Derrubar a floresta amazônica para plantar soja é mais prejudicial ao clima do que desmatar para criação de gado. Essa é a principal conclusão de um estudo realizado por equipe da Universidade Federal de Viçosa (UFV) publicado na edição atual da revista Geophysical Research Letters.
A literatura científica aponta que qualquer desmatamento na Amazônia contribui para mudanças climáticas ao provocar redução na precipitação. Mas, de acordo com a nova pesquisa, os campos de soja reduzem as chuvas em até quatro vezes mais do que as pastagens.
Sob coordenação de Marcos Heil Costa, professor do Departamento de Engenharia Agrícola do Centro de Ciências Agrárias da UFV, os pesquisadores registraram as mudanças na refletividade de campos experimentais de soja e aplicaram os dados em um modelo climático. “Havia muitos estudos sobre os efeitos climáticos da substituição de florestas por pastagens. Assumia-se, no entanto, que não haveria diferença se a floresta desse lugar a outras atividades. Para testar a hipótese, comparamos tais resultados com as parametrizações que obtivemos com um estudo experimental em uma lavoura de soja”, disse Costa à Agência FAPESP.
Os pesquisadores utilizaram, para as parametrizações, uma plantação de soja de alguns milhares de hectares na região de Paragominas (PA). Numa simulação em que três quartos da área de floresta foram substituídos por soja, a redução de chuvas chegou a 15,7%. Quando a área foi substituída, no modelo, por pastagens, a queda de precipitação foi de 3,9%.
“Atribuímos essa grande diferença à maior refletividade da plantação de soja, que absorve menos radiação solar do que o pasto ou a floresta, esquentando menos a superfície. Isso diminui as precipitações, pois as chuvas na região são primordialmente convectivas – ou seja, dependem do aquecimento da superfície para formação de nuvens”, explicou Costa.
Expansão da sojaSegundo o pesquisador da UFV, o estudo indica a necessidade de mais estudos sobre os efeitos microclimáticos das diferentes culturas na região. “Precisamos também saber como essas culturas estão se distribuindo espacialmente para podermos avaliar a influência climática na Amazônia de forma mais ampla”, disse.
Na próxima fase da pesquisa, a equipe pretende trabalhar com parâmetros mais realistas de desmatamento. “Estamos montando um banco de dados da distribuição espacial das culturas. Queremos fazer uma revisão dos dados na área do arco do desmatamento”, disse Costa, referindo-se à faixa que vai do sul do Maranhão até Rondônia, concentrando os desflorestamentos da região.
De acordo com o cientista, nas duas últimas décadas a floresta amazônica tem sido desmatada principalmente para dar lugar a pastagens. No entanto, nos últimos anos, a cultura da soja tem avançado sobre as áreas de pastagens.
“O que constatamos é que, hoje, a soja ocupa 15% das áreas agrícolas na Amazônia. O resto corresponde, na maior parte, a pastagens. Mas, de 2000 a 2005, a soja cresceu 17% ao ano. Achamos que ela poderá avançar até chegar a um terço da área agrícola”, apontou.
Costa destaca que as culturas agrícolas absorvem quase integralmente a parte visível da luz solar, que interessa às plantas por ser fotossinteticamente ativa. Mas outro componente da luz – o infravermelho próximo – é quase absolutamente refletido. “Isso é possivelmente conseqüência da própria seleção genética a que submetemos as plantações. Aplicado em grande escala, o fenômeno pode ter efeitos climáticos imensos”, disse Costa.
O artigo Climate change in Amazonia caused by soybean cropland expansion, as compared to caused by pastureland expansion, de Marcos Heil Costa e outros, pode ser lido por assinantes da Geophysical Research Letters em www.agu.org/journals/gl.
(Por Fábio de Castro,
Angência Fapesp, 24/04/2007)