneiro em matéria de usar os recursos hídricos como base para o seu desenvolvimento. No início da década de 70 o Estado já apresentava a maior área irrigada do país, desenvolvida mediante investimentos privados, especialmente nas regiões hidrográficas do Uruguai e do Litoral.

Em 1980 foi elaborado o Plano Diretor de Irrigação do Estado do Rio Grande do Sul pela Secretaria Estadual de Obras Públicas. Já havia um Plano Hidroviário do Rio Grande do Sul, elaborado em 1961 pelo Departamento Estadual de Portos, Rio e Canais - DEPREC, e posteriormente um Plano Diretor de Navegação Interior do rio Grande do Sul, elaborado pelo GEIPOT/Ministério dos Transportes; a maior carga transportada por via fluvial no Brasil era na hidrovia Taquari-Jacui-Guaíba-Lagoa dos Patos. Embora os recursos hidroenergéticos do estado sejam mais concentrados no Rio Uruguai, que só mais recentemente está sendo aproveitado, a Companhia Estadual de Energia Elétrica operava hidrelétricas no rio Jacuí, principalmente, e em outros cursos de água. A criação de aves e suínos na região do Uruguai, o desenvolvimento industrial na região do Guaíba, e, em todo o Estado, o lançamento de esgotos domésticos in natura nos corpos de água, já tinham como contrapartida uma acelerada degradação das águas.

Esse desenvolvimento da apropriação setorial de recursos hídricos só poderia resultar, com o passar do tempo, em conflitos de uso de água. Antigos balneários às margens dos corpos de água da região metropolitana de Porto Alegre e em outras regiões periurbanas foram rapidamente abandonados, privando a população de uma alternativa de lazer de verão. As companhias de abastecimento público necessitavam, em alguns casos, de realocar suas tomadas de água para evitar a captação de águas inapropriadas para a potabilização ou investir mais em tratamento para a potabilização. Conflitos entre o uso de água para irrigação e para abastecimento se agravaram nas estações de estiagem, exigindo que as bombas de recalque dos arrozeiros fossem lacradas. A operação de hidrelétricas para atendimento a demandas na ponta dificultou a captação de água por parte de irrigantes e companhias de abastecimento, em virtude da flutuação de níveis.

O meio ambiente foi significativamente afetado, seja pela degradação hídrica, que resultou na perda de diversidade e de população da fauna e da flora, quando não da suas completas extinções, seja pela drenagem de áreas úmidas para irrigação do arroz ou assentamento de áreas urbanas, seja pela derrubada de matas ciliares para permitir a expansão da agricultura e da pecuária, resultando na erosão das margens ribeirinhas e na colmatação dos rios. Esta colmatação (ou assoreamento) foi ainda mais agravada pela agricultura extensiva, sem práticas de conservação do solo, que teve também, como conseqüência nefasta, a perda de fertilidade do solo e da produtividade agrícola, com a necessidade de uso mais intensivo de fertilizantes, que resultou em maior quantidade de nutrientes no solo e nas águas, afetando as águas superficiais e subterrâneas.

Face a esta situação, a resposta do Estado, embora tardia, começou a se esboçar como, aliás, também ocorreu no âmbito federal. No início da década dos 80 foi instituído o Sistema Estadual de Recursos Hídricos (Decreto 30.132/81), cujo órgão principal era um conselho com funções consultivas, o Conselho Estadual de Recursos Hídricos - CONRHIRGS, inicialmente subordinado à Secretaria de Planejamento, constituído exclusivamente por órgãos públicos das esferas estadual e federal. Em 1985, por iniciativa do Secretário Executivo do CONRHIRGS, foi formado um grupo de trabalho para promover os estudos necessários à definição de instrumentos jurídicos administrativos visando ao disciplinamento do uso das águas públicas do Estado. Esta comissão chegou a reunir-se algumas vezes e propor alguns encaminhamentos, mas nada se efetivou.

No final de 1987 foi elaborada uma lei genérica sobre as águas (Lei 8.735/88) estabelecendo os princípios e as normas básicas para o seu uso e proteção. Sua contribuição mais ambiciosa para o processo de planejamento foi a definição de um prazo para o executivo fazer um Plano Estadual de Recursos Hídricos, que, no entanto, não foi cumprido, entre outros fatores, pela falta de clareza a respeito da sua natureza e conteúdo, e formas de elaboração. Por outro lado, nos dois rios mais poluídos do Estado, o Sinos e o Gravataí, situados em regiões altamente urbanizadas e industrializadas, foram iniciados alguns movimentos da sociedade para discutir a situação destes recursos hídricos, além do surgimento de pequenos movimentos internos em alguns órgãos estaduais envolvidos, como a Corsan, a Fepam e a Metroplan. Isto levou à instalação, em março de 1988, do comitê da bacia do rio dos Sinos, o mais antigo ainda em funcionamento no país. No ano seguinte foi criado o comitê da bacia do rio Gravataí.

