Técnicos, políticos e comunidade pedem mais participação contra os problemas do rio dos Sinos e Gravataí (RS)
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2007-04-23
Um pequeno público foi ao Salão de Atos do Centro Universitário Feevale, em Novo Hamburgo (RS), na terça-feira (17/04) para tratar de um assunto da maior importância. A iniciativa, chamada Encontro de Parceiros, tem o objetivo de planejar e executar ações para melhoria da qualidade das bacias dos rios do Sinos e Gravataí. “Nós queremos encontrar a solução do nosso rio. É um trabalho em que todos os cidadãos devem se empenhar e não é só com recursos que vamos resolver isso, mas com a participação de todos”, desabafou o padre Aloísio Bohnen, representante do Comitesinos.
Os secretários estaduais do Meio Ambiente, Vera Callegaro, e da Habitação e Desenvolvimento Urbano, Marco Alba, marcaram presença. Também participaram do encontro técnicos da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), representantes de municípios que compõem as bacias do Sinos e Gravataí e de ONGs, e estudantes de Mestrado em Qualidade Ambiental da Feevale, que durante quase três horas acompanharam a apresentação dos trabalhos desenvolvidos desde fevereiro. Todos tocados em uma espécie de mutirão que envolve desde e elaboração de planos de saneamento até ações de fiscalização em pequenos estabelecimentos.
Ainda na abertura do evento, o deputado federal Renato Molling (PP-RS), ex-prefeito de Sapiranga, parabenizou a iniciativa. “Estamos chegando a um estágio muito crítico, por isto esta mobilização maior. A preocupação com o meio ambiente é fundamental, mas vemos uma deficiência de projetos das prefeituras em Brasília. Os recursos são necessários e existem, mas é preciso maior mobilização”, disse. O secretário da Habitação, Marco Alba, acrescentou que há possibilidade de captação de verbas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal para o saneamento das bacias do Sinos e Gravataí, porém a formatação de projetos é um ponto sensível.
Reconhecendo a falta de saneamento como a principal causa da mortandade de peixes no Rio dos Sinos, Vera Callegaro apontou a importância do Sistema Integrado de Gestão do Meio Ambiente (SIGA) vinculado à sua pasta. O SIGA inclui um processo de fiscalização integrada com sinergia de esforços entre Estado e municípios, com o importante apoio do Comando Ambiental da Brigada Militar. “Temos ainda uma proposta de um programa de educação ambiental, mas falta integração, planejamento, entendimento do papel de cada um neste contexto”, disse.
Eufemismo
Como técnico da Fepam, atuando desde 1981 no controle da qualidade da água da bacia do Sinos, Ênio Leite apresentou dados históricos de monitoramento. Segundo ele, "o problema da poluição do Sinos vem de muitas décadas, e dizer que há perigo potencial de mortandade é eufemismo”. De acordo com Ênio Leite, a concentração de oxigênio dissolvido – essencial para a sobrevivência de peixes – vem sendo medida mensalmente na nascente, no município de Caraá, mostrando que em 93% das vezes indica classe 1, ou seja, valores desejáveis.
A situação piora à medida que o monitoramento se aproxima das áreas urbanas. No Arroio Luiz Rau, por exemplo, que drena uma área onde estão metalúrgicas e pelo menos 40 curtumes, em Novo Hamburgo, em 30% das vezes em que foram realizadas as análises da água, o índice de oxigênio dissolvido estava abaixo de 2 miligramas por litro (mg/l), "algo extremamente preocupante". “Por isto, constatamos que o episódio de mortandade que aconteceu no Sinos não foi isolado, não é de hoje”, reitera Leite.
De acordo com ele, a série histórica de dados, de 1990 a 2006, permite verificar que mesmo na nascente do Sinos, a cada ano, mede-se menos oxigênio dissolvido. “Essa concentração, embora acima de 7 mg/l, vem caindo ano a ano”, atesta. As situações mais problemáticas são as dos arroios Luiz Rau e Portão, que há muitos anos estacionaram na média de 2 mg/l de oxigênio dissolvido.
