Em um dia marcado por informações desencontradas, aliados da governadora Yeda Crusius movimentaram ontem (2/5) o Palácio Piratini e aguardaram em vão a confirmação da demissão da secretária do Meio Ambiente, Vera Callegaro.
Às 18h50min, coube ao secretário de Comunicação, Paulo Fona, dar a versão oficial do governo. Fona era o único porta-voz do governo sobre o assunto. O próprio chefe da Casa Civil, Fernando Záchia, não estava autorizado a se manifestar, conforme sua assessoria. Questionado se estava descartada a substituição da titular do Meio Ambiente, Fona respondeu:
- Hoje (ontem), não tem nenhuma informação. Não há nada previsto para amanhã (hoje). A secretária continua trabalhando normalmente.
O Piratini havia oferecido a pasta do Meio Ambiente ao procurador de Justiça criminal Carlos Otaviano Brenner de Moraes. À tarde, pelo menos um aliado identificou sinais de recuo na decisão. Fona negou que a governadora tenha feito o convite.
Yeda cancelou compromissos externos ao longo do dia. Pela manhã, desistiu de ir a um evento em Encruzilhada do Sul em razão da chuva. Um aliado garantiu que a governadora conversou pessoalmente com a secretária pela manhã, mas não mencionou o assunto, o que gerou expectativas de que permanecesse no cargo. A assessoria da secretária sustenta que não houve conversa nem por telefone. Ao meio-dia, Vera participou de uma reunião da Câmara Setorial de Irrigação e Usos Múltiplos da Água na ala residencial do Piratini. Evitou a imprensa. Yeda não compareceu. À tarde, a governadora desistiu de ir à posse dos 22 novos procuradores nomeados pelo Estado.
- A governadora está trabalhando. Fazendo estudos não só na área ambiental, mas analisando trabalhos sobre o Banrisul, feiras, entre outros - justificou Fona.
Segundo interlocutores, Yeda foi aconselhada a demitir rapidamente a secretária para evitar desgaste ao governo. Mas o clima era de indefinição. Um interlocutor de Záchia disse que Yeda estava "pensando":
- Se tu convidas alguém para o lugar, é sinal de que decisão de demitir já foi tomada.
Otaviano não atendeu ao telefone durante o dia ontem. Às 20h, ainda aguardava um chamado do Piratini. Procurado por Zero Hora, disse apenas três frases:
- Estou aguardando. Não me reuni com o Záchia hoje (ontem). A secretária continua, né?
Entenda o caso
> A crise na Secretaria do Meio Ambiente do Estado estourou depois que o presidente da Fepam, Irineu Schneider, assinou um aditamento a um termo de ajustamento de conduta do Ministério Público Estadual no dia 19 de abril.
> Na prática, o acordo leva em conta o novo zoneamento ambiental, ainda não aprovado, para conceder licenças ambientais e torna mais rígidas as regras para o plantio de eucaliptos. A medida desagradou ao setor. Florestadoras ameaçam abandonar investimentos no Estado.
> Interlocutores da governadora Yeda dizem que ela não foi consultada e não gostou de ter sido surpreendida pela decisão. Um emissário da governadora convidou o procurador de Justiça Carlos Otaviano Brenner de Moraes para o cargo.
> O procurador iria comunicar ontem ao chefe da Casa Civil que aceitaria o convite. Até as 20h de ontem, não tinha conversado com o chefe da Casa Civil, Fernando Záchia. A governadora Yeda repensava a demissão da secretária do Meio Ambiente, Vera Callegaro.
Tire suas dúvidas
- O que é termo de ajustamento de conduta?
É um documento de compromisso, responsabilidade e ajustamento celebrado entre um ente público ou privado e o Ministério Público quando há violação de algum direito da sociedade. O objetivo é realinhar a conduta desse ente para prevenir ou reparar danos à comunidade. No caso da silvicultura, eventuais impactos provocados ao ambiente.
- Para que serve o zoneamento ambiental?
