A recente inauguração de uma nova represa no sul do Irã foi o estopim para uma série de protestos em todo o país pelos danos que a obra pode causar em importantes sítios arqueológicos - incluindo a cidade de Persépolis, considerada o coração da antiga Pérsia.
Intelectuais, arqueólogos e escritores fizeram fortes críticas à construção e consideraram uma "estupidez" a abertura do dique de Sivand, no vale de Darre Bolaghi, ocorrida na quinta-feira (19/04), por ordens do presidente do país, Mahmoud Ahmadinejad. A data da inauguração havia sido atrasada por vários meses em razão dos protestos no Irã e por um pedido da Organização da ONU para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Segundo estudiosos, a represa pode danificar sítios como Persépolis e Pasárgada, e até o túmulo de Ciro "o Grande", todos situados a poucos quilômetros da obra e que fazem parte do Patrimônio da Humanidade.
Nos últimos meses, um grupo de arqueólogos estrangeiros realizou escavações na região, descobrindo uma antiga estrada real e os restos de uma pequena cidade. Ambos remontam aos tempos da dinastia aquemênida, do século 6 antes de Cristo. A descoberta aumentou os protestos. No sábado, centenas de pessoas fizeram uma manifestação em frente à sede do Organismo da Herança Cultural do Irã, em Teerã, e exigiram a demissão do diretor da entidade, Rahim Mashahi.
A concentração foi convocada pelo chamado Comitê Estudantil para Defender Pasárgada. No entanto, não foram só os estudantes, vindos de várias cidades, que participaram da manifestação: intelectuais e arqueólogos também levaram a público suas queixas através da internet e de mensagens via celular. "A represa de Sivand é um dique contra a cultura", "Por que o Irã é conhecido por seu petróleo e não por sua história, como o Egito e a Índia?" e "A herança cultural do Irã é a herança cultural da humanidade" eram algumas das frases de repulsa lidas nos cartazes dos manifestantes.
Pasárgada, declarada Patrimônio da Humanidade pela Unesco em 2004, está situada no sul da agora República Islâmica do Irã, na província de Fars, e era a capital do império persa aquemênida, fundado por Ciro, o Grande (575-530 a.C)
O rei persa, que conquistou a Babilônia em 539 a.C e libertou os judeus da escravidão na cidade, é o autor de uma declaração em prol dos direitos humanos, inscrita numa peça cilíndrica de argila. Ao contrário do que era comum aos reis de seu tempo, Ciro disse que havia entrado na Babilônia com a paz e respeitava os povos, suas crenças e seus costumes. "O projeto de Sivand destrói as esperanças de construir uma boa indústria do turismo nessa região", disse à Efe Nasrin, uma jovem de 22 anos que estuda Engenharia Industrial.
Já Bahman, estudante de arqueologia de 21 anos, considerou que a represa "danificará, além disso, o meio ambiente da região, onde existem árvores que, em alguns casos, têm até 500 anos de idade". O regime islâmico de Teerã não tem apreço pela história pré-islâmica do Irã e classifica de "tempos da tirania" os 2.500 anos da história real, cujo último monarca, Shah Mohamad Reza Pahlevi, foi derrubado pela Revolução Islâmica de 1979.
O diretor da organização da Herança Cultural do Irã reiterou que o dique de Sivand não representa nenhuma ameaça para Pasárgada e, mesmo se causar algum dano, a entidade que preside "fará posteriormente todo o possível" para conservar o túmulo de Ciro. No entanto, nem Mashahi ou outro responsável iraniano se referiu à possível inundação de Darre Bolaghi e dos restos arqueológicos achados recentemente na respectiva região.
(Efe, 23/04/2007)