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2007-04-03

O Brasil terá até o meio do ano uma rede para pesquisas sobre as mudanças climáticas. Quem diz é o físico pernambucano (nascido no Rio) Sergio Machado Rezende, 66, cuja permanência à frente do Ministério da Ciência e Tecnologia no segundo governo Lula foi sacramentada ontem (2/4).

A rede será montada, segundo o ministro, com recursos dos fundos setoriais, e capitaneada pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). A expectativa dos cientistas é que ela produza estudos sobre como o aquecimento global afetará o Brasil e como o país pode se adaptar às mudanças no clima. O governo foi pego desprevenido pelo último relatório do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), que pôs o assunto no topo da agenda global. "Essa é um tema que será tratado por nós como estratégico", disse o ministro à Folha.

Em entrevista, Rezende também defendeu a construção da usina nuclear Angra 3 e disse que a Lei de Inovação, regulamentada em 2005 para acabar com o gargalo tecnológico da indústria brasileira, não está funcionando a contento porque uma "questão cultural" impede as empresas de inovar. 

FOLHA - O tema das mudanças climáticas será prioritário neste segundo mandato?
REZENDE - Esse é um tema que será tratado por nós como estratégico. Vamos implantar nos próximos meses uma rede envolvendo vários grupos do MCT e das universidades. Essa iniciativa será ancorada no Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).

FOLHA - Os recursos já estão definidos? Como eles serão distribuídos?
REZENDE - Serão recursos, provavelmente, do FNDCT [Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, que agrega os fundos setoriais]. Já tivemos até aprovação para isso. Estamos aguardando ainda que a rede faça o direcionamento das suas necessidades de recursos. É a demanda que vai orientar o orçamento.

FOLHA - Por que o Brasil ainda não tem um plano de adaptação para as mudanças do clima?
REZENDE - Nenhum país tem. Mas todos nós ficamos muito preocupados com o relatório do IPCC de fevereiro. Temos de acelerar os estudos [sobre o clima] e as providências.

FOLHA - A energia nuclear será tratada como prioridade?
REZENDE - Nós temos capacidade de ter uma matriz energética diversificada. O Brasil tem a sexta maior reserva mundial de urânio. Algumas pessoas da área estimam que, quando estiver tudo mapeado, nós teremos a terceira. Essa é uma forma de energia que está aqui. Para ser empregada, porém, ela precisa de mais tecnologia.

FOLHA - O desenvolvimento desse tipo de energia não causará conflito, por exemplo, com a AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica)?
REZENDE - Não teremos problema porque o nosso programa é transparente. O Brasil é signatário do Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares. Já começamos a fazer o enriquecimento de urânio, em quantidade pequena. Não há nenhum questionamento da AIEA.

FOLHA - Dentro desse cenário, a construção de Angra 3 é essencial?
REZENDE - É uma das prioridades. O anúncio [da construção] pode acontecer brevemente. Tem de ser esse ano, sem dúvida. Os equipamentos que foram comprados para Angra 3, por exemplo, estão estocados, sob manutenção, mas eventualmente será preciso repor alguns deles, porque já existe tecnologia mais moderna. A licitação da obra foi feita há muito tempo também. Vai ser preciso ver se ela ainda está válida.

FOLHA - Quais serão os próximos passos acordo entre Brasil e Ucrânia para lançamento de satélites?
REZENDE - Esse acordo permitiu a criação de uma empresa binacional, a Cyclone Space. Tivemos algumas dificuldades no ano passado, mas no final do ano tudo foi resolvido. Até o fim do mês os dirigentes dessa empresa vão ser escolhidos.

FOLHA - A base brasileira em Alcântara será reaberta?
REZENDE - Sim. No momento queremos fazer com que esse acordo com a Ucrânia funcione. Não estamos pensando em mais acordos, nem em abrir Alcântara para outros países.

FOLHA - Quando ocorrerá o próximo lançamento do VLS (Veículo Lançador de Satélites)?
REZENDE - Foguete mesmo é para daqui a dois anos. Existe uma cooperação importante com a Rússia. Eles vêm desenvolvendo combustíveis para permitir o lançamento de foguetes com um alcance maior.

FOLHA - Os impasses na CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança), estão emperrando pesquisas e exportações agrícolas?
REZENDE - As pesquisas não. Existem mais de 400 pedidos já aprovados. Mas do lado comercial, está travado. Tem muita reação. Na semana passada, por exemplo, quando seria realizada uma audiência pública sobre a liberação de um milho transgênico, ativistas impediram a realização da reunião. Agora em abril teremos de tomar medidas de segurança para que a reunião possa ocorrer.

FOLHA - O orçamento de 2007 vai continuar muito contigenciado?
REZENDE - O orçamento do FNDCT deste ano corresponde a 70% da receita prevista dos fundos. No ano passado foi de 60% e, no anterior, de 50%.

FOLHA - A Lei da Inovação (conjunto de normas que visa fazer com que a indústria invista em tecnologia) está funcionando a contento?
REZENDE - A contento ainda não. As empresas brasileiras não fazem pesquisa com inovação por uma questão cultural. A Lei de Inovação, entretanto, prevê a subvenção econômica, mas ela começou a ser aplicada apenas no final do ano passado.
A Finep fez um edital de R$ 300 milhões. O pedido alcançou R$ 1,9 bilhão. Gradualmente os empresários estão percebendo a necessidade da inovação. Mas isso você não consegue fazer de uma hora para a outra.
(Por Eduardo Geraque, Folha de S. Paulo, 03/04/2007)


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