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silvicultura zoneamento silvicultura gestão de florestas públicas
2007-04-20
O título da palestra assustava ambientalistas: "Florestamento para o desenvolvimento econômico e mitigação da probreza: uma nova perspectiva". Contudo, quem saiu assustado do evento foi o próprio palestrante, o cientista florestal indiano Sadanandan Nambiar, que esteve em Porto Alegre na última terça-feira (16/4) a convite da Stora Enso. Ele não entendeu o motivo de tantas palmas e troca de acusações entre a platéia quando a organização do evento abriu para perguntas. "Por que vocês estão batendo palmas?", questionou mais de uma vez aos presentes. Ninguém respondeu. O cientista também veio ao Brasil para ajudar na revisão de análises feitas pela Stora Enso sobre as plantações no Uruguai e Brasil.

Nambiar, que trabalha com silvicultura há 35 anos e é autoridade na Austrália (berço do eucalipto), defende que é possível eliminar a pobreza com a silvicultura. Disse que cerca de 1 bilhão e meio de pessoas dependem diretamente ou indiretamente das florestas para viver. Também apresentou dados que mostram que a incidência da pobreza é maior onde há florestas naturais. "A mata nativa está sendo destruída. Isto não está gerando riqueza porque as pessoas pobres vivem da venda de subprodutos extraídos dessas florestas, como madeira para combustível, cujo valor é baixo no mercado", afirmou.

Ele considera a silvicultura como um investimento promissor para países pobres, pois a demanda por papel é crescente, e o custo para implantação da plantação de árvores exóticas seria baixo. Vislumbra um futuro em que a pequena propriedade tenha galinhas, milho, feijão e um pedaço para o eucalipto, complementando a renda.

Provocou a banda ecológica questionando se a silvicultura é responsável pela crise de água. Ele acredita que não. Alega que a água não chega a todos porque está mais em reservatórios particulares do que em rios. Além disso, segundo seus dados, 70% do recurso é usado na agricultura. O pouco que resta seria em grande parte contaminado pela falta de saneamento básico.

O cientista disse que vê ótimas condições para a plantação de exóticas na Metade Sul. "A região está em um processo de desertificação acelerado. A silvicultura barraria esse processo. Aquela paisagem está degradada porque sempre foi mal usada e não será recuperada com pastagem", declarou. Justificou dizendo que o solo é mais agredido com um cultivo de uma monocultura anual, como a soja. O eucalipto demora sete anos para ser cortado, em média.

Concluiu sua fala colocando a frase "A ideologia verde deve ser contida pela ciência e por uma atuação racional das empresas" no projetor. Foi ovacionado pela banda dos empresários e representantes de municípios da Metade Sul.

Contestações
Quando perguntado pelo professor Ludwig Buckup, do Instituto de Ecologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, como a destruição do Pampa pode reduzir a pobreza da região, respondeu que o equilíbrio é possível. "Não são valores opostos. Mas seria arrogante da minha parte passar uma idéia do que poderia ser feito no Estado, afinal, vocêm têm ótimos cientistas e estudos", despistou.

Rodrigo Costa, que se identificou como morador da Metade Sul, perguntou ao cientista se um bioma pode ser usado como desculpa para impedir a diversificação econômica da região. O palestrantante disse que tinha uma opinião pessoal sobre o assunto, mas que não iria expô-la perante aquela platéia.

Segundo Otávio Pontes, vice-presidente da Stora Enso na América Latina, a intenção em trazer Nambiar foi a de apresentar à sociedade gaúcha uma pessoa que tem uma visão mundial dos conflitos que giram em torno das plantações de exóticas e que está "totalmente fora daquela esfera de dualidade".

Entrevista exclusiva
Na entrevista que segue com o cientista florestal, Sadanandan Nambiar, também participaram os jornalistas Geraldo Hasse e Patrícia Marini, do Jornal JÁ.

Ambiente JÁ – O senhor sabe por que as pessoas aplaudiam ao fim das perguntas?

Nambiar – Realmente não entendi. Quem foram os que aplaudiram? (Os jornalistas explicaram que ecologistas aplaudiram em perguntas de colegas e que o mesmo aconteceu com os empresários). Ningúem está completamente errado, nem certo, o desafio é buscar o equilíbrio. E é isto que eu estou tentando fazer aqui.

Ambiente JÁ - O senhor acredita que a silvicultura possa ser a solução para a pobreza?

Nambiar - O problema é que a maior parte de nós vê só um lado do problema - ou o lado das indústrias ou o lado dos ecologistas. Poucos têm uma visão holística, o que é um defeito humano. Precisamos ver o conjunto. Olhar para as experiências que deram certo, porque isto pode servir para qualquer país. Os europeus verdes dizem "não pode plantar eucalipto". São radicais. Essa visão me lembra o fato de 40% das mulheres do Quênia terem HIV. Naquele país não se pode discutir sexo seguro por motivos religiosos. A ideologia pode trazer sofrimento às pessoas.

Ambiente JÁ – Como a silvicultura pode ser sustentável?

Nambiar - Economia, meio ambiente, pessoas e política estão todos ligados. Não há uma equação perfeita para a sustentabilidade, por muitas razões. Primeiro, sustentabilidade é um conceito diferente para cada pessoa, depende de como você enxerga o mundo. Segundo, a ciência não tem conhecimentos suficientes para chegar a essa equação. Depois de 35 anos de trabalho na área e do convívio com os 64 cientistas da minha equipe, sendo 40 PhDs, ainda não descobri. Essa visão fundamentalista sobre o eucalipto só vai acabar quando vocês reconhecerem que a equação não é perfeita. Não adianta ir de um extremo ao outro. Sustentabilidade é uma jornada, não é o ponto de chegada. Se o Rio Grande do Sul continuar com esse discurso, o Estado vai perder uma grande oportunidade econômica e a capacidade de melhorar a vida das pessoas.

Ambiente JÁ – Como seria possível reduzir os impactos negativos da silvicultura no Rio Grande do Sul?

Nambiar - Muitas tecnologias podem diminuir esses impactos. E o Brasil tem ótimos trabalhos sobre isso. Não sou eu quem vai indicar os melhores, ou dizer o que precisa ser feito. E é a ciência que tem que dizer se o eucalipto é bom ou ruim, para daí ser feita uma escolha.

Ambiente JÁ – Eu gostaria que o senhor falasse sobre as experiências com silvicultura para geração de riqueza.

Nambiar - Esse tipo de trabalho que faço fracassa na metade das vezes. Porque quando nós lidamos com esse ambiente de pobreza, o risco de não dar certo é alto. Evitam investimentos nesses países ou regiões justamente porque o risco econômico existe e até a saúde dos técnicos corre perigo. Mas se eu puder ajudar uma única pessoa, é o suficiente. E é isso que digo às pessoas. Eu sou muito otimista em relação ao Vietnã, porque há um acordo da comunidade em relação àquilo que deve ser feito, e a política do governo está apoiando. As pessoas de lá precisam disso, pois o solo ainda não se recuperou das armas químicas da guerra com os EUA, e as árvores exóticas se adaptaram bem. Também estou otimista com relação ao Uruguai, porque eles têm terra, politica e pessoas maravilhosas. Embora eles não tenham pobreza, a silvicultura pode impulsionar a economia do país. Quanto ao Rio Grande do Sul, a comunidade ainda tem muitos conflitos, não tenho uma opinião.

(Por Ana Luiza Leal, Ambiente JÁ, 19/04/2007)

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