Os portugueses “não têm qualquer interesse global nos problemas ambientais” e apenas se interessam por aqueles “que os afectam directamente”, disseram especialistas na área do Ambiente. A fraca participação na luta por um bem comum resulta da falta de educação cívica básica, explicam.
“Em Portugal não existe uma educação cívica básica que leve as pessoas a lutarem por um bem comum. Só se luta por interesses pessoais”, comentou Eugénio Sequeira, presidente da Liga para a Protecção da Natureza (LPN), na sessão "Criação e Defesa do Ambiente", organizada em Lisboa para discutir a forma como se organizam e estruturam as acções de cidadania no sector do Ambiente.
Lurdes Soares, do Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente (Geota), disse que a participação cívica dos portugueses em acções em torno do ambientalismo "é sempre uma participação derivada de interesse" e não "uma participação contínua e activa". O arquitecto paisagista Gonçalo Ribeiro Telles considerou que outro factor que influencia a falta de participação é a inexistência de "quaisquer referências ambientais em Portugal", o que "impede as pessoas de verem a problemática ambiental de uma maneira geral".
O jornalista e escritor Pedro Almeida Vieira disse que o problema também se deve ao facto de os portugueses "viverem numa sociedade cada vez mais mediática", onde as elites e as pessoas capazes de promover alguma mudança "não querem ou não podem dar a cara sob esta matéria".
Vieira criticou a facilidade que o Governo tem em passar uma imagem ambientalista "falsa", uma vez que os meios de comunicação social parecem apenas funcionar "como pé de microfone". "Os jornalistas têm que ter um papel mais importante e decisivo na análise e na filtragem destas questões".
Ambientalistas queixam-se de dificuldades em passar mensagem ao cidadão
Outro dos temas foi a dificuldade sentida pelas organizações de defesa do ambiente fazerem chegar o discurso ambientalista ao cidadão comum. ”A mensagem que as organizações ambientalistas querem transmitir muitas vezes as pessoas não a querem ouvir”, comentou Susana Fonseca, vice-presidente da Quercus.
O problema não é a falta de voluntários nos movimentos ecologistas, "que nos últimos anos têm aumentado", mas sim "a falta de condições que as organizações têm para enquadrá-los". Já para Ribeiro Telles é fundamental não falar na defesa do ambiente "mas sim na construção do ambiente", lembrando que existe uma natureza primordial e uma segunda natureza construída pelo homem.
"A natureza primordial não pode desaparecer", frisou o arquitecto, que lembrou que várias calamidades ambientais, existentes no país, "se devem ao mau ordenamento do território, à florestação extensiva com pinheiros e eucaliptos e a falta de qualquer tipo de culto de floresta". "Nós não temos florestas, temos florestas industriais", disse Ribeiro Telles, lembrando que "Portugal é o país da União Europeia, que mais madeira importa".
O arquitecto afirmou ainda que "a defesa da Reserva Agrícola Nacional [RAN] e da Reserva Ecológica [REN] é imprescindível", porque elas pressupõem a sobrevivência de "recursos que não se podem destruir, porque depois se pagará um preço muito alto". "O problema é demasiadamente grave para estar à espera e as pessoas só vão sentir o disparate que estão a fazer quando os preços da alimentação aumentarem".
(Ecosfera, 31/03/2007)