Audiência pública mostra que polêmica florestal no RS virou paradoxo do desenvolvimento
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2007-04-20
Faltam licenças para alavancar recursos e faltam recursos para licenciar
Deputados favoráveis aos projetos de Silvicultura no Estado mais uma vez tiveram a chance de reivindicar agilidade à Fepam quanto ao licenciamento dos plantios de eucalipto e ao Zoneamento Ambiental para a atividade. Sempre atentos, os ambientalistas também estiverem presentes à audiência pública da Comissão de Agricultura da Assembléia Legislativa que discutiu o tema ontem (19/04). Ao órgão ambiental coube, novamente, se defender da saraivada de acusações.
Nelson Härter (PMDB), presidente da Comissão de Economia, e crítico número 1 da Fepam, chamou, mais uma vez, a atenção para si. Disse que veio para assistir a apresentação do Zoneamento, o que não ocorreu por "falta de condições técnicas" da sala de reuniões da comissão.
Beto Pontes, prefeito de Sertão Santana e presidente da Associação de Municípios da Zona Sul, fez questão de ressaltar que os prefeitos "não são favoráveis a degradação ambiental". Mas, dependem sim, de uma "definição das coisas". Lembrou que a região que representa, sempre foi dependente do fumo e que, agora, com a Convenção-Quadro, para o controle do tabaco, a situação dos municípios ficou "complicada".
Em tempo
A Convenção - Quadro para Controle do Tabaco é uma iniciativa da Organização Mundial da Saúde (OMS), cujo objetivo é evitar a morte de pessoas. Trata-se de um compromisso internacional pela adoção de restrição ao consumo de cigarros e outros produtos derivados do tabaco.
Então, segundo Pontes, os prefeitos da região vêem com bons olhos a Silvicultura como alternativa ao fumo. Mas ainda conforme ele, não querem o plantio de eucalipto de qualquer jeito, mas sim, de acordo com as regras ambientais. "É preciso que a Fepam diga como e onde se pode plantar pô!"
Representando a equipe técnica da Fepam, Silvia Panjel explicou aos deputados, ligados ao agrobusiness, a diferença entre o Zoneamento Ambiental e o Zoneamento Agrícola, que muitos pareciam pensar ser o que a Fepam realizou. Zoneamento Agrícola define os períodos favoráveis de plantio para cada município. Já o Zoneamento Ambiental considera a fragilidade do ambiente frente às atividades antrópicas. "Ah, agora sim", murmuraram alguns na platéia.
O momento "fora da casinha" da manhã foi protagonizado pelo deputado Alceu Moreira, do PDT, ao defender o não-licenciamento para a Silvicultura. "Se outras culturas não precisam de licença ambiental, por que o eucalipto vai precisar?", questionou com voz de trovão. Foi o suficiente para ser vaiado e não mais tomar a palavra.
Silvia recordou que a Fepam foi chamada a realizar o Zoneamento por uma demanda das empresas. E que apenas estabelece as regras considerando as fragilidades de cada ecossistema, em especial na região do Pampa, onde estão concentrados os maiores plantios. Ou previstos pelo menos. "Mostramos os cuidados que as empresas devem ter e as restrições legais", disse. Ou seja, o órgão ambiental apenas cumpre ou manda cumprir a Lei. "Não queremos, ao contrário do que se diz, inviabilizar a atividade, mas sim, discipliná-la".
Após ser questionada por Härter, a técnica voltou atrás de sua afirmação de que todas as licenças pendentes de 2006 para plantios florestais já haviam sido concedidas e lembrou "de algumas que talvez ainda tenham ficado de fora". Decidido a obter respostas, Härter partiu para o ataque quando soube da chegada ao evento do presidente da Fepam, Irineu Schneider. Queria saber quantas licenças já foram concedidas, quantas ainda faltavam, e principalmente, quando, onde e com quem foram feitas as consultas públicas que constam na página 57 do zoneamento da Fepam. Quis saber também o que os colaboradores, trinta em cada uma das quatro páginas (71,72, 73 e 74), do Zoneamento fizeram. Citou como exemplo a Fepagro, que consta como colaborada, mas que já divulgou não ter participado do documento.