Assim como o plano diretor é um instrumento que normatiza a ocupação urbana de uma cidade, o zoneamento ambiental é um estudo que procura definir regras para o uso do ambiente de acordo com as características de cada região do Estado (por isso chamado zoneamento) e suas vulnerabilidades. Áreas com déficit de água ou com banhado, por exemplo, mais sensíveis a impactos ambientais, sofrem restrições maiores ao plantio.
- Por que as empresas consideram restritivos os critérios para plantio?
A associação das empresas florestais afirma que, em determinadas regiões, a legislação anterior regida pelos códigos florestais estadual e nacional permitia que aproximadamente 60% de uma área fosse destinada ao plantio florestal, por exemplo, enquanto o zoneamento ambiental fixou o limite máximo em 50%. Em determinadas zonas mais sensíveis a impactos ambientais, esse percentual pode cair abaixo de 5%.
- Por que as empresas não plantam em áreas com critérios menos restritivos?
Conforme a Associação Gaúcha de Empresas Florestais, as limitações de plantio inviabilizam negócios em áreas onde tradicionalmente sempre houve plantações e reduzem a possibilidade de exploração de forma generalizada, em um nível que compromete a viabilidade econômica dos empreendimentos. Técnicos da Fepam, por sua vez, argumentam que grandes empresas compraram áreas antes da conclusão do zoneamento, em regiões onde o preço era mais baixo mas onde o plantio foi posteriormente limitado pelo estudo, e não querem perder o investimento.
- O que ocorre com as árvores já plantadas em locais que o zoneamento ambiental apontou como impróprias?
Conforme a Fepam, será negociado um tratamento especial para estes casos, para que não exista prejuízo às empresas. Uma possibilidade, por exemplo, é permitir a continuidade da plantação até o término do ciclo de sete anos para o aproveitamento industrial das árvores, quando então a área passaria a sofrer na prática as restrições impostas pelo zoneamento.
- As papeleiras já haviam começado a plantar eucalipto mesmo sem autorização da Fepam? Por quê?
Não há notícia de plantio ilegal. Durante o ano passado, enquanto o estudo para o zoneamento ambiental era concluído, a Fepam emitiu autorizações especiais baseadas em um relatório ambiental que já impunha algumas restrições, e em acordo com o Ministério Público. Foi uma medida transitória para viabilizar o início da plantação e garantir o fornecimento futuro de matéria-prima enquanto o zoneamento não ficava pronto.
- Os critérios de outros Estados são mais permissivos?
Segundo a promotora de Justiça de Defesa do Meio Ambiente do Ministério Público Estadual Ana Maria Moreira Marchesan, o Rio Grande do Sul tomou a dianteira em regrar a atividade de silvicultura por meio do zoneamento ambiental em relação ao resto do país. Segundo ela, em outros Estados, como Bahia e Espírito Santo, até mesmo áreas de Mata Atlântica foram derrubadas para o plantio de eucalipto.
- Por que o zoneamento ambiental trata de maneira diferente as regiões do Estado?
Porque cada região do Estado tem características ambientais diferenciadas e sofreria diferentes níveis de impacto pelo plantio florestal. Critérios como recursos hídricos disponíveis, fauna e flora ameaçadas, presença de banhados, entre outros, alteram o grau de vulnerabilidade ambiental definido pelo zoneamento e, conseqüentemente, seu potencial de uso para silvicultura.
- Qual o impacto ambiental produzido por plantações de eucalipto?
Há um debate entre defensores e inimigos do plantio da árvore em larga escala. Os temores de ecologistas incluem o consumo de água do eucalipto, que pode diminuir os recursos hídricos disponíveis, e o desaparecimento de espécies nativas devido à monocultura exótica. Os defensores afirmam que o consumo de água da floresta plantada não difere muito da floresta natural e lembram que o impacto econômico positivo nas comunidades é um fator que precisa ser considerado.
(Por Marciele Brum, Zero Hora, 03/05/2007)