Se você ainda não ouviu falar em Carbon Free (neutro em Carbono), prepare-se. Um movimento ambiental que começou na Inglaterra há 11 anos e ganhou adeptos no centro do país nos últimos dois anos agora chega à capital gaúcha. Preocupados com os efeitos do aquecimento global no planeta, artistas, empresários e até gente comum estão fazendo uma conta nova: quantas árvores é preciso plantar para compensar as emissões de gases de efeito estufa na atmosfera.
Foi assim em janeiro com a Semana de Moda de São Paulo, quando 4.290 árvores de mais de 80 espécies nativas foram plantadas em uma área degradada da Mata Atlântica para neutralizar as emissões de gás carbônico do evento e de atividades relacionadas a ele. E vai ser assim a partir da próxima quarta-feira, quando se inicia, em Porto Alegre, a sétima edição do Donna Fashion Iguatemi, com a promessa de plantar 346 árvores para equilibrar o impacto do evento na natureza.
E não é só a moda que se rendeu à onda verde. A banda O Rappa plantou 37 mudas para equalizar o prejuízo ecológico de um show, e a Volkswagen lançou com toda pompa seu novo Golf com a intenção de promover o plantio de 740 mudas em uma área degradada de Sumaré, no interior de São Paulo, na primeira semana de outubro.
– Esse movimento começou a ficar forte no Brasil depois que o país passou a sentir os efeitos do aquecimento global, como aquele furacão aí, no Rio Grande do Sul (o furacão Catarina passou pelo litoral gaúcho e catarinense em março de 2004) – conta David Dieguez, diretor administrativo da Iniciativa Verde, uma organização da sociedade civil de interesse público que criou o selo Carbon Free, um certificado responsável por atestar que uma determinada atividade plantou árvores para neutralizar o impacto de suas emissões.
Desde 2005, quando foi criada, até outubro de 2006, a Iniciativa Verde plantou 15.131 árvores, quantidade suficiente para cobrir cerca de 18 campos de futebol, calcula Dieguez. Do total de recursos, 90% vão para o plantio e o monitoramento da área e 10% para a manutenção da organização. Pelo menos outras duas empresas já existem no país de olho nas possibilidades da neutralização das emissões de gás carbônico.
Mas o fenômeno ambiental não se restringe apenas a grandes empreendimentos. Ser Carbon Free é um estilo de vida. Segundo cálculos da Iniciativa Verde, um cidadão de classe média numa grande cidade brasileira provoca no seu dia-a-dia a emissão anual de 2,08 toneladas de gás carbônico na atmosfera. Traduzindo: esse cidadão precisa plantar 14 árvores para que, num prazo de 37 anos, esse prejuízo seja compensado.
No entanto, segundo Dieguez, a missão da Iniciativa Verde é muito maior do que simplesmente plantar árvores para mitigar o efeito estufa. É preciso reduzir o impacto agora.
É o que pensa também Lúcia Ortiz, presidente da ONG Núcleo Amigos da Terra Brasil. Segundo Lúcia, pequenas atitudes individuais, como trocar o carro pela bicicleta ou pelo ônibus, podem reduzir a emissão de gases de efeito estufa no ar e diminuir a dor na consciência.
A prevenção também passa por uma mudança de hábito muito mais difícil, diz Hélio Mattar, diretor do Instituto Akatu pelo Consumo Consciente:
– O cidadão precisa consumir menos. E isso esbarra em toda uma questão cultural. Em todos os processos de produção de bens da nossa sociedade há uso intensivo de água e de energia elétrica, que contribuem para a emissão de gases de efeito estufa. É preciso consumir de forma consciente. E uma forma de fazer isso é selecionar empresas engajadas – afirma Mattar.
Essa preocupação destacada por Mattar, assim como o Carbon Free, já gerou dezenas de movimentos mundo afora. Um deles, no Brasil, chamado Simplicidade Voluntária, prega o abandono do luxo por uma vida menos consumista. Resta saber quem vai se oferecer para levá-los para frente.
Na onda verde
Ele tem um carro, mas anda a pé. Já deixou de comprar roupa por um período de quatro meses. E construiu uma casa em Santa Catarina com madeira reutilizada de outras construções. O fotógrafo Adriano Becker, 32 anos, não é nenhum super-herói. Mas não consegue ver um rio poluído, uma árvore cortada ou fumaça de caminhão sem se engajar na luta pela preservação da natureza. Associado a uma ONG, para a qual oferece de vez em quando seu talento como fotógrafo gratuitamente, Becker também tem uma outra preocupação.
Aquilo que ele não consegue reduzir em emissões nocivas na atmosfera, tenta neutralizar com uma paixão: o plantio de árvores.
- Já plantei umas 50 ár vores no meu terreno em Santa Catarina. Toda vez que pego o carro e vou para lá para pegar onda, me sinto um pouco culpado e me preocupo em compensar - conta o fotógrafo.
São mais de 30 espécies - entre figueiras, pitangueiras e jerivás. Mudas adquiridas no viveiro do Jardim Botânico ou com amigos. Dessa forma, a área devastada por moradores antigos começa a ganhar vida.
Quem já é carbon free
Algumas iniciativas que compensaram a emissão de gases de efeito estufa
> O São Paulo Fashion Week promoveu o plantio de 4.290 árvores de mais de 80 espécies nativas em uma área degradada da Mata Atlântica.
> As emissões de gases de efeito estufa decorrentes da produção e distribuição do livro Uma Verdade Inconveniente, do ex-vice presidente norte-americano Al Gore, foram neutralizadas por meio do reflorestamento de uma área degradada da Mata Atlântica. A viagem de Al Gore ao Brasil e a estréia do filme Uma Verdade Inconveniente também tiveram compensação.
> O festival Pop Rock Brasil 2006, que reuniu atrações internacionais no estádio Mineirão, em Belo Horizonte, compensou a emissão de CO2 no evento.
> O Grupo Jeito Moleque compensou as emissões relacionadas à realização de show de lançamento de turnê com o plantio de cem árvores em uma área degradada de mata ciliar.
- Saiba como calcular suas emissões de CO2 em www.iniciativaverde.com.br/pt/index_pt.html
(Por Tatiana Cruz, Zero Hora, 06/04/2007)