Schneider explicou que, neste ano, até o início de abril, foram concedidas 2.411 licenças, mas não soube precisar o tempo necessário entre as vistorias e as concessões. "Vamos liberar o mais breve possível", disse. O presidente da Fepam admitiu a morosidade do órgão ambiental e culpou a escassez de recursos, inclusive de pessoal. Disse que parte da frota de carros da Fepam está parada por falta de pneus e que muitos técnicos estão acumulando banco de horas. "Daqui a pouco teremos técnicos com direito a três meses de férias, imaginem como será isso", lamentou.
Aproveitou para desmentir uma matéria publicada na imprensa que dá conta de 20 mil os processos parados na Fepam. Segundo Schneider, trata-se de uma mentira do jornalista. "Não sei de onde ele tirou esse número". O presidente garantiu que são "apenas" dez mil e quinhentos processos na fila. Disse que se a Fepam fizer como outros Estados fizeram, como permite o artigo 23 da Constituição, pode empurrar para os municípios à atribuição do licenciamento. "Iria aliviar a Fepam", destacou.
A solução é fácil, difícil é executá-la
A reunião da Comissão de Agricultura, ontem pela manhã, mais uma vez colocou frente à frente opositores e favoráveis aos projetos de florestamento no Estado. Como em outras ocasiões, nada de concreto foi acertado. Assim como ninguém fez a cabeça de ninguém, ou seja, quem é contra vai continuar sendo contra. E quem é a favor, continuará sendo favorável.
O que ficou claro é que a solução está bem fácil de ser apontada. Os prefeitos concordam que é preciso regrar a atividade. Juram fidelidade e amor ao meio ambiente. Os deputados eucaliptianos também.
Os ambientalistas não são contra geração de emprego e renda no Estado. Querem, com toda a razão, que as coisas sejam feitas de maneira clara e com respeito às leis ambientais. Querem, sobretudo, garantir a preservação do pampa, importante ecossistema gaúcho e da água, do solo, do ar. Da vida, como dizem.
A Fepam é bem-intencionada e tem em seus quadros funcionários competentes. Não é verdadeira a afirmação de certos órgãos de imprensa ou de parlamentares que os chamam de preguiçosos. Se tiver dinheiro e pessoal, certamente agradará ambientalistas e empresas.
Todos os caminhos e opiniões acabam numa mesma direção. É uma necessidade mais do que urgente injetar recursos financeiros e, conseqüentemente, humanos na Fepam. Servidores lembram que a Fepam "cuida do nosso futuro e pode muito mais". Segundo esse pessoal, incluindo seu presidente, faltam 400 funcionários no quadro permanente. Hoje totalizam 233 trabalhadores, entre técnicos, administrativos e operacionais. Pelas contas da Fepam deveriam ser 634.
Lembram que, ao longo do tempo, inovaram nas formas de licenciar que serviram de modelo para outros Estados e como resultado, em 2006, aumentaram a produtividade em 39,75%, passando de 8.339 licenças emitidas em 2005 para 11.654 em 2006.
Os servidores da Fepam reivindicam concurso público para todas as áreas, melhorias nos salários, atualização do valor de diárias, construção de laboratórios, planejamento estratégico e valorização do servidor, entre outras coisas. "É muito", admitem, mas nada mais justo e certamente será a solução definitiva para agilizar e dar qualidade ao licenciamento ambiental no Rio Grande do Sul. Muito além de compromissos, ou ajustamentos de conduta que nada mais são do que soluções paliativas, para não dizer coisa pior.
Difícil será colocar em prática essa solução, já que é pra lá de conhecida a falta de recursos do Estado. Schneider avisou que já pediu ajuda à governadora Yeda Crusius. "Ou é isso, ou é nada", afirmam. Ou ainda como Eduardo Galeano escreveu alguma vez em algum lugar: "Está envenenada a terra que nos enterra ou desenterra, já não há ar, só desar. Já não há chuva, só chuva ácida, empresas no lugar de nações...e por ai vai.."
(Por Carlos Matsubara, Ambiente JÁ 19/04/2007)