Igualmente preocupantes são os níveis de Demanda Biológica de Oxigênio (DBO) e coliformes fecais. ”À medida que nos aproximamos da Região Metropolitana, a concentração de coliformes fecais aumenta para 87%, 88%”, informa o técnico. "Enquanto o ponto médio para o parâmetro de coliformes fecais é de 4.000 por 100 ml de água, as médias anuais do Luiz Rau vêm ficando em 200.000 por 100 ml, e as do Arroio Portão vêm aumentando anualmente", observa.
Inversão
Outra questão importante mostrada pelo técnico da Fepam é a inversão da participação dos setores industrial e doméstico na poluição do Sinos por carga orgânica. De acordo com ele, no início dos anos 80, não existia uma portaria legal para determinar que os curtumes - principais indústrias poluidoras do rio, na época – reduzissem seus lançamentos. Assim, a BDO de origem industrial era maior que a doméstica. Com a introdução de uma portaria, quase no final dos anos 80, essa situação foi se invertendo aos poucos.
As medições realizadas em 2001 mostram que a proporção se inverteu, e agora os principais agentes de aumento da DBO são de origem doméstica (esgoto cloacal). De acordo com Leite, houve ainda uma mudança na legislação, em 2005, de modo que a mesma ficou mais rígida, o que altera algumas comparações de dados feitas ao longo dos anos. Mesmo assim, no contexto da poluição por metais pesados, o Arroio Luiz Rau está em situação crítica. “Esses dados de monitoramento estão há dois anos na Internet, na página da Fepam. Agora estamos publicando também dados fornecidos por outras entidades, como a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), que nos fornece as vazões do Sinos em São Leopoldo e Novo Hamburgo, e a Comusa (companhia de água de Novo Hamburgo) e o Semae (serviço municipal de água de São Leopoldo), que fornecem dados de oxigênio dissolvido diariamente, a partir de seus pontos de captação de água no rio”, afirma.
Fiscalização piloto
O engenheiro químico Renato Chagas, técnico da Fepam que desde 1982 trabalha no Departamento de Controle da Poluição Industrial (Dicop) do órgão, ressaltou os avanços históricos desde a introdução da Portaria 05/1989, pela qual os curtumes tiveram que passar a tratar seus efluentes, antes lançados diretamente no rio. “Tínhamos outras empresas também, como a antiga Samrig, que lançava seus efluentes brutos no rio até o final da década de 80.
"A indústria retirou boa parcela da poluição, mas isto não é suficiente”, alerta. Para Chagas, é necessário buscar o percentual de atividades industriais que ainda não trata seus efluentes. Por isto, o Dicop, desde janeiro deste ano, deu início a um projeto piloto para estender as fiscalizações aos finais de semana para as atividades industriais. A idéia é estender essa atividade por alguns meses ou por um ano. “Estamos submetendo a proposta à diretoria técnica da Fepam”, informa, acrescentando que, para viabiliza-la, será necessário contar com kits de coleta de mostras para permitir aos técnicos, sempre que constatarem alguma irregularidade, fazer a coleta.
Ao mesmo tempo, o Dicop deu início a um contato com o pessoal da área de Meio Ambiente que atua nas prefeituras de Portão e Estância Velha, acertando detalhes sobre o trabalho de fiscalização municipal. “Estamos organizando um sistema de fiscalização de fim de semana, trocando informações com os municípios”, ressalta.
Autuações
De 2004 até setembro do ano passado, a Fepam realizou mais ou menos 300 autuações em 250 fontes de poluição na bacia do Sinos. Somente de janeiro a abril deste ano, foram realizadas 102 vistorias, unicamente na área industrial. “Esses dados não incluem fiscalizações de mineração, nem os da Divisão de Saneamento Ambiental, por exemplo”, assinala Chagas. “Mas para fazermos uma fiscalização mais operante, precisamos ter o engajamento das prefeituras, principalmente daquelas que não têm o licenciamento as atividades de impacto local. Gostaríamos de ver todos fazendo a sua parte”, conclui. Após a apresentação de dados por parte de técnicos da Fepam, representantes de cinco trechos do Rio dos Sinos, estabelecidos por áreas de abrangência municipal, apresentaram um relato das ações mais recentemente desenvolvidas em níveis locais.
(Por Cláudia Viegas, Ambiente JÁ, 19/04/2007)