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ipcc
2007-05-06
Pela primeira vez, o IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas) reconheceu que fatores meramente culturais têm um impacto imenso no clima. Ações individuais que não trazem prejuízo e podem até fazer bem - como andar a pé - podem dar grande contribuição para superar a crise do clima. Por que não, também, trocar o carro pelo metrô?

Ao apresentar anteontem (4/5) em Bancoc, na Tailândia, o novo relatório do IPCC sobre o combate às emissões de gases do efeito estufa, Rajendra Pachauri, presidente do painel, destacou a importância da dimensão cultural. "A humanidade precisa olhar para seu estilo de vida e seus padrões de consumo." Ele citou o exemplo do ex-presidente americano Jimmy Carter, que decidiu abaixar o termostato de sua casa no inverno e usar cardigãs nos anos 1970.

O ex-premiê japonês Junichiro Koizumi, quando estava no poder, também aboliu o uso de gravata nas repartições públicas, para dispensar o "energético" ar-condicionado.

"Todo mundo aqui pode usar cardigã sem sacrificar seu conforto", concluiu Pachauri.

Para o coordenador do Grupo de Trabalho 3 do IPCC, o engenheiro Ogunlade Davidson, professor da Universidade de Serra Leoa, na África, alterar hábitos no dia-a-dia "não é um sacrifício, é só uma mudança".

Para ele, é perfeitamente possível ter um bom estilo de vida sem contribuir muito para a emissão de gases que agravam o efeito estufa.

O IPCC também mostra que, de longe, o maior potencial de mitigação está em construções comerciais e residenciais. Bons resultados de eficiência energética, por exemplo, podem ser obtidos com a troca de lâmpadas incandescentes por lâmpadas fluorescentes.

A mudança no design de prédios, para aproveitar melhor a luz solar (nos países frios) ou dispensar o uso de ar-condicionado (nos quentes), é um outro caminho que deve ser seguido, segundo o painel da ONU.

Resolver os problemas de casas e prédios, porém, de nada adianta se não houver mudança na geração de energia. O uso de biocombustíveis no setor de transportes e a redução do desmatamento, duas coisas que o Brasil já vem fazendo, também são elencadas pelo IPCC como contribuições importantes. Apesar de reclamações de alguns países, a energia nuclear aparece, pela primeira vez em um relatório do IPCC, como uma opção de mitigação. O problema dela, dizem os críticos, é o lixo tóxico que é gerado.

Sem panacéia
"Seria ingênuo acreditar que tecnologias recém-desenvolvidas em laboratórios são parte da solução", disse Rajendra Pachauri, numa crítica velada aos EUA - que alegam que seus investimentos em pesquisas tecnológicas são a melhor arma contra o aquecimento.

"Tecnologias precisam fazer parte de um pacote de políticas públicas", disse.

Pachauri, durante a apresentação do relatório sobre mitigação do aquecimento global também não perdeu a oportunidade de dar um recado pessoal, como ele fez questão de frisar aos presentes.

"Se as pessoas comessem menos carne, provavelmente ficariam mais sadias e, ao mesmo tempo, contribuiriam para reduzir as emissões geradas pela criação do gado", afirmou.

Segundo o presidente do IPCC, produzir carne, transportá-la, conservá-la em frigoríficos e depois fazer a distribuição contribui com o aquecimento global. Estimativas mostram que um quilo de carne na casa do consumidor corresponde a 3,7 quilos de carbono emitido.

Mas não é agora que os vegetarianos vão se tornar, da noite para o dia, os paladinos do clima. O próprio IPCC aponta o metano que emana das plantações de arroz, por exemplo, como uma das maiores fontes de emissões da agropecuária.

Comparativamente, o motorista que usa seu carro 1.0, com motor a gasolina, durante 50 km por dia durante um ano, vai emitir quase 3.000 quilos de carbono, o equivalente a mais ou menos à quantidade de 800 quilos de carne bovina.
(Por Cláudio Angelo, Folha de São Paulo, 06/05/2007)

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