A Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler (Fepam/RS) recolheu da biblioteca os relatórios de impacto ambiental (RIMAs) das barragens nos arroios Jaguari e Taquarembó, na bacia do rio Santa Maria. Segundo a assessoria de comunicação do órgão ambiental, os estudos precisavam de informações complementares. A liberação para consulta pública dos estudos, por pelo menos 45 dias, é etapa obrigatória no processo de licenciamento, prevista em
legislação estadual e
federal.
As duas obras são prioridade para a Secretaria de Irrigação e Usos Múltiplos da Água. Na quinta-feira (26/4), o ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, assina um convênio com a governadora Yeda Crusius para a construção das barragens. Contudo, de acordo com informações do site da Fepam (www.fepam.rs.gov.br), os dois processos de licenciamento ainda estariam em análise. Estão previstos R$ 88 milhões da União dentro do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), com uma contrapartida de R$ 15 milhões do Estado e mais R$ 20 milhões da iniciativa privada.
Antônio Eduardo Lanna, consultor na área de recursos hídricos de projetos do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e da Organização dos Estados Americanos (OEA), foi quem descobriu o sumiço dos RIMAs. Ele, que foi professor por mais de 30 anos do Instituto de Pesquisa Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), é casado com a proprietária de uma fazenda de pecuária de corte que será atingida pela barragem no arroio Jaguari. As terras ficam entre os municípios de Lavras do Sul e São Gabriel, na Metade Sul do Estado.
"Ainda não disseram para a comunidade quem será afetado, como serão as obras, quando começam, etc. Eles estão ansiosos porque sabem apenas que equipes de topografia estiveram piqueteando sobre a área a ser inundada. Resolvi assumir este papel e acompanhar o processo", afirma Lanna. Ele diz que correm boatos de que o Estado pagaria até em R$ 3.500 por hectare, o que seria um preço bom, na sua opinião. Contudo, o consultor não acredita que o governo tenha condições de pagar o total de R$10 milhões só pela desapropriação.
A polêmica dos RIMASEm 20 de março, o Diário Oficial do Estado anunciou que o RIMA de Jaguari estava disponível para consultas na biblioteca da Fepam. No dia seguinte, foi a vez da obra no arroio Taquarembó. Causou estranheza o fato de as duas informações estarem no espaço da Secretaria de Obras Públicas e Saneamento, e não no da Secretaria Estadual de Meio Ambiente. Fontes não autorizadas a falar disseram que os anúncios entraram a pedido da Secretaria Extraordinária de Irrigação e Usos Múltiplos da Água.
A reportagem do Ambiente JÁ entrou em contato com a assessoria de comunicação naquela semana. A Fepam informou que desconhecia as notícias publicadas no Diário Oficial e que os estudos sobre as obras estavam no início.
No dia 26 de março, Lanna foi à biblioteca consultar os trabalhos. Pediu para tirar xerox dos documentos fora do prédio, mas teve sua solicitação negada. Foi proibido de sair dali com os RIMAs. Precavido, trouxe uma câmara digital e fotografou cada página. Leu os estudos e elaborou um comentário sobre a construção no Jaguari endereçado à diretora-técnica da Fepam, Maria Elisa dos Santos Rosa.
Nele diz que o documento impossibilita qualquer análise porque faltam todas as ilustrações, não é mencionado como foi realizado o levantamento topográfico e o estudo hidrológico não apresenta base para ser analisado. Além disso, segundo o consultor, não houve levantamento da qualidade da água, flora ou fauna, e o capítulo que trata sobre as medidas compensatórias e de monitoramento foi omitido.
"O RIMA foi elaborado pela consultora Beck de Souza Engenharia Ltda. Não consta a data de sua elaboração. Entretanto, existe um Estudo Prévio de Impacto Ambiental desse empreendimento elaborado pela mesma consultora em 2001. Chama a atenção que um estudo realizado há mais de cinco anos sirva como referência para o Relatório de Impacto Ambiental, que deveria ser o mais atualizado possível", opina Lanna. Para ele, o estudo sobre a obra no arroio Taquarembó estaria melhor, mas também teria problemas.
A assessoria de comunicação da Fepam informa que os RIMAs foram retirados da biblioteca no início de abril, uma ou duas semanas depois da publicação no Diário Oficial do Estado. Em 19 de abril, a reportagem do Ambiente JÁ foi à Fepam para consultar os estudos e soube por meio da bibliotecária que deveria contatar a diretoria técnica para esclarecimentos.
Ontem (23/4), o órgão ambiental falou que não há previsão de retorno dos relatórios para a biblioteca. Também disse desconhecer se a sociedade terá os 45 dias para análise dos documentos.
Comitê favorece integrantesLanna acusa o comitê de bacia do rio Santa Maria de ser controlado por interesses particulares. Embora existam áreas altamente suscetíveis à erosão e o saneamento básico seja incipiente, a construção dessas barragens é a bandeira da atual direção do comitê.
"Ele é formado por grandes arrozeiros, com poder político. Todos sabem que o arroz não paga essas barragens. Os beneficiados têm uma situação econômica bem acima da média, não precisam de subsídios. Gostaria que os estudos fossem feitos de forma integrada, analisando a bacia como um todo. Se aprofundassem os estudos, encontrariam muitos problemas", declara.
(Por Ana Luiza Leal, Ambiente JÁ, 24/04/2007)