A tentativa de tornar estes comitês protagônicos no processo de gerenciamento de recursos hídricos no estado esbarrou em algumas indefinições. Eles se assemelhariam a uma ONG ou seriam órgãos de Estado? Teriam como papel a denúncia, o planejamento ou a deliberação a respeito de medidas de mitigação dos problemas da bacia? Existiriam "apesar do governo", em "paralelo ao governo", como "parte do governo", ou teriam funções mais permanentes de Estado? Essa discussão continuou até que se percebeu que existia um Conselho de Recursos Hídricos e uma lei sobre águas, já comentada, e que estes, portanto, deveriam ser acionados. Entretanto, o CONRHIRGS estava desativado, e sua secretaria executiva voltada essencialmente para a aplicação de recursos do Fundo Estadual de Recursos Hídricos, criado em 1989, em estudos de reservatórios visando a irrigação, em especial do arroz, em um flagrante desvirtuamento de suas funções.

Nesse ínterim, a Constituição Brasileira havia estabelecido como competência da União "instituir sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e definir critérios de outorga de direitos de seu uso" e o Estado de São Paulo havia aprovado em sua Constituição um capítulo inteiro dedicado às águas. Na Constituição Estadual de 1989 do Rio Grande do Sul, foi incluído um artigo instituindo o Sistema Estadual de Recursos Hídricos, adotando a bacia hidrográfica como unidade básica de planejamento e definindo critérios de outorga de uso e tarifação da água, ressaltando o objetivo de promover a melhoria da qualidade dos recursos hídricos e regulamentar os usos da água.

Um amplo movimento havia se instalado no Brasil, capitaneado pelas entidades estaduais com atribuições na área de recursos hídricos, entidades de classe, associações científicas, ONGs, e universidades, voltado à elaboração das políticas nacional e estaduais de recursos hídricos. Mais uma vez, São Paulo saiu na frente, aprovando a sua lei em 1991, servindo de exemplo aos demais estados e à União.

Nesse mesmo ano foi instituído pelo Presidente do CONRHIRGS um grupo de trabalho para elaborar uma proposta de projeto de lei de recursos hídricos, a ser previamente discutida com a Comissão Consultiva do CONRHINGS, que havia sido reativada alguns anos antes. Este grupo consolidou o texto da lei em meados de 1992 e encaminhou para a Comissão Consultiva, quando tiveram início discussões com outras instituições, como Fiergs, sindicatos e comitês. O projeto foi entregue ao CONRHIGRS por onde deu entrada no Poder Executivo, ficando ali estacionado cerca de um ano. Em meados de 1994 a Casa Civil assumiu o texto de lei proposto e o encaminhou para a Assembléia Legislativa, onde foi realizado um seminário para esclarecimento dos deputados. Apesar de poucos deles terem comparecido, houve um debate acalorado por parte dos presentes, geralmente técnicos da área e ambientalistas.

Os artigos que tratavam da cobrança pelo uso da água ensejavam as maiores polêmicas. Coroando o processo, a Lei 10.350 foi aprovada por unanimidade em 30 de dezembro de 1994 e sancionada integralmente pelo Governador do Estado, regulamentando o artigo 171 da Constituição Estadual, através da instituição do Sistema Estadual de Recursos Hídricos. Cabe comentar que o texto da lei é praticamente o mesmo que foi oferecido pelo grupo de trabalho que elaborou a sua primeira proposta, mostrando que não houve interesse na matéria seja por parte do legislativo, seja pelo executivo, a ponto de serem discutidas e aprovadas emendas. Em outras palavras, a política estadual de recursos hídricos não apresentava visibilidade política suficiente para ensejar a sua discussão por parte dos parlamentares e por parte do executivo que, de certa forma, não ofereceram nem apoio explícito, nem resistência a qualquer de seus dispositivos pela simples razão de acharem que não se tratava de tema relevante.

