Acadêmicos e técnicos do Estado acreditam que os enxames gaúchos não estão sofrendo as conseqüências da Desordem de Colapso Colonial (CCD, em inglês). O fenômeno, que começou a ser sentido na Europa há cerca de cinco anos, chegou aos Estados Unidos há alguns meses e já dizimou 25% das colméias do país. As mortandades registradas no RS são atribuídas à estiagem que afeta a região desde a safra de 2004 e ao uso desenfreado de agrotóxicos ilegais nas lavouras. Os transgênicos e as ondas eletromagnéticas emitidas pelas antenas de celular teriam uma influência menor no quadro.
Segundo o pesquisador de abelhas da Embrapa Clima Temperado, Luiz Fernando Wolff, a Desordem de Colapso Colonial está associada a uma variação da doença conhecida por nosemose. A doença é causada por um protozoário que se instala no aparelho digestivo das abelhas melíferas, provocando diarréia nos animais e se espalhando rapidamente pela colméia. É comum e antiga, inclusive no Brasil, e não provoca a morte de enxames, nem prejudica a saúde humana. Ela pode ser controlada com técnicas de manejo simples, como evitar o contato dos enxames com a água parada.
Mas, recentemente foi descoberto um tipo de nosemose típico dos enxames asiáticos, que tem se mostrado letal para as outras espécies de abelhas. Essa variação teria se espalhado pela Europa em 2005 e chegado aos EUA, no fim do ano passado. "É como se fosse uma doença de um primo, que você pega e não tem resistência. Contudo, nem os pesquisadores que descobriram a variação afirmam categoricamente que é essa a causa da mortandade, porque não detectam uma única causa. Quando se fala em colapso na natureza, é ingenuidade apontar uma só causa", observa. Wolff afirma que ainda não há registros dessa nosemose no Brasil.
Produção gáuchaO vice-presidente da Federação Apícola do RS, Silvio Lengler, diz que a entidade desconhece qualquer informação sobre perdas de enxames neste ano. "Inclusive, a expectativa dos apicultores é de que a safra de mel seja boa", afirma. Ele refuta o argumento contra os transgênicos porque os apicultores filiados à entidade que produzem mel em culturas geneticamente modificadas não registraram perdas. Lengler diz que houve quebra de produção nas safras de 2005 e 2006, especialmente na Metade Sul, porque as condições climáticas foram desfavoráveis e lembra que a falta de chuvas também afetou outras culturas na região, como a soja.
A produção agroecológica gaúcha também não percebeu mudanças nas colméias. "Está tudo normal. Porém, estamos atentos ao que está acontecendo lá fora. Está cedo para apontar uma causa, mas nos sentimos mais seguros porque nossos enxames não têm contato com transgênicos e agrotóxicos", opina Cláudia Bos Wolff, engenheira agronôma e produtora de mel da Cooperativa Coolméia.
Segundo o especialista em abelhas Andreas Kohler, professor da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC), o calor intenso e seco registrado nos últimos verões têm destruído a florada. As abelhas produzem o mel a partir do néctar das flores e o usam como alimento durante o inverno. "Os enxames acabam morrendo de fome. As mudanças climáticas também afetaram a Europa e os EUA. A floração que ocorria durante a primavera, verão e outono, só ocorreu na primavera e no outono por causa das altas temperaturas", relata.
Kohler acredita que os transgênicos e as antenas de celular podem ser fatores conjugados à morte das abelhas, mas que estão distantes de representarem o maior problema no Estado. "A abelha se orienta mais pelo sol. Ela só se guia pelas ondas magnéticas quando está muito longe do enxame, o que não é comum. O problema não leva à morte da colméia. Mas, se combinado com outros fatores, pode piorar o quadro", destaca.
Além das mudanças no clima, Lengler aponta o uso de pesticidas para matar formigas proibidos no Brasil, comprados a preços baixos no Paraguai, como responsáveis pelas mortes de enxames registradas no Estado. "Falta consciência aos agricultores. Estão esquecendo que as abelhas são responsáveis pela polinização. A atitude afeta diretamente a produção de frutos e grãos", fala.
Orientação sobre nosemoseOs apicultores preocupados com a nosemose devem entrar em contato com a Embrapa Clima Temperado (www.cpact.embrapa.br/). Os técnicos realizam o exame que pode identificar a doença. Por enquanto, o Brasil não está capacitado para identificar se a abelha sofre da nosemose comum, ou se é a variação asiática, mas a Embrapa se compromete a encaminhar os espécimes para pesquisa na Inglaterra.
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