Os veículos híbridos elétricos (VHE) são a melhor solução para reduzir drasticamente a emissão de gases causadores do efeito estufa pelo transporte, inclusive mais do que os biocombustíveis, enquanto não for viável o uso de hidrogênio. Essa alternativa ganha força diante dos mais recentes informes do Grupo Intergovernamental sobre Mudança Climática (IPCC) da Organização das Nações Unidas, que reclamam medidas urgentes para conter o aquecimento da Terra, afirmam especialistas brasileiros.
O VHE pode reduzir em até 80% a contaminação causada por veículos que utilizam derivados de petróleo, “em alguns casos, até 90%”, disse à IPS Marcelo Massarani, professor de engenharia automotora da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Um VHE ainda custa entre 10% e 20% mais caro do que um convencional, mas nas condições de São Paulo a substituição representaria uma economia média de R$ 18 mil durante a vida útil de cada veículo, afirma a especialista Juliana de Queiroz em sua tese de mestrado, orientada por Massarani.
Em resumo, compreende menor consumo de combustível, redução de gastos médicos por doenças causadas pela contaminação e créditos no mercado de carbono criado pelo Protocolo de Kyoto, que fixa metas de redução das emissões de gases que causam o efeito estufa até 2012. Os benefícios do VHE são reconhecidos, mas “falta vontade política” para adotar medidas que impulsionem sua produção, afirmou Massarani. No Brasil, um estimulo evidente é a redução de impostos, que chegam a 33,3%, o dobro do cobrado na Europa, acrescentou.
O professor falou de sua intenção de reunir este ano em sua universidades governantes, representantes da indústria automobilística, outros pesquisadores e ambientalistas para discutir, em um seminário, estratégias para incentivar os novos veículos e remover os obstáculos à sua implementação. O VHE usa motor elétrico abastecido por baterias e um gerador que converte o combustível em eletricidade. Isto é, não deixa de usar gasolina diesel ou álcool, mas em quantidades menores.
“O motor elétrico é muito mais eficiente”, em especial na partida, não consome energia quando está parado, e quando se freia “seu motor se converte em gerador de eletricidade”, explicou à IPS Jayme Buarque de Hollanda, diretor do Instituto Nacional de Eficiência Energética (INEE). A energia perdida por veículos convencionais quando detêm sua marcha e o motor fica funcionando, nos Estados Unidos, é calculada em 17%. Já um veículo hibrido consome nada nesses momentos, ressaltou.
O motor à gasolina ou diesel “aproveita apenas um terço da energia consumida”, e o desperdício se nota no calor que produz e no cano de escapamento, acrescentou Antonio Nunes Junior, presidente da Associação Brasileira de Veículos Elétricos (ABVE). O VHE não representa “um salto tecnológico”, mas aproveita as tecnologias existentes, porém, “em uma nova arquitetura que rompe modelos”, definiu Hollanda. É uma solução “mais eficiente, menos contaminante e mais barata”, mas sua entrada no mercado “é um processo lento”, pois toda cadeia de produção deve ser adaptada, com altos investimentos e certeza de retorno, explicou.
De todo modo, sua produção já começou e cresce nos grandes mercados. Mais de 320 mil automóveis híbridos foram vendidos no ano passado, 253.636 deles nos Estados Unidos (19,2% mais do que em 2005), e cerca de 40 mil no Japão, destacou Nunes Junior. Na Europa, onde há mais de 70 mil em circulação, a expansão foi de 56% ao ano. Uma barreira é o custo inicial mais elevado, embora se compense depois de quatro a seis anos de economia de combustível. Outra é que ainda há poucos modelos de automóveis híbridos e os compradores não encontram neles as características que desejam, por falta, por exemplo, de variedade de tamanhos, afirmou.
Mas “é consenso que o futuro do setor automotivo é a tração elétrica”, seja o VHE ou o veículo com baterias de íon e lítio, em desenvolvimento, que permitirá em um futuro próximo uma grande economia, previu Nunes Junior. A indústria japonesa é a que mais investe no desenvolvimento de baterias, e anuncia para a próxima década veículos elétricos com essa fonte de energia a preços competitivos. “É um processo irreversível, embora lento”, impulsionado pelos problemas ambientais e pela alta do petróleo, afirmou Hollanda. O desenvolvimento das baterias avança rapidamente em capacidade e redução de custos, tanto pelo esforço da indústria automobilística quanto da informática, acrescentou.
O aquecimento da Terra tem como uma de suas principais causas os mais de 700 milhões de automóveis que circulam hoje no mundo. Na Europa, estima-se que os carros particulares respondam por 10% da emissão de gases causadores do efeito estufa. E a cada ano o mundo produz mais de 40 milhões de novos veículos. O IPCC diz em seu informe divulgado em fevereiro que 14% das emissões provêm de atividades de transporte, entre as quais predomina a rodoviária. O Brasil tem a vantagem de combinar o VHE com etanol, que produz a partir da cana-de-açúcar, um exemplo de máxima eficiência energética, pois é muito produtivo e em seu processamento também gera eletricidade, destacou o especialista.
Porém, como o país tem um mercado pequeno, com uma frota total de 24 milhões de automóveis e produção anual de 2,1 milhões, a produção de VHE leves vai demorar para arrancar. A indústria irá preferir, naturalmente, ganhar escala em grandes mercados ricos, como Estados Unidos, Europa e Japão. Porém, o Brasil já produz e exporta ônibus elétricos híbridos e deverá em breve fazer o mesmo com caminhões. Seu caminho é começar por veículos pesados até que a pressão do mercado, estimulado pelo aquecimento do planeta e o preço do petróleo, torne viável passar para a produção de veículos leves, concluiu Hollanda.
(Por Mario Osava,
IPS/Envolverde, 16/04/2007)