Essa impressão de irrelevância por parte dos representantes eleitos da sociedade manteve-se até hoje, com algumas descontinuidades que, no entanto, esbarravam nos sérios problemas de orçamento do estado. Essas descontinuidades no diagnóstico de relevância permitiram que comitês tenham sido instalados na maior parte das bacias do Estado e, mal ou bem, estejam em funcionamento até hoje. Como não foram instaladas as Agências de Região Hidrográfica, a pauta de trabalho dos comitês é tecnicamente preparada por arranjos espúrios, ad hoc. Em alguns, como o Comitê do Gravataí, por algum tempo a Metroplan ofereceu apoio técnico de forma direta, ou por meio de convênios com outras entidades, como a CPRM. Em outros, foram criadas comissões técnicas, integradas por representantes de entidades – geralmente públicas estaduais – no comitê, que em caráter voluntarista, e com grandes restrições de tempo, ofereciam algum apoio; esse seria o caso do Comitê do Sinos, entre outros. Em certos casos, interesses setoriais preponderantes no comitê permitiram que fossem contratados pelo governo estudos que serviram para estabelecer uma agenda de reivindicação de investimentos, geralmente a fundo perdido, como é o caso do Comitê do Santa Maria. O fato é que os comitês nunca funcionaram como é previsto na Política Estadual de Recursos Hídricos.

O Estado, por seu lado, se organizou de forma precária para executar as suas funções gerenciais inalienáveis, como a emissão de outorgas de direitos de uso de água. A falta de pessoal e de condições materiais mantém, em grande parte do estado, usos de água não regulamentados por este instrumento. Exigências que demandam maiores investimentos, como a instalação das Agências de Região Hidrográfica, quando foram seriamente tratadas, estiveram no bojo de estudos visando a implantação do instrumento de cobrança pelo uso da água que, no entanto, face ao seu potencial de causar polêmicas, não foi muito além de estudos teóricos.

A parte de planejamento, que demanda relativamente menos recursos, teve algum avanço, com a contratação de estudos e planos de bacia e, finalmente, do Plano Estadual de Recursos Hídricos, em elaboração nesse momento (2007). Os recursos provinham ou do Fundo Estadual de Recursos Hídricos, ou eram aportes a fundo perdido da União. Eles permitiram o diagnóstico de problemas de recursos hídricos das bacias mais problemáticas do estado com respeito a conflitos de uso e a degradação das águas, ofereceram soluções que, via de regra, não foram implantadas por falta de recursos. Mas permitiram que durante as suas elaborações os comitês encontrassem uma pauta de discussões, evitando em parte os seus esvaziamentos.

Breve Avaliação de Conjuntura
Passados 12 anos da promulgação da lei da Política Estadual de Recursos Hídricos, pouco pode ser mostrado em termos de avanços na implantação da política, a não ser os comitês e a elaboração de planos de recursos hídricos. Os sucessivos governos se furtaram a enfrentar os desafios mais substantivos de se aparelharem para estabelecer o controle do uso da água em todo Estado, mediante a outorga de direitos de uso de água, para implantar a cobrança pelo uso de água, como forma de financiar os investimentos previstos pelos planos de bacia, e para implantar as Agências de Região Hidrográfica, essenciais para subsidiar tecnicamente as deliberações os comitês de bacia.

Em discrepância com os tímidos avanços do gerenciamento dos recursos hídricos no Rio Grande do Sul, os problemas de conflitos de uso de água avançaram exponencialmente. E ainda foram agravados por eventos hidrológicos extremos, geralmente na forma de estiagens intensas, prenunciadas por suspeitas de mudanças climáticas, e que, se confirmadas, se constituirão em mais um agravante à inércia e timidez dos governos.

Para coroar este diagnóstico, dois eventos emblemáticos ocorreram no início de 2007, inaugurando uma nova administração no Estado: o evento de mortandade de peixes na bacia do rio dos Sinos, que mostrou o despreparo do governo no trato destas questões; e a aprovação do projeto de lei da reforma administrativa enviado pelo executivo à Assembléia Legislativa, que passa a uma secretaria extraordinária de irrigação atribuições próprias de órgão gestor de recursos hídricos, que deveria ter um caráter não setorial, para permitir a necessária imparcialidade no trato das questões de conflito de uso de água.

