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silvicultura setor florestal eucalipto no pampa
2007-04-19
Numa tentativa de iluminar o debate sobre o plantio intensivo de eucalipto no pampa, a StoraEnso reuniu em Porto Alegre uma centena de pessoas para ouvir o cientista florestal indiano Sadanandan Nambiar, que fez carreira na Oceania, Ásia e África. Recentemente aposentado, Nambiar afirmou que a silvicultura pode contribuir para reduzir a pobreza em áreas rurais estagnadas ou decadentes. E terminou sua palestra sugerindo que os "verdes" rendam-se à ciência.

Foi o suficiente para dividir a platéia do evento realizado na noite de terça-feira (17/4) no auditório do Hotel Deville, em Porto Alegre. No Gre-Nal de opiniões que se seguiu à palestra, houve manifestações favoráveis e contrárias do auditório, formado por engenheiros florestais e agrônomos, agricultores, funcionários públicos, empresários, professores e jornalistas. Resultado final, 1 x 1, com promessa de novos encontros, mais ou menos amplos.

"Estamos interessados em saber mais sobre o bioma pampa", disse o engenheiro florestal sueco Anders Tosterud, diretor de recursos naturais da StoraEnso, em conversa com o agrônomo Miguel Dall'Agnol, especialista em pastagens da UFRGS, que o havia desafiado a promover debates técnicos profundos em grupos mais reduzidos. João Fernando Borges, o outro diretor da StoraEnso, confirmou depois que a empresa está disposta a estreitar o contato com a comunidade científica gaúcha. "Achamos que falta esclarecimento entre as partes", disse ele, lembrando que foi cumprimentado, no final do evento do Hotel Deville pelo biólogo Ludwig Buckup, aposentado da UFRGS que se sobressaiu em 2005 como crítico do eucalipto no pampa e do pinus no litoral e na serra.

Consultor no Uruguai
O engenheiro florestal Sadanandan Nambiar veio ao Rio Grande do Sul pela segunda vez. Esteve no estado, antes, em janeiro passado. Ultimamente tem freqüentado o Uruguai como consultor da StoraEnso, que implanta uma fábrica de celulose em Fray Bentos. Conhece o Brasil há 12 anos. Em conversa com jornalistas, no final da palestra, admitiu que na juventude torceu por Che Guevara e chegou a fazer esforços voluntaristas para ajudar as pessoas, mas ao evoluir em sua carreira como engenheiro profissional concluiu que, independentemente da orientação do regime político - ditadura ou democracia -, não há outra forma de diminuir a pobreza senão mediante a geração de riqueza. Para o que é preciso ter infra-estrutura, capital, recursos humanos, tecnologia, mercado global. "O crescimento econômico não é um jogo de soma zero, ou seja, ninguém precisa ficar pobre se alguém ganha dinheiro", disse ele. "Se Você tirar uma única pessoa da pobreza, ela vai contribuir para ajudar outra, porque vai ter poder de compra, e assim por diante". O mais difícil seria dar o primeiro passo. A situação seria trágica porque as políticas públicas não conseguem reduzir a pobreza. "Perdemos esse jogo" (contra a pobreza), disse o cientista indiano.

Simples assim, a mensagem de Nambiar foi uma declaração de amor à ciência e à tecnologia. Ele deu o exemplo da África. As florestas nativas existentes no Congo valem apenas US$ 60 milhões de dólares, quando medidas em pé. Um metro cúbico de madeira nativa é vendido por apenas um dólar nos países mais atrasados do continente africano, porque o uso predominante é para geração de energia (lenha).

Mesmo sendo um dos países mais pobres, portanto sem silvicultura, a Etiópia gasta US$ 400 milhões anuais com importação de madeira para fins mais nobres. Apenas 7% das florestas do mundo são manejadas de forma sustentável. O desperdício de recursos florestais naturais é enorme - e criminoso. Cerca de 80% das madeiras negociadas no mundo são extraídas ilegalmente. Por isso, e porque os prazos de maturação dos projetos são muito longos, o desenvolvimento sustentável na silvicultura não pode acontecer sem incentivo fiscal.

É equívoco pensar que a floresta dê apenas madeira. Ela pode gerar remédios, mexer nos fluxos de água, ativar o turismo, produzir oxigênio e alterar a biodiversidade para mais ou para menos.

Fluxos hídricos
Falando sobre o Rio Grande do Sul, Nambiar disse ter encontrado no território gaúcho fortes sinais de degradação ambiental, produzida por atividades agrícolas predatórias. Exibiu fotos de erosão no pampa, sugerindo que a silvicultura poderia abrir caminho para sanar essas feridas ambientais. "Nenhuma atividade econômica pode ser totalmente dominante", disse ele, referindo-se, aparentemente, à pecuária e à sojicultura. A razão disso é que os fluxos hídricos permeiam todas as atividades agrícolas.

A substituição de pastagem por árvores pode mudar os fluxos hídricos, já substancialmente alterados. Em escala mundial, o volume de água represada é três vezes maior do que o volume de água dos rios. No Brasil não é diferente. Dois terços das águas são usados na agricultura de forma predatória, com desperdício e degradação ambiental. Na Austrália, 50% da poluição dos rios é produzida pelas populações urbanas. No mundo, 1,7 milhões de pessoas morrem por ano por doenças de veiculação hídrica. A silvicultura pode ajudar no combate à degradação ambiental. Mas é preciso haver um acordo para as coisas andarem. Sem negociação nada irá para a frente. A ideologia verde, com o olho fixo exclusivamente na preservação ambiental, precisa abrir caminho para a ciência e as boas práticas florestais.

A pior degradação é a praticada pelos pobres. O crescimento econômico e a preservação ambiental não são antagônicos. A madeira pode ser um novo produto do pampa, as árvores podem se acomodar nesse ecossistema. Não há evidência de que qualquer monocultura agrícola tenha piorado os solos em qualquer parte do mundo. A crítica à monocultura é emocional. Os cientistas precisam se abrir para o debate com as comunidades e a indústria tem de aprender a se comunicar melhor.

No final, confrontado com a dúvida do agricultor e agrônomo Rodrigo Costa, de Pelotas, que perguntou se a campanha contra o eucalipto no Rio Grande do Sul não poderia estar sendo financiada por países temerosos das vantagens competitivas do Brasil, Nambiar disse que nada tinha a declarar em público sobre esse assunto, mas que toparia tomar uma cerveja para uma troca de idéias -- em particular. Ele vai embora na sexta-feira.

(Por Geraldo Hasse, Jornal JÁ, 18/04/2007)

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