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PAC amazônia
2007-04-19
Por Rogério Grassetto Teixeira da Cunha*

Dentro da idéia de um Pacote Ecológico de Crescimento (PEC), que permitisse atingir os objetivos do PAC, mas sem os seus impactos ambientais negativos daquele, analisarei aqui a questão da infra-estrutura logística, particularmente o setor de transportes.

O governo pretende investir, pelo PAC, cerca de R$ 58,3 bilhões em estradas, ferrovias, portos e aeroportos. Destes, a maior parte, R$ 33,4 bilhões, será gasta com rodovias, enquanto que o montante reservado para as ferrovias é de apenas R$ 7,9 bilhões. Dentre as ações mais controversas do ponto de vista ambiental está o asfaltamento das rodovias BR-163 (Cuiabá-Santarém) e BR-319 (Manaus – Porto Velho), além de mais algumas na região amazônica (BR-364 no Acre, BR-230, a transamazônica, no trecho paraense, e BR-156 no Amapá).

Pois bem, há duas principais críticas a estas obras. Primeiro, no caso da BR-163, o objetivo principal deve ser o de escoamento da crescente produção de soja do Mato Grosso (parte de uma das fronteiras agrícolas mais ativas do país, a do arco sul da Amazônia), e possivelmente da também crescente pecuária na região. Estas, juntamente com a extração de madeira, são os principais agentes causadores de desmatamento na região. Com sua melhora, ela certamente induzirá à aceleração da expansão agropecuária no Mato Grosso. Portanto, será um incentivo a mais para o desflorestamento por lá, bem como em outras áreas de influência da rodovia, como o que já vem ocorrendo na região de Santarém, próxima à calha do rio Amazonas, uma região até então livre da degradação nessa escala. Mas a cegueira neste ponto é tamanha que um dos objetivos do PAC é justamente "indução ao desenvolvimento em áreas de expansão de fronteira agrícola e mineral". Sem comentários.

Segundo, já é mais do que sabido que estradas são indutoras de desmatamento por si sós. Ao fornecerem acesso fácil à floresta, começam a ser construídas estradas transversais à principal, a maior parte das vezes de forma clandestina, e, depois, transversais a estas e a figura que se vê do alto assemelha-se a uma "espinha de peixe", como é chamada esta forma de devastação à beira das estradas amazônicas. É extremamente ingênuo (para dizer o mínimo) acreditar que os projetos de regularização fundiária e de áreas de manejo e concessão ao longo da rodovia conseguirão brecar a destruição (nem os parques e reservas indígenas são respeitados). A ausência do Estado na imensa região, a promiscuidade de devastadores com as esferas municipais de poder (e por vezes estaduais), a péssima estrutura de fiscalização e o tradicional desrespeito à legislação em toda a região (e mesmo às formas básicas de ordenação social) são razões mais do que suficientes para este ceticismo.

No caso do asfaltamento da BR-163, que terá as piores conseqüências ambientais, há uma alternativa bem mais interessante: a ferrovia. Neste caso, poderia ser construída uma ferrovia que ligasse o centro e o norte do estado de Mato Grosso à ferrovia Norte-Sul, cujo andamento já está contemplado no PAC. Desta, os produtos poderiam seguir por vários caminhos. Uma opção seria para o norte, para o porto de São Luís, uma vez que a ferrovia Norte-Sul será interligada com a E.F. Carajás, que une Marabá, no Pará, à cidade maranhense. Ainda para o Norte, os produtos poderiam seguir via fluvial até Belém, já que a integração da Norte-Sul com a Hidrovia do Tocantins também já está prevista no PAC. Pela mesma ferrovia, os produtos poderiam seguir para o sul, até Anápolis, em Goiás, e de lá, através de uma malha ferroviária já bastante razoável, atingir quaisquer dos portos da região Sudeste. Por fim, já que o PAC prevê ainda uma ampliação de ferrovias para o interior do Nordeste, chegando até o centro-sul do Piauí, o escoamento poderia ser feito ainda pelo leste, por quaisquer dos principais portos da região Nordeste, com um ramal que interligasse a ferrovia Norte-Sul com as ferrovias nordestinas.

A opção pelos trens traria inúmeras vantagens. A primeira, econômica, reduzindo os custos de transporte. Há muito tempo que me chamou a atenção o fato de que os trens conseguem carregar muito mais carga por unidade de combustível (para transpor a mesma distância) do que os caminhões, sendo as hidrovias mais eficientes ainda. Desde esta época que eu não entendo por que então não se incentivavam mais os trens.

Posteriormente, causou-me perplexidade o fato de que, nos últimos 40 ou 50 anos, na verdade, se deixou perder boa parte da malha ferroviária que tínhamos no Brasil (algo quase criminoso em um país pobre como o nosso), se parou de investir no setor ferroviário e o desenvolvimento dos transportes foi focado nas rodovias.

A segunda vantagem seria ambiental, pois evitaria a indução ao desmatamento ilegal e ao agronegócio destruidor (ressalte-se que a agricultura não tem que ser necessariamente nefasta, mas no Brasil ela acaba sendo, pela forma como é praticada e estimulada, mas este é assunto para o próximo artigo). Um terceiro aspecto positivo, embora marginal, é que ambas as linhas poderiam ser utilizadas para transporte de passageiros e para promoção do turismo ambiental, dado o maior conforto que podem oferecer, o carisma de que os trens desfrutam no mundo todo e a melhor qualidade da paisagem quando vista de dentro deles, se comparada aos ônibus.

E dentro da idéia de crescimento com menor agressão ao meio ambiente, seria extremamente interessante que se investisse mais em ferrovias em todo o país (exceto na Amazônia, onde também podem induzir a devastação), recuperando linhas desativadas e construindo novas, para, aos poucos, mudar nossa matriz logística de transporte de cargas de caminhões para trens. O ganho ambiental neste caso é de caráter mais global: menor consumo de combustível fóssil para obter-se o mesmo resultado. E vou mais além. Poderia incentivar-se ainda o retorno do transporte ferroviário de passageiros (as empresas de ônibus que não me ouçam), por várias razões: economia global de combustível, potencial turístico, praticidade. E por aqui também o trem desfruta do carinho da população. Basta conversar sobre o assunto com alguém com mais de 45 anos para perceber a saudade dos tempos do trem. Ou ver o sucesso que as linhas turísticas desfrutam no Brasil. Ou ainda ver a luta aguerrida de inúmeras pessoas e entidades pela preservação da memória ferroviária (uma busca rápida na internet revelará diversos sítios extremamente interessantes).

Ainda considerando-se o transporte de cargas, poderia haver investimentos no transporte fluvial, mas preferencialmente em bacias hidrográficas já bastante impactadas (e são várias), para que não se adicionem mais algumas à extensa lista. Mesmo aquelas mais preservadas, como na Amazônia e em partes do Pantanal, poderiam ser utilizadas, desde que seus limites fossem respeitados, o que significa a utilização de barcos de tamanho adequado e a não realização de obras que pudessem interferir fortemente nos ecossistemas locais (como ocorrerá com o Pantanal, que poderá ser imensamente afetado se se levar a cabo a idéia insana da hidrovia Paraná-Paraguai).

(*) Rogério Grassetto Teixeira da Cunha, biólogo, é doutor em Comportamento Animal pela Universidade de Saint Andrews.
E-mail: rogcunha@hotmail.com
(Envolverde, 17/04/2007)


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