Na véspera de completar cinco meses de intervenção judicial, a União dos Trabalhadores em Resíduos Especiais e Saneamento Ambiental (Utresa) está sendo apontada como negligente pelo Ministério Público e Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam). Depois da terceira suspeita de sabotagem no local, ocorrida na segunda-feira (23/4), Fepam e promotores de Estância Velha e Portão reuniram-se ontem e dizem que exigirão a realização das obras solicitadas no local. Durante a reunião, na Promotoria estanciense, representantes da Fepam, acompanhados do advogado do órgão, Paulo Régis, solicitaram aos promotores que peçam ao juiz Nilton Filomena um levantamento financeiro da Utresa e também relatório sobre a empresa. A previsão é que sejam necessários R$ 15 milhões para remediar irregularidades na empresa.

Um dos diretores da Utresa, Fernando Couto, não retornou recados da reportagem do Jornal NH para falar sobre o assunto. Não é descartado o pedido de interdição da empresa, que recebe entre 300 a 450 metros cúbicos de lixo industrial por dia de 600
empresas. Ontem pela manhã, em São Leopoldo, a coloração da água do Arroio Kruze mudou e peixes de várias espécies agonizaram até morrer. O episódio assustou moradores do Beco do Deco, no bairro Santo André.

Segue na Justiça o processo no qual a Utresa e seu ex-responsável-técnico, Luiz Ruppenthal, são apontados como principais responsáveis pela morte de 85 toneladas de peixes no Rio dos Sinos, em outubro do ano passado. ‘‘A situação é crítica e eles estão brincando com o assunto, que é sério’’, declarou o promotor estanciense, Paulo Eduardo de Almeida Vieira, que diz estar indignado com a morosidade da direção da Utresa para atender às solicitações feitas pelos interventores, que atuam desde 28 de novembro.

‘‘São medidas que garantem o funcionamento sem riscos ambientais. Se não são cumpridas e continuarem os riscos, pediremos o fechamento’’, avisa Almeida Vieira. Ele e o promotor de Portão, Marcelo Tubino Vieira, dizem estar preocupados com a situação, já que a Utresa é a única central de resíduos com estrutura para receber os diversos tipos de lixo industrial da região (e uma das poucas do Estado). ‘‘Se for fechada, haverá o problema de destinação do lixo, mas ao mesmo tempo não podemos aceitar essa situação’’, diz Almeida Vieira.

Valas perfuradas são esvaziadas
Apenas na tarde de ontem a direção da empresa autorizou a entrada da reportagem do Jornal NH, no local onde ocorreu a suposta sabotagem na madrugada de segunda-feira. Um dos responsáveistécnicos, Alexandre Wasen, explica que as duas bacias de acumulação perfuradas estão sendo esvaziadas e o chorume encaminhado para outras valas. ‘‘Foi um ato criminoso e estamos tomando medidas determinadas pela Polícia, como manter em sigilo informações para não prejudicar as investigações’’, argumenta Wasen.

Prazo venceu esta semana
A estimativa é de que seja preciso investir R$ 15 milhões em melhorias na Utresa. ‘‘Por outro lado, eles disseram que vão determinar a suspensão da vala 11, que recebe os lodos, e que representam 60% do faturamento da Utresa, o que é contraditório’’, apontou o promotor de Portão. A Fepam alega que esta semana venceu o prazo de construção de cobertura
da vala.

Na ata da reunião de ontem, os promotores registraram que ‘‘não se deve ter um excesso de rigor nas cobranças agora, após uma negligência na fiscalização por mais de 20 anos’’. Após o encontro, o advogado da Fepam, Paulo Régis, disse apenas que ‘‘foi uma reunião técnica e preferimos não comentar. Os promotores darão as informações’’. Conforme a assessoria da Fepam, será realizada hoje uma reunião na sede, em Porto Alegre, onde a direção técnica irá definir o que fará em relação à Utresa e também que medida será tomada sobre a destinação dos lodos das empresas, que, com a interdição da vala 11, não serão mais recebidos na Utresa. ‘‘Após o levantamento financeiro, se for entendido que a empresa não tem condições de arcar com as despesas previstas para as melhorias, então veremos o que será feito’’, diz Vieira.

Entenda o caso
A Utresa recebe diariamente entre 300 e 450 metros cúbicos de lixo industrial de quatro tipos: lodos (150 mil litros por dia); tiras e retalhos de couro; resíduos do setor metal-mecânico, resíduos do setor têxtil (são entre 50 a 100 metros cúbicos por dia, de cada um desses tipos). O lixo vem de aproximadamente 600 empresas usuárias (das 3,5 mil cadastradas).

Durante reunião de ontem no Ministério Público de Estância Velha, representantes da Fepam solicitaram aos promotores que encaminhem ao juiz pedido de levantamento da situação financeira da Utresa, para apurar se ela tem condições de arcar com todas as obras de remediação necessárias.

A previsão é de que sejam necessários em torno de R$ 15 milhões para remediar os danos dentro da Utresa. Para as obras emergenciais, seriam necessários mais de R$ 1,5 milhão: construção da ETE, conclusão da vala 10, cobertura da vala 11, construção de nova bacia de acumulação, retirada de parte do material da vala sete e fechamento desta vala.

Hoje, em torno de 23 milhões de litros de chorume (líquido tóxico) estão acondicionados em bacias de acumulação da Utresa, aguardando encaminhamento para o tratamento.

A conclusão da Estação de Tratamento de Efluentes (ETE) que está sendo construída na Utresa depende de verba. O custo total da obra é de aproximadamente R$ 400 mil.

A Fepam irá exigir o cumprimento dos prazos para as obras necessárias e também suspender a atividade na vala 11, que desde o dia 5 de abril está recebendo os lodos.Alega que a Utresa não cumpriu o prazo de conclusão do telhado, que venceu esta semana. O recebimento de lodos gera em torno de 60% da renda da empresa.

Hoje pela manhã ocorrerá reunião na Fepam, onde a direção técnica definirá que medidas serão tomadas em relação à Utresa e também sobre a demanda das empresas, que precisam de local para armazenar seu lodo. A Utresa é a única central de resíduos com capacidade para receber esses quatro tipos de resíduos da região e uma das principais do Estado.

Os interventores da Utresa, nomeados pela Justiça, solicitaram que a direção da empresa construa um muro, com cerca elétrica, ao redor das bacias de contenção que foram perfuradas, na madrugada de segunda-feira. Uma guarita com segurança 24 horas também foi pedida. A direção disse que irá providenciar.

Os promotores de Portão e Estância Velha irão encaminhar até amanhã, ao juiz Nilton Filomena, documento com um relatório da situação, para que seja acrescentado aos autos do processo. Nele, solicitarão que o juiz determine aos gestores que autuem cada descumprimento de medidas pedidas pelos gestores – é previsto no processo a multa de R$ 1,5 mil por dia por descumprimento.
(Jornal NH, 26/04/2007)