Em resumo, a falta de visibilidade política da área de recursos hídricos a mantém em seu estado precário ao longo de todos estes anos. Se, no passado, o Conselho Estadual de Recursos Hídricos investia em estudo de reservatórios para irrigação, desvirtuando as suas funções, hoje é atribuído a uma Secretaria Extraordinária de Irrigação funções de gerenciamento de recursos hídricos – embora as perspectivas tenham mudado, a essência dos equívocos continua a mesma.

Conclusões
O Rio Grande do Sul tem diante de si o desafio de gerenciar as suas águas, que foi agravado pelo avanço das suas apropriações setoriais, antes que o estado se preparasse para isto, pois ocorreu em época em que esta gestão ainda era novidade. Os arranjos setoriais que promovem o uso da água já estavam fortalecidos quando os conflitos de uso demandaram uma gestão eficiente, que os harmonizassem. Embora tenha havido competência para elaborar uma legislação moderna para a gestão de recursos hídricos e planos de recursos hídricos, estes nunca foram considerados relevantes por parte dos decisores políticos.. As dificuldades orçamentárias do Estado restringiram a implementação efetiva do gerenciamento de recursos hídricos preconizado por esses instrumentos, fazendo com que o Sistema Estadual de Recursos Hídricos pouco possa fazer para exercer as suas funções mediadoras e regulatórias em matéria de uso de água. Esta fragilidade permite que os setores atuem sem controle, ou com controles frágeis, agravando os conflitos de uso de água e ensejando tentativas de captura das atribuições regulatórias por setores melhor amparados por eventuais e instáveis correlações de forças políticas.

Por outro lado, confrontando com este diagnóstico um tanto pessimista - mas realista no entendimento do autor - existe um alento que advém da atuação de dois fatores que se complementam: as exigências do setor produtivo e da sociedade com relação à água em qualidade e quantidade, e a ocupação pela sociedade dos espaços que a ela foram disponibilizados pelo Sistema Estadual de Recursos Hídricos do Rio Grande do Sul.

As exigências do setor produtivo ficaram explicitadas pelo estudo apresentado pelo governo do estado no final de 2006: o Rumos 2015. Talvez mais do que em qualquer outra época, está evidenciado que a harmonização dos interesses relacionados aos recursos hídricos no RS tem um valor econômico intrínseco. A água não pode mais ser utilizada como se fosse um recurso abundante - jargão que de propostas tímidas realizadas por ONGs, cientistas, técnicos e entidades multilaterais, foi incorporado aos discursos governamentais, ganhou a mídia e se tornou uma idéia-marco presente na mente e nos corações da sociedade, e que agora se torna aceita pelo setor produtivo.

Complementando esta mudança de pensamento ocorreu a ação da sociedade na forma de ocupação dos espaços que lhe foram oferecidos pela lei, com estímulo institucional de alguns integrantes de órgãos públicos estaduais. Estes, apesar da falta de apoio e de recursos, atuando segundo uma pauta em grande parte auto-determinada, conseguiram contribuir para a formação de um capital social importante, representado pelos Comitês de Bacia Hidrográfica instalados no Estado. Este fato oferece garantias de que o sistema não será descontinuado enquanto os comitês insistirem em manter os seus funcionamentos – não garante, porém, que não venham a ser desvirtuados, por meio de suas capturas por interesses setoriais, como já ocorre em alguns.

A manutenção do funcionamento dos comitês, porém, não é garantida. A falta de um apoio técnico permanente, que possa subsidiar as deliberações dos comitês – na forma, por exemplo, das Agências de Região Hidrográfica -, e a não introdução da cobrança pelo uso da água, que geraria recursos para os investimentos necessários para as melhorias nas bacias hidrográficas, podem tornar os comitês, na melhor das hipóteses, entes reivindicatórios, similares a ONGs, sem capacidade ou intenção de assumir as reais atribuições definidas na Política Estadual de Recursos Hídricos.

O maior risco ao Sistema Estadual de Recursos Hídricos, porém, pode ser identificado na atribuição de suas principais funções gerenciais – as de planejamento – a uma secretaria vinculada ao uso setorial de água que maiores impactos causa ao ciclo hidrológico: a de irrigação. Isto estabelece um forte risco de captura da gestão de recursos hídricos pelos interesses do setor que mais usa água no estado, quando a boa gestão de recursos hídricos deve ser tão isenta e eqüidistante quanto possível dos diversos usos múltiplos da água para ter credibilidade ante os diversos interesses existentes, por parte de setores econômicos e do meio ambiente.

(* Consultor em Recursos Hídricos, AlfaSigma Consultoria Ltda, 14/05/2007)

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