O fenômeno da maré vermelha, que atingiu São Francisco do Conde, Santo Amaro, Saubara e Salinas da Margarida, além das ilhas dos Frades e de Bom Jesus dos Pobres, pode ter sido causado pela abertura das comportas da barragem de Pedra do Cavalo em fevereiro último. A hipótese é do professor do Instituto de Biologia da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e gerente de projetos da Fundação Ondazul, Ronan R.C. de Brito.
Segundo a suposição, os sedimentos do fundo da Barragem, que contém micronutrientes, teriam sido despejados na Baía de Todos os Santos, servindo de alimento natural para as algas, que proliferaram. Ainda de acordo com o especialista, as condições encontradas – maré calma, sol forte e temperaturas elevadas – teriam contribuído para o fenômeno.
A hipótese foi revelada ontem pela professora titular do Instituto de Química da Ufba, Tânia Tavares, que participou dos estudos, durante uma vistoria realizada no município de Salinas da Margarida, a 69km de Salvador, via ferry-boat. A iniciativa da Comissão de Saúde e Saneamento da Assembléia Legislativa, liderada pelo deputado estadual Javier Alfaya, teve como objetivo fomentar as discussões sobre as causas da contaminação da Baía de Todos os Santos. Na primeira das três visitas planejadas – as próximas serão nos municípios de Cabuçu e Bom Jesus dos Pobres, no distrito de Saubara –, participaram representantes da Secretaria de Recursos Hídricos, Escola de Nutrição da Ufba, Centro de Recursos Ambientais (CRA), ONGs Gambá e Germen, dentre outros.
O prefeito do município, Francisco José Pereira de Santana, aproveitou o ensejo para pedir maior ajuda aos governos estadual e federal. “A situação está muito pior do que parece.
Atingiu os pescadores, as marisqueiras, o comércio e o turismo”, enfatizou. Desde a início da tragédia, na primeira semana de março, pescadores e marisqueiras aguardam ansiosamente pelo Seguro-Defeso (Especial) cuja primeira parcela chegará dois meses após o pleito, no valor de um salário mínimo. Ela será paga no próximo dia 15. A outra chegará às famílias contempladas no dia 15 de junho.
A prefeitura explica, no entanto, que apenas 10% dos quatro mil filiados a associações do município terão direito ao benefício, segundo critérios da Secretaria Especial de Agricultura e Pesca (Seap), que exige pelo menos um ano de filiação à entidade. O percentual contemplado inclui ainda, segundo denúncias dos pescadores, pessoas que não exercem a atividade pesqueira e de mariscagem. “São pessoas que conseguem se cadastrar na Colônia Z-13 de Pescadores e Marisqueiras e pagam R$6 por mês para não pagaram o INSS”, acusou o presidente da Associação de Pescadores e Aquicultores de Salinas da Margarida, Josué de Jesus Santos.
A denúncia será alvo de investigação da Promotoria de Nazaré das Farinhas, que vai instaurar um inquérito para a apuração. “Estamos colhendo os dados e vamos apurar essas irregularidades. Se forem constatadas, teremos que fazer um recadastramento da Colônia”, explicou a promotora de Justiça da comarca de Nazaré, Telma Leal de Oliveira. Ainda segundo a promotora, os pescadores estão incrédulos quanto à origem da maré vermelha. “Eles ainda acreditam que ela tenha sido causada por contaminação química”, acrescentou.
Josué de Jesus Santos explica: “Na verdade, nós não deixamos de acreditar na maré vermelha, mas questionamos o que teria causado o fenômeno”. Na próxima segunda-feira, haverá reunião no Ministério Público do Estado (MPE/BA), em Nazaré, envolvendo materiais coletados pelos promotores que atuam nos municípios atingidos.
FomeDesde que foi decretado estado de emergência no município, no início de março (o prazo vence no próximo dia 22), foram distribuídas 2.900 cestas básicas pelo governo do estado. Também foram encaminhados peixes, cuja quantidade a prefeitura não soube estimar, durante a Semana Santa. A qualidade das cestas, no entanto, é questionada. “Não tem carne, nem frango, nem peixe. Só feijão, macarrão, arroz e pouco leite para as crianças. Também não tem frutas nem verduras”, descreve o prefeito.
A professora da Escola de Nutrição da Ufba e integrante do Conselho Estadual de Saúde, Teresa Deiró, explica que quem mais sofre com a deficiência alimentar são gestantes, idosos, crianças e mulheres que estão amamentando. “Nós utilizamos esses depoimentos como instrumento de denúncia a ser encaminhado ao secretário de Saúde, Jorge Solla”, pontua. Ainda segundo a especialista, o governo conta com projetos que contemplam vigilância alimentar e nutricional e podem incluir o município de Salinas. O Mais Saúde Bahia é um desses projetos.
“A idéia é reunir esforços para que o governo envie técnicos ao local e busquem parcerias com a universidade para um diagnóstico da situação alimentar e nutricional”, emendou. Tereza Deiró disse ainda que, na próxima reunião do Conselho de Saúde, ela poderá pleitear o programa para Salinas.
Turismo em baixaMaré vermelha implica praias vazias, restaurantes sem clientes e hotéis e pousadas sem hóspedes. Salinas da Margarida está em baixa com o turismo. “Os hotéis estão desempregando todo mundo”, ressaltou o prefeito, referindo-se às oito pousadas e ao único hotel da cidade, que estão vazios.
“As pessoas acham que não podem tomar banho, nem comer peixe”, emendou o secretário de turismo, esporte e cultura, Adilson de Oliveira Pinto. A esperança para a retomada da atividade no município reside no final do prazo de suspensão de pesca nas áreas atingidas, com data marcada para o próximo dia 29. Por enquanto, o CRA realiza monitoramentos para verificar se existe possibilidade de novas marés vermelhas.
(Por Carmen Azevêdo,
Correio da Bahia, 11/05/2007)