O juiz Herculano Martins Nacif, da Vara Única de Altamira (PA), determinou nesta quarta-feira (18/04) que a Eletrobras e o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama) devem prestar esclarecimentos em 72 horas sobre a ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) no Pará. A ação pede a paralisação do estudo e do relatório de impacto ambiental (EIA-Rima) da usina hidrelétrica de Belo Monte no rio Xingu. A Eletrobras iniciou o estudo sem o termo de referência, que estabelece critérios para realizar o EIA-Rima e deve ser editado pelo Ibama.
A Justiça determina que ou o Ibama apresente o termo de referência, ou tome as providências necessárias para que seja concluído com prazo pré-determinado. O não cumprimento da determinação valerá uma multa diária de R$ 50 mil.
Segundo a Eletrobras, a estatal entrou com um processo para iniciar o EIA-Rima em 2006, mas devido ao embargo judicial, o estudo foi iniciado em janeiro deste ano e está na sua fase inicial, referente ao levantamento físico da área impactada.
De acordo com a Resolução do Conama n.º 001 de 1986, o órgão ambiental - no caso, o Ibama - deve dar os critérios para orientar o EIA-Rima: “Ao determinar a execução do estudo de impacto ambiental o órgão estadual competente; ou o Ibama ou quando couber, o município fornecerá as instruções adicionais que se fizerem necessárias, pelas peculiaridades do projeto e características ambientais da área”.
Contudo, a Eletrobras afirma que o termo de referência não é uma exigência para se iniciar o estudo. “O termo de referência não é documento legal necessário para o início da elaboração do EIA-Rima, que é o primeiro passo para a obtenção da Licença Prévia (LP). Não há impedimento legal para que qualquer investidor inicie um EIA-Rima de qualquer aproveitamento hidrelétrico antes de receber o termo de referência do Ibama”, afirma a empresa.
Mesmo entendendo que o termo não é uma condição necessária, a Eletrobras informou que entregou uma proposta deste documento ao Ibama. “A empresa, que já cumpriu a determinação legal de apresentar a proposta de termo de referência ao Ibama, está livre para começar os estudos”.
Segundo Felício Pontes, um dos procuradores da República responsáveis pela ação do MPF, a Eletrobras pode propor um termo de referência ao Ibama, mas a instituição deve analisá-lo e apresentá-lo à sociedade. A partir disso, alterações podem ser feitas no documento pelo órgão ambiental.
De acordo com o diretor de Licenciamento Ambiental do Ibama, Luiz Felippe Kunz Júnior, a empresa pode fazer o estudo “por conta e risco deles”. Para ele, não há problemas em a Eletrobras adiantar o processo, realizando estudos e pesquisas antes da edição do termo, mas isso não significa que esse levantamento não tenha que ser readequado, refeito ou aprofundado segundo critérios ambientais estabelecidos pelo Ibama. Kunz concorda que o EIA-Rima apenas é valido se houver um termo de referência editado pelo órgão ambiental. “Não vamos receber nenhum estudo que for entregue se não tiver o termo”, afirma.
Para o MPF, o fato de a Eletrobras ser uma estatal é um problema neste caso. “O empreendedor está se arriscando a perder dinheiro, já que esses estudos podem não servir por não contemplarem os critérios propostos pelo Ibama. A Eletrobras conta com o dinheiro público para o investimento na obra, inclusive para a realização do EIA-Rima”, explica Felício Pontes.
Sobre a ação pública
Para Luiz Felippe Kunz Júnior, diretor de Licenciamento Ambiental do Ibama, “a ação do MPF é incompreensível. A Justiça está se intrometendo em questões administrativas, que estão sob total controle do Ibama”. Segundo ele, as reuniões públicas referentes ao termo de referência e o EIA-Rima da Eletrobras estão previstas entre maio e junho deste ano.
“A Eletrobras tem respondido todos os questionamentos do MPF nos prazos concedidos. Sobre a presente ação, o Departamento Jurídico da empresa está estudando os passos a serem dados”, responde a estatal.
Pressa
Em sua ação civil pública, o Ministério Público Federal descreve o conteúdo do documento da empresa E.labore, contratada para realizar os estudos de interação social do empreendimento, que foi entregue em janeiro deste ano ao gerente do Ibama em Altamira. A E.labore é acusada por lideranças sociais contrárias a Belo Monte de “espionar” suas atividades para instrumentalizar os discursos da Eletrobras.
No documento, a empresa menciona a ausência do termo de referência e recomenda que se mude, “devido às circunstâncias emergenciais, o escopo do nosso discurso estratégico, se provocados pela mídia e/ou sociedade, para explicar a realização dos atuais estudos, antes da consolidação do Termo de Referência”.
Na ação, os procuradores da República Marco Antonio Almeida e Felício Pontes criticam essas solicitações: “O licenciamento ambiental de um empreendimento que irá afetar diversas comunidades indígenas e populações tradicionais e custará bilhões de reais é tratado como mera formalidade a ser cumprida para a desejada implantação. Se existe alguma deficiência basta ludibriar a população e comunidades afetadas, ou, numa linguagem mais apropriada, mudar, devido às circunstâncias emergenciais, o escopo do discurso estratégico", denunciam.
(Por Natália Suzuki,
Agência Carta Maior, 19/04/2007)