A execução de grandes projetos nacionais e intercontinentais de infra-estrutura previstos simultaneamente no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), no Plano Plurianual (PPA) e na Iniciativa de Integração Regional Sul-Americana (IIRSA) ameaça metade da área das unidades de conservação do país. Segundo a organização não-governamental Conservação Internacional (CI-Brasil), 2,5 milhões de quilômetros quadrados serão afetados pelas obras.
Após avaliar o impacto ambiental de 13 projetos em cuja área de influência se encontram ecossistemas fundamentais para a proteção da diversidade biológica brasileira, a CI-Brasil concluiu que as obras irão causar impactos em 137 unidades de conservação, 107 terras indígenas e 484 áreas prioritárias para a conservação da biodiversidade brasileira. O bioma mais afetado será a Amazônia, onde 322 áreas entre as mais ricas em espécies amazônicas serão expostas à pressão humana sem que medidas eficazes para conter os impactos tenham sido discutidas.
“Basicamente, apresentamos uma análise para alertar o governo, os gestores das unidade e a sociedade em geral de que estes projetos irão influir no contexto geográfico. Nossa intenção é provocar planejamentos mais abrangentes, onde a sociedade participe ativamente na construção de um plano de desenvolvimento regional”, explicou o diretor de Política Ambiental da CI-Brasil, Paulo Gustavo Prado.
A ONG também alerta para a possibilidade de surgirem conflitos socioambientais na região sob influência do Complexo Hidrelétrico do Rio Madeira, na região de Santarém, no Escudo das Guianas e no Pantanal Boliviano. “Essas áreas deverão sofrer um impacto potencial maior porque ali a sociedade civil se encontra em um estágio incipiente de organização e os recursos naturais ainda estão bem conservados, já que ainda não há muita presença humana”, disse Prado, destacando ainda a precariedade da presença do Estado nesses locais e a pouca participação das comunidades nos processos decisórios.
A CI-Brasil teme que sejam feitos investimentos em infra-estrutura sem considerar fatores como a intensa migração de populações sujeitas a ficarem sem atendimento e apoio por parte do Estado, o despreparo de infra-estrutura rural e urbana de saúde, educação e saneamento, a perda de qualidade da água e o desequilíbrio de serviços ambientais.
A CI-Brasil também acrescenta à lista de problemas decorrentes destas obras a redução de recursos pesqueiros, aumento indiscriminado de esforço de coleta e caça para a sobrevivência, incremento de áreas desmatadas, prática da grilagem, violência, desemprego, prostituição e incidência de doenças contagiosas Além de apontar que falta aos responsáveis pelas ações considerar o possível impacto ambiental à região, e não apenas localmente, a CI-Brasil diz que faltam estudos e medidas mitigadoras mais amplas.
“Os projetos de infra-estrutura são a primeira entrada para uma ação humana que começa a descaracterizar a sociedade e o meio ambiente”, falou Pereira. “A partir da construção de uma estrada, por exemplo, ocorre a movimentação da população, que tem de se estabelecer e passa a pressionar a região por mais infra-estrutura urbana, como saúde, educação. Começa todo um sistema de agricultura e pecuária que acaba transformando a paisagem”.
Pereira destaca que nem a CI-Brasil, nem o estudo são contrários ao desenvolvimento ou aos projetos. “O que o trabalho recomenda é que isso seja feito de uma maneira responsável e com qualidade para trazer desenvolvimento real e não apenas um crescimento que exponha essas áreas e, mais uma vez, aumente o contingente de populações desprivilegiadas”.
O estudo traz uma série de recomendações a fim de evitar os impactos ao meio ambiente, como a adoção de medidas de regularização fundiária, o fortalecimento das estruturas e dos serviços urbanos nas áreas sob influência dos empreendimentos, o incentivo à atividades não predatórias e o cálculo das emissões de gases do efeito estufa causados pelas obras.
Apesar disso, segundo Pereira, o objetivo maior do trabalho é servir de alerta. “Que os governos federal, estadual e municipais saibam que isso vai acontecer e, a partir daí, comecem a negociar. Que as populações, uma vez cientes do fato, reivindiquem o desenvolvimento que desejam e que os gestores das unidades de conservação estejam conscientes e tentem incluir a sustentabilidade dessas áreas dentro dos projetos”.
A Conservação Internacional atua em 40 países e tem suas ações voltadas para a conservação do patrimônio natural do planeta. A reportagem entrou em contato com o Ministério do Meio Ambiente assim que o relatório foi publicado, na semana passada, mas a assessoria informou que o órgão ainda não havia recebido o documento. Na última sexta-feira (11/05), a reportagem tentou ouvir o ministério novamente sobre o assunto, mas não recebeu retorno.
(Por Alex Rodrigues e João Porto,
Agência Brasil, 13/